Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Notícias do passado

PÓS-DITADURA

Nos últimos 12 anos, Eason Jordan, executivo-chefe da CNN, esteve em Bagdá 13 vezes para mediar as conversações entre o governo e a sucursal da emissora na capital e para arranjar entrevistas com líderes iraquianos. Em recente artigo de opinião para o New York Times [11/4/03], Jordan contou que a cada visita ficava mais agoniado com o que via e ouvia; fatos terríveis que não podiam ser noticiados por colocarem em risco vidas de muitos iraquianos, em especial os que trabalhavam na sucursal da emissora.

"Nos anos 90, por exemplo, um dos cameramen da CNN foi detido. Por semanas foi espancado e submetido a tortura por eletrochoque nos porões de um QG da polícia secreta porque se recusou a confirmar a suspeita ridícula de que eu era o chefe da CIA no Iraque", afirmou o executivo. "A CNN já atua em Bagdá por tempo suficiente para saber que contar ao mundo sobre a tortura de um de seus funcionários poderia quase certamente acarretar em sua morte, além de pôr sua família e seus colegas de trabalho em perigo."

Segundo Jordan, trabalhar para uma organização de notícias estrangeira não dava aos cidadãos iraquianos proteção alguma. A polícia secreta aterrorizava os iraquianos empregados em serviços para a imprensa internacional. Alguns desapareceram e nunca foram encontrados. Outros sumiram e depois ressurgiram com indícios claros de submissão a torturas variadas.

Jordan conta diversas histórias que foi obrigado, para salvaguardar seus colegas e a si mesmo, a omitir do público. Outras chegaram a ser publicadas, como a de Asrar Qabando, uma kuwaitiana de 31 anos capturada pela polícia secreta do Iraque quando da ocupação do país, em 1990, devido a "crimes", entre os quais falar por telefone com a CNN. Asrar foi espancada diariamente durante dois meses. Seu pai foi obrigado a assistir. Assim que ocorreu a invasão americana, em janeiro de 1991, ela foi esquartejada e as partes de seu corpo foram deixadas em uma sacola plástica em frente à casa da família. "Senti-me péssimo com tantas histórias guardadas dentro de mim", disse Jordan. "Agora que o regime de Saddam se foi, acredito poderemos ouvir muitas histórias mais sobre as décadas de tormento. Pelo menos, agora essas histórias podem ser contadas livremente."