Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O Estado de S. Paulo

ANIVERSÁRIO DO ESTADÃO

“?Estado? completa 129 anos, 124 de vida independente”, copyright O Estado de S. Paulo, 05/01/04

“Lançado em 4 de janeiro de 1875 com o nome de A Província de São Paulo, um diário de quatro páginas e 2.025 exemplares, O Estado de S. Paulo completou ontem 129 anos de existência e 124 de vida independente ? uma trajetória de idealismo, seriedade e luta que fez dele um dos mais importantes e mais respeitados jornais do mundo. São Paulo era uma cidade de 20 mil habitantes e 2.992 prédios, quando a primeira edição chegou às ruas sob responsabilidade de um grupo de republicanos que pregavam o fim da monarquia.

Em 1888, quando o nome de Julio Mesquita apareceu como diretor-gerente no cabeçalho da primeira página, o jornal comemorou a abolição da escravatura, pela qual vinha lutando desde a fundação. Foi a primeira de uma série de grandes causas que abraçou ao longo de sua história, sempre em defesa da liberdade e da democracia.

Já com o nome de O Estado de S. Paulo, que adotou um mês e meio após a proclamação da República, o jornal logo se destacou pela qualidade do noticiário e pela clareza de pontos de vista. Distinguiu-se também pela inovação técnica de suas oficinas gráficas e pelo investimento na reportagem.

Em 1890, o jornal contratou a agência Havas, atual France Presse, cujos telegramas deram mais agilidade às informações internacionais, e publicou pela primeira vez um clichê como ilustração de primeira página.

Sete anos depois, a tiragem do Estado saltou de 10 mil para mais de 18 mil exemplares com a publicação, em 8 de março de 1897, de notícias sobre a guerra de Canudos. Euclides da Cunha, que havia estreado no jornal com o pseudônimo de Proudhon, era a estrela da redação. ?Um jagunço degolado não verte uma xícara de sangue?, escreveu, do interior da Bahia, o repórter que mais tarde aprofundaria essa observação nas páginas de Os Sertões.

Durante a 1.? Guerra Mundial, sobre a qual Julio Mesquita escreveu uma série de artigos ? publicados no livro A Guerra, em 2002, pelo seu bisneto Ruy Mesquita Filho ?, a empresa lançou uma edição vespertina que, conhecida como Estadinho, circularia de 1915 a 1919. Nessa época, o escritor Monteiro Lobato era um dos colaboradores do jornal.

Com a morte de Julio Mesquita, em março de 1927, Nestor Pestana e Julio de Mesquita Filho assumiram o cargo de diretor. Cinco anos depois, começaria um dos períodos mais duros para o jornal. Seus proprietários, Julio de Mesquita Filho e o irmão Francisco Mesquita, que lutaram contra Getúlio Vargas na Revolução Constitucionalista de 1932, foram presos e exilados durante o Estado Novo.

O jornal foi ocupado por soldados da Força Pública em 25 de março de 1940 e ficou sob intervenção da ditadura até 1945. Só foi devolvido à família Mesquita em dezembro, após a queda de Getúlio. O período de intervenção não conta na história do Estado, que por isso fala em 129 anos de existência e em124 de vida independente.

O dia 4 de janeiro marca também o aniversário da Rádio Eldorado, fundada em 1958, e do Jornal da Tarde, que foi lançado em 1966, já durante o regime militar. Em 2000, foi inaugurado o portal estadao.com.br.

Após a morte de Julio de Mesquita Filho, em 1969, Julio de Mesquita Neto assumiu a direção do Estado, enquanto seu irmão Ruy Mesquita dirigia a redação do Jornal da Tarde.

Sob a vigência do Ato Institucional n.? 5, baixado em 13 de dezembro de 1968, a imprensa passou a ser censurada pelo governo, mas os dois jornais não se curvaram à ditadura. Como não podiam deixar espaços em branco, por ordem dos censores, o Estado substituiu os textos cortados por versos de Os Lusíadas, de Luís de Camões, enquanto o Jornal da Tarde publicava receitas de doces e bolos para caracterizar a censura. Várias edições foram apreendidas nas bancas, mas o Estado não deixou de circular.

Respeitado internacionalmente pela sua coragem de lutar contra a arbitrariedade em defesa da democracia e da liberdade, o jornal mereceu também o reconhecimento dos leitores. Em novembro, o Estado foi considerado o veículo de comunicação mais admirado do País, numa pesquisa feita por Meio & Mensagem Online. Na pesquisa, 380 entrevistados apontaram credibilidade, conteúdo, ética e independência como os atributos mais importantes de um jornal.”

 

ANIVERSÁRIO DE SÃO PAULO

“450 anos de Sampa no Canal Brasil”, copyright O Estado de S. Paulo, 05/01/04

“Feliz aniversário, São Paulo! Os 450 anos da maior metrópole brasileira ganham destaque especial na programação de TV. A partir de amanhã, a Globo mostra a minissérie Um Só Coração, de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira, com Ana Paula Arósio no papel de Yolanda Penteado. Por meio das aventuras dessa mulher avançada para seu tempo, a dupla de autores mapeia meio século da história da cidade, falando de amor, revoluções (a de 1930, principalmente) e arte ? desde a Semana de Arte Moderna, de 22, até a criação do Museu de Arte de São Paulo, o Masp, e a instalação da bienal de 1952. Um dia antes, a partir de hoje, o Canal Brasil, da TV paga, também inicia uma programação especial destinada a homenagear São Paulo.

