Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

NYTimes recusa anúncios de cigarros

Alberto Dines

 

A

partir do sábado, 1º de maio, o jornalão americano deixou de publicar anúncios de cigarros. A decisão foi divulgada em 28 de abril como notícia na seção de Negócios. A porta-voz da empresa, Nancy Nielsen, declarou: “A decisão de aceitar um anúncio freqüentemente implica uma avaliação das mensagens e dos valores neles implícitos (…) Não desejamos expor nosso leitor a uma publicidade que pode ser perigosa para a sua saúde”.

No lead da matéria informa-se que o NYTimes juntou-se ao pequeno grupo de jornais que recusa anúncios de cigarros. Mais adiante informa o nome dos principais integrantes deste grupo que já chega a uma dúzia: The Seattle Times e o prestigioso The Christian Science Monitor.

Na mesma matéria foi ouvido o porta-voz da Brown & Williamson, divisão da British American Tobacco Co., que classificou a decisão do NYTimes de “patética”: “É irônico que um veículo que trombeteia a liberdade da imprensa tropece na liberdade de expressão comercial”.

O publisher do jornal, Arthur O. Sulzberger Jr., contestou dizendo que não tem cabimento incluir a publicidade de cigarros na questão da liberdade de expressão: “A Primeira Emenda dá à imprensa o direito de publicar o que escolher. Ela não força a imprensa a publicar qualquer coisa, seja notícia ou anúncio. Continuamos a apoiar o direito de outras publicações veicularem anúncios que considerem apropriados para os seus públicos”.

A nova política estabelecida pela empresa para o NYTimes considera perniciosa apenas a publicidade que promova o consumo de cigarros. Anúncios de festivais de música patrocinados por tabaqueiras serão aceitos. Anúncios de armas de fogo ou mesmo equipamentos de segurança também não são aceitos.

No ano passado, a receita de anúncios de cigarros no NYTimes representou menos de 1% do seu faturamento total. A decisão da empresa refere-se apenas ao principal jornal do grupo, não inclui os demais como o The Boston Globe.

Em meados de abril, o New York Times anunciou um lucro de quase 62 milhões de dólares no primeiro trimestre do ano – só no ítem publicidade a receita aumentou quase 4%. Significa que um jornalismo de qualidade e responsável não é incompatível com o lucro.

A imprensa brasileira, que costuma badalar os modismos americanos, manteve silêncio sobre a decisão do New York Times até as edições de 2/5/99.

 

Cristina Yumie Aoki Inoue e

Guilherme Canela de Souza Godoi (*)

 

A política externa é uma preocupação de muito pouca gente. A nossa imprensa não produz uma visão brasileira das questões internacionais. A maior parte do material publicado é a tradução do pensamento dos outros . Utiliza-se o noticiário de agências e jornais estrangeiros. (Ovídio de Mello, ex-embaixador brasileiro em Angola, em entrevista ao jornalista Elio Gaspari, Folha de S.Paulo, 18/04/99, caderno Mundo, pág. 20 )

A opinião expressa na epígrafe pelo ex-embaixador brasileiro não se configura em algo novo. Desde há muito tem-se uma percepção bastante generalizada de que a nossa mídia (especialmente os jornais impressos diários, as revistas semanais não especializadas, e os diferentes telejornais de nossas televisões abertas) informa quantitativamente e qualitativamente mal o leitor e/ou telespectador nacional acerca dos fatos externos às fronteiras do país e, igualmente, das relações verde-amarelas para com o exterior ( a chamada política externa brasileira). No entanto, poucos estudos sistemáticos têm sido produzidos na tentativa de corroborar essa percepção.

O presente artigo é fruto de dois semestres de pesquisas realizadas por alunos das turmas de Introdução ao Estudo das Relações Internacionais, disciplina ministrada pela professora Cristina Inoue do Departamento de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, a partir de março de 1998. Os alunos do primeiro semestre de 1998 fizeram um acompanhamento – basicamente quantitativo, durante um mês, da cobertura dada pela mídia às questões internacionais; em seguida, os alunos do segundo semestre de 1998, além de continuarem o acompanhamento anteriormente iniciado, também realizaram uma série de entrevistas junto à população de Brasília, com o intuito de aferir como estavam os conhecimentos desta em relação a questões internacionais atuais (como Mercosul, Direitos Humanos, União Européia, Crise Financeira Internacional).

A informação parece sempre ter sido de grande importância estratégica para os diferentes povos. Guillermo Piernes assinalou em Comunicação e desintegração na América Latina ( Editora Universidade de Brasília, 1990. pág. 9) que “o Império Asteca, que mobilizou uma das máquinas bélicas mais competentes da História, foi derrotado por um aventureiro espanhol, de cabelos louros, chamado Hernán Cortés, que desembarcou no continente com algumas dúzias de homens com armaduras e uns poucos cavalos. Cortés, no entanto, tinha em suas mãos a principal arma na paz e na guerra: a Informação”.Essa importância aumenta substancialmente num mundo de fronteiras porosas ou diluídas – como definido por muitos dos teóricos do fenômeno da globalização – especialmente em países intrinsecamente inseridos nessa nova configuração mundial, como é o caso do Brasil. Daí a relevância das relações internacionais e, conseqüentemente, do tratamento delegado pela mídia a essa questão.

O argumento central a ser desenvolvido a seguir é que a cobertura da mídia no que se refere às questões internacionais e/ou de política externa brasileira deixa a desejar, tanto nos aspectos quantitativos quanto qualitativos. Portanto, excetuando-se a pequena parcela da população privilegiada com acesso a internet, TV a cabo, jornais e revistas especializados, os outros 148 milhões de brasileiros são impossibilitados de ter um contato minimamente razoável com assuntos que lhes influenciam cotidianamente.

Embora os dados levantados sejam preliminares, essas primeiras constatações podem abrir caminhos para estudos e pesquisas mais aprofundados.

Foram objeto de pesquisa dos alunos do primeiro semestre de 1998 os seguintes jornais, revistas e telejornais: Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo, Correio Braziliense, O Globo, Jornal do Brasil, Veja, IstoÉ, Jornal da Record e Jornal Nacional. Cada grupo de alunos realizou o acompanhamento sistemático do jornal ou telejornal escolhido, por um período de aproximadamente um mês. A título de ilustração, observe-se a seguir uma tabela que explicita a importância da cobertura internacional de alguns veículos de informação pesquisados dentro da cobertura total do veículo em questão:

Veículo