Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Nelson de Sá

NO AR

"A aposta católica da Rede Globo, em tudo semelhante -e uma reação- à aposta evangélica da Rede Record, não vem se mostrando de maior êxito junto à audiência.

A telenovela ?A Padroeira?, em princípio histórica, em torno da descoberta da imagem de Nossa Senhora Aparecida, já não é mais.

Estão morrendo personagens católicos sem conta, dia após dia, e outros vão surgindo, diferentes. Mulheres de seios quase à mostra, apertados nos vestidos, e cercadas de mucamas avançam em cena.

Nada que impeça padre Marcelo Rossi de surgir, nos intervalos da novela, como aconteceu ontem, para anunciar, exultante como sempre:

– Aconteceu, é verdade… Uma missa ao vivo… No próximo domingo.

Nada que impeça, também, os telejornais da emissora de anunciar, orgulhosos, que o Brasil deve ter sua primeira santa em menos de um ano.

Pelo que garante a Rede Globo, madre Paulina, ela que realizou em Santa Catarina seu ?primeiro milagre reconhecido?, será canonizada até março pelo Vaticano.

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Um dos orgulhos do governo FHC começa a cair, pelo que dizia ontem Fátima Bernardes, do Jornal Nacional:

– O governo quer que o Exército passe a ter poder de polícia. Durante a greve da Polícia Militar, o Exército foi chamado para garantir a ordem, mas não podia prender ninguém.

Se for verdade, o governo FHC quer que o Exército tenha poder para prender civis -e a Globo, pela que indica a cobertura, não acha nada mal.

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– É menos um sentimento de raiva e surpresa -e mais de aceitação e resignação.

Era a CNN, ontem, tentando descrever como os brasileiros estão reagindo à derrota da seleção de futebol para a seleção de Honduras.

Um jogador hondurenho surgiu dizendo:

– O Brasil não é invencível. Nós provamos isso.

Até na Globo, que chamou Mauro Silva de covarde, já se fala em ?medo de não nos classificarmos para a Copa?.

Aceitação e resignação.

Ciro Gomes surgiu ontem em comercial do PTB.

Quem o apresentou, vaidosamente, foi Roberto Jefferson. Aquele, que liderou a tropa de choque de Fernando Collor, no impeachment."

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– Quero ser um homem de paz.

Era d. Eusébio Oscar Scheid, arcebispo de Florianópolis, escolhido pelo papa João Paulo 2? para substituir d. Eugenio Sales como arcebispo do Rio, ontem na Rede Globo.

À CBN, cadeia de rádio da Globo, d. Eusébio detalhou um pouco mais, declarando que vai buscar o diálogo com as outras correntes religiosas. Mas deixando claro, segundo a emissora, que não aceita desrespeito à Igreja Católica.

Vale dizer, nada de chute na santa -como aquele dado por um bispo da Igreja Universal, tempos atrás, ao vivo na Rede Record.

Será preciso um homem de paz, para não dizer de diplomacia ou de política, para contornar as guerras santas insistentes entre cristãos, entre católicos, entre emissoras de televisão e, nos últimos tempos, até entre presidenciáveis.

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O telejornalismo global não perde uma data santa, ultimamente. Ontem, acompanhou os motoristas que, em várias regiões do país, foram às igrejas católicas em busca da bênção de São Cristóvão.

Por outro lado, ontem também foi dia de destacar, na Rede Globo, que já foi solicitada a quebra do sigilo bancário do presidenciável evangélico Anthony Garotinho.

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Num dia, um ministro militar, general Alberto Cardoso, lança no Jornal Nacional a idéia de dar às Forças Armadas o poder de prender civis, como fazem hoje as polícias.

No dia seguinte, registradas as primeiras reações da opinião pública, um ministro civil, José Gregori, surge para garantir que não é bem assim, que ?há divergências? na equipe.

Não deixa de ser uma maneira de tomar decisões de governo, mas balões de ensaio, jogados com tal facilidade à audiência nacional de TV, não ajudam a estabilizar o ânimo do cidadão -e das polícias, que reagiram com ameaças.

A Globo News fez o serviço completo. Lançou no ar a seguinte pergunta:

– Acha necessário que as Forças Armadas tenham poder de polícia?

Resultado parcial, na web, com 369 votos: sim, 68,3%; não, 31,7%.

O balão de ensaio do governo Fernando Henrique, até aqui, só fez instigar os 68,3% contra as polícias -e a favor, vale dizer, de velhas soluções.

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"

– É bom para o PSDB e é bom para Fernando Henrique. Todos receberam com alívio.

Era Franklin Martins, sobre a saída do governador capixaba do partido presidencial. José Roberto Arruda, agora José Ignácio Ferreira, um a um os tucanos acusados são sacrificados em público, firmando a imagem de um presidente em que nada cola -e que, com cinismo, ainda elogia os sacrificados nos telejornais.

Um presidente ?teflon?, como se dizia de Ronald Reagan.

Desde a compra de votos para a reeleição até a presente ?caça às bruxas?, que não deixa escapar ACM, Jader Barbalho, Garotinho, Marta Suplicy, o presidente atravessa os escândalos sem manchas.

Atravessa até mesmo a crise de energia, que, aliás, passou a usar em benefício próprio desde o aniversário do Plano Real -como se o racionamento não fosse mais do que uma chance para os brasileiros aprenderem a poupar.

Com oito anos no poder, FHC vai além do ?teflon?, na verdade: também como Reagan, a marca que deixou no cidadão-telespectador é duradoura, não vai sair tão fácil.

A segurança, algo paternal que oferece ao eleitor, o presidente tratou de lançar contra Lula, no mesmo aniversário do Real. Insinuou, com Pedro Malan, que o petista pode não ser confiável na economia, ele que não apoiou a estabilização.

É a sombra de Fernando de La Rúa, que vai espreitar Lula até o ano que vem.

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No dia em que mais um tucano acusado se afastava do presidente, a Justiça italiana negava o pedido para a extradição de Salvatore Cacciola.

Outro, entre tantos, cujo escândalo ameaçou CPI e passou bem perto do presidente, sem deixar manchas.

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Por falar em Itália e em CPIs abafadas, o primeiro-ministro Silvio Berlusconi acionou sua base parlamentar e derrubou a comissão exigida pela oposição para investigar a ação da polícia em Gênova -e a morte de Carlo Giuliani.

Também só para registrar, terminou em São Paulo o julgamento de mais um dos skinheads acusados pelo assassinato do ?adestrador? Edson Nery, no eufemismo da Globo. O skinhead foi absolvido.

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Telejornal após telejornal, ontem como anteontem, a Globo insiste na pergunta: O Exército pode agir como polícia?"

 

    
    
                     

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