Durante todo o mês, o canal vai exibir maratonas diárias destacando o cinema de São Paulo. Curtas, longas e programas especiais vão destacar as personalidades que marcaram o cinema paulista. E, por meio dos filmes, será possível acompanhar o crescimento de São Paulo ? a cidade que Roberto Santos filmou nos anos 1950 em O Grande Momento viveu o surto da industrialização flagrado por Luiz Sérgio Person em São Paulo S.A., de 1965, e chegou ao espaço urbano (e dramático) de Cronicamente Inviável, de Sérgio Bianchi, que expressa as contradições e desigualdades sociais do Brasil de hoje.

Para iniciar essa programação tão variada e interessante ? como expressão do cosmopolitismo de São Paulo ?, o Canal Brasil põe hoje no ar o especial São Paulo no Cinema, que começa com o registro dos primeiros longas produzidos na cidade, passa pela fundação da Vera Cruz, que pretendeu instituir um modelo industrial, nos anos 1940 e 50, relembra o Cinema Marginal e as pornochanchadas, dos anos 1960 e 70, e culmina com a diversidade do momento atual. O especial não entra nesta seara, mas seria interessante discutir também as novas propostas do Governo do Estado e da Prefeitura, que deflagraram no ano passado importantes programas de incentivo à produção. O fomento tem de passar, obrigatoriamente, pelos setores da distribuição e da exibição, que compõem o nó górdio que ainda estrangula o cinema nacional.

Outros especiais, da série Retratos Brasileiros, vão homenagear figuras de importância histórica indiscutível, como Jean-Claude Bernardet, Carlos Reichenbach, Luiz Sérgio Person, José Mojica Marins, Abílio Pereira de Almeida e César Charlone. O primeiro longa integra há tempos a programação do canal, mas a exibição de Perfume de Gardênia, de Guilherme de Almeida Prado, com Christiane Torloni, hoje às 21 horas, ganha um significado especial. Nos próximos dias, o erotismo de Walter Hugo Khouri em Noite Vazia, o olhar marginal de Rogério Sganzerla em O Bandido da Luz Vermelha, a sátira de Andréa Tonacci em Bang-Bang, a pós-modernidade de Chico Botelho em Cidade Oculta, a de Wilson Barros em Anjos da Noite e o testemunho de geração de Carlos Reichenbach em Alma Corsária vão mostrar a rica diversidade da experiência cultural do cinema paulista.”

 

RIO ANTIGO

“O Rio antigo está cada vez mais na moda”, copyright O Globo, 05/01/04

“Em pouco mais de cem anos, a paisagem urbana do Rio de Janeiro mudou completamente: quem vê os edifícios que hoje tomam conta de Copacabana nem sempre se lembra que o bairro não passava de um areal, com poucas construções, no início do século passado. Para resgatar imagens antigas da cidade, de praias virgens e ruas repletas de casas, dois colecionadores lançaram livros no fim do ano passado com registros do Rio, feitos por fotógrafos, profissionais ou amadores, que tinham em comum o desejo de retratar paisagens que sempre foram de tirar o fôlego.

O livro ?Rio de Janeiro ? Ontem & Hoje?, de Alberto Cohen, Sérgio Fridman e do fotógrafo Ricardo Siqueira, mostra a cidade em dois momentos: as imagens registradas por fotógrafos até a década de 40, colecionadas por Cohen e Fridman, foram feitas novamente, agora por Siqueira, exatamente dos mesmos ângulos dos registros anteriores. Já ?Rio de Janeiro 1900-1930: uma crônica fotográfica?, recém-lançado pelo colecionador George Emarkoff não tem o ?antes e depois?, mas é uma boa fonte de consulta para quem deseja saber como era o Rio nos anos 30: mostra 250 fotos da cidade feitas entre 1900 e 1930.

Nova York e Hamburgo têm obras semelhantes

As fotos do livro de Cohen, Fridman e Siqueira revelam, entre outros exemplos, uma Barra da Tijuca vazia de prédios, a Lagoa tomada de grossa vegetação e o mar batendo à porta do Hotel Glória antes do Aterro do Flamengo.

Para editar ?Rio de Janeiro ? Ontem & Hoje?, o trio se inspirou em obras que fizeram retratos semelhantes de Nova York (?New York then and now?, de Edward B. Watson) e Hamburgo (?Hamburg Heute und gestern?, de Rolf Muller).

? São trabalhos que resgatam vestígios de um tempo que não existe mais, que mostram a marcha da ocupação do espaço urbano. Acho que no Brasil não há registro parecido com esse ? diz Cohen.

Cohen, Fridman e Siqueira dedicaram à empreitada dois anos ? aí incluídos o trabalho de pesquisa de um pouco da história de cada pedaço da cidade registrado no livro, a produção das fotografias atuais, a catalogação das imagens antigas e a edição da obra.”

 

HÉLIO PELLEGRINO

“Encontro com o poeta da psicanálise”, copyright O Globo, 05/01/04

“Hélio, Francisco e Antonia esperaram quase 20 anos para abrir uma carta. Ela foi escrita no dia 3 de setembro de 1980, com a recomendação de só ser lida no ano 2000. Os três anteciparam o pedido em algumas horas e, na tarde