Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O Brasil das telenovelas

MERCADO E FICÇÃO

Alexander Goulart (*)

O Brasil é um dos maiores exportadores de telenovelas. As estórias ambientadas no Rio de Janeiro ou numa cidadezinha do interior do Nordeste ganham o mundo e se tornam dramas universais. Até pouco tempo atrás, as telenovelas brasileiras não penetravam com força no mercado americano, mas o panorama agora é outro. Os imigrantes latinos têm a disposição opções interessantes na televisão, como o mais recente sucesso internacional da Globo, O clone, exibido pela Telemundo. Esse mercado está crescendo tanto que a Globo produziu a versão em espanhol de Vale tudo, sucesso dos anos 80.

Há décadas, nada faz mais sucesso na televisão do que as telenovelas, produção que parece ter uma espécie de linha direta com o telespectador. Sua origem mais remota está no folhetim (1836), ou seja, o rodapé dos jornais onde eram publicadas estórias sensacionalistas e romances. Depois, o folhetim passou para o rádio, originando a radionovela, que teve Cuba como berço. No Brasil, a radionovela só chegou em 1941, à Rádio Nacional, porque até então não havia no país um sistema de radiodifusão eficiente e comercial.

Na década de 30, nos EUA, a soap opera (ópera de sabão, porque era patrocinada pela indústria de perfumes) vendia ilusões em arrebatados dramalhões, não havendo qualquer comprometimento com a realidade. O que tornou a soap opera popular foi o grande incentivo da indústria, que via nas mulheres um forte público consumidor. Percebia-se a mulher como consumidora em potencial, o universo feminino, povoado por expectativas que podiam ser exploradas ficcionalmente por uma narrativa específica. A soap opera vendia e falava às mulheres.

Pura ilusão

No Brasil, estreou em 1951 a telenovela Sua vida me pertence, de Walter Foster, produção que permaneceu até 1963, apresentada duas vezes por semana e com duração média de 20 minutos. Na década de 60, a televisão começou a se solidificar como veículo de massa. Foi quando surgiu a telenovela diária, um produto de massa que transformou o cotidiano das famílias. Inicialmente, os melodramas eram fantasiosos, de origem cubana, mexicana ou argentina, mas com o tempo foram se inserindo na realidade, sofrendo um "abrasileiramento". O realismo dos autores visava retratar e discutir a realidade brasileira. E as novelas "realistas" é que atraíram o público masculino.

Com o investimento da Globo em teledramaturgia, criou-se uma produção de cultura industrializada, unindo planejamento e estrutura organizacional. O sucesso da Globo com as telenovelas foi um dos fatores que contribuíram para a queda e o desaparecimento de outras emissoras. A telenovela tornou-se um gênero artístico genuinamente brasileiro.

A única coisa a lamentar é que, num mundo em que o público está cada vez mais segmentado e atento a uma única fonte de informação, a telenovela aparentemente mostra a verdade sobre a realidade brasileira. Assim, aos olhos dos chineses ou dos próprios brasileiros, o Brasil é aquele retratado nas telenovelas. Pura ilusão.

(*) Jornalista