Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Notas sobre a cobertura eleitoral


Alberto Dines

 

A

“pesquisite” continua sendo a maior distorção. A começar pelo nome, o certo seria denominar aquilo que a mídia chama pesquisa de sondagem ou amostragem. No jornalismo anglo-saxão usa-se a denominação poll (aferição) ou survey (levantamento) e não research (pesquisa). A designação em nossa língua confere ao processo um tom conclusivo e pseudo-científico.

A cada eleição as sondagens vão se transformando, perdem a sua função aferidora para se tornarem sentenças definitivas e inapeláveis. Exemplo disso foi a moda inventada pela Folha, logo seguida pelo JB, de usar como aposto, depois do nome do candidato, a cifra obtida na última sondagem. Passa a funcionar como ferrete e estigma quando os resultados deveriam ser o flagrante de uma situação transitória.

Essa idolatria dos números criou um subproduto ainda mais absurdo e aberrante: o “ganhador” dos debates televisivos entre candidatos. Sem nenhuma sustentação estatística – ao contrário das sondagens –, concentram artificiosamente num único episódio uma campanha eleitoral inteira. Se a “pesquisite” equivale ao placar futebolístico, a “premiação” nos debates é como o páreo no turfe – ambas esvaziam o confronto de idéias.

  • O caderno Eleições da Folha saiu pela culatra. Empobreceu o primeiro caderno (o mais nobre do jornal) e separou política de eleições. O que constitui desvio gravíssimo. O ato eleitoral é parte do processo político permanente. E como a sociedade brasileira só pensa em política a cada dois anos, a eleição vira circo. Nessa desvinculação de política e eleição produzem-se as prestidigitações malufistas como a invenção de Celso Pitta e do jogador Oscar. O confinamento da cobertura eleitoral num encarte formatou um material necessariamente sério de modo frívolo. Daí os erros diários, alguns gravíssimos, como foi o caso da denúncia irresponsável envolvendo os negócios pessoais de Lula. O caderno Eleições da Folha conseguiu o milagre de desvendar, numa única temporada, o perigoso processo de cadernização e fragmentação que está liquidando os grandes jornais brasileiros.
  • A desastrosa declaração do ministro Ilmar Galvão, presidente do TSE, favorecendo a reeleição de FHC (Folha, 27/9/98) revelou num único episódio diversos vícios da nossa imprensa. O incidente desmoraliza definitivamente o “jornalismo declaratório”, onde profissionais passivos contentam-se em acionar um gravador e depois transcrever. Não intervêm, não reperguntam, não conduzem a entrevista. Um repórter atento, ao ouvir opinião tão disparatada de uma autoridade dessa importância, teria pedido esclarecimentos. É o mínimo que se pede a um repórter – checar na hora, com a própria fonte, Ficaria evidente que o presidente do TSE não conseguiu articular o seu raciocínio com clareza (o que também seria significativo).