Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O Estado de S.Paulo


“Programação de TV assusta diretor da Unesco”, copyright O Estado de S.Paulo, 15/2/00

“O representante da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no País, Jorge Werthein, disse que está ‘profundamente assustado’ com o nível de violência e sexo na televisão brasileira, em horários impróprios. Ele recomendou aos pais que apresentem reclamações ao Procon. ‘Quando compramos algum produto que está podre ou com prazo vencido temos a possibilidade de reclamar no Procon’, disse Werthein. ‘Estamos fazendo isso com a mídia eletrônica? Não!’

Na opinião de Werthein, os pais estão adotando uma atitude ‘extremamente passiva’ em relação ao que assistem e ao que os filhos estão vendo na televisão brasileira. O representante da Unesco afirmou que a sociedade precisa reclamar mais e acompanhar de perto o acesso dos filhos a meios como televisão, Internet, cinema e jogos eletrônicos. As emissoras, disse Werthein, têm de aceitar a auto-regulamentação logo.

Em fase de recuperação de uma cirurgia, Werthein foi obrigado a ficar dentro de casa na última semana. Acompanhou a programação diária das principais emissoras convencionais e a cabo. Werthein, que nos últimos anos vem acompanhando pesquisas sobre violência na TV, disse que ficou assustado com filmes veiculados no período da tarde, quando grande parte das crianças estão grudadas à televisão. O representante da Unesco disse que viu esta semana, às 13 horas, um filme onde aparecem pessoas fazendo sexo explícito e matando.

O representante da Unesco afirmou que não aceita argumentos de alguns produtores de filmes e programas de televisão, do tipo ‘isso vende’, para veicular programação violenta. Ele acredita que se trata de um escapismo da mídia para impor programação ruim. O representante da Unesco lembra que filmes como Titanic e A Lista de Schindler provaram que é possível ter grandes audiências sem violência e sexo explícito.

Governo – A Unesco tem incentivado a criação de códigos de conduta para as emissoras de televisão e já trouxe até um especialista do Canadá para mostrar como o sistema funciona. Werthein deixou claro que a iniciativa de cobrar um código de conduta para cada emissora cabe principalmente ao governo. ‘O governo tem todo o poder’, disse. ‘É o dono das ondas, no caso da TV.’

A Secretaria Nacional dos Direitos Humanos vem cobrando um código de conduta das TVs desde o início do ano passado. Além do governo, o representante da Unesco acredita que as escolas deveriam assumir grande parte da responsabilidade pela introdução das novas mídias, como a Internet.

Erotização

Werthein também mostrou-se preocupado com a chamada ‘erotização da infância’. Ele disse que a mídia e a moda estão fazendo com que as crianças ‘queimem etapas’, quando as expõe desnudas e representando adultos.

O representante da Unesco comentou a atitude do garoto de 9 anos que deu várias facadas nas costas de uma menina de 7, em Brasília, depois de assistir ao Boneco Assassino II. Para comentar o caso, ele recorreu a uma pesquisa feita pela argentina Tatiana Merlo-Flores.

Na pesquisa, que envolveu 2.000 jovens, Tatiana constatou que as crianças que já são agressivas por temperamento, ou devido a problemas familiares, sociais ou individuais, ‘selecionam e integram elementos violentos da TV’ ao seu cotidiano.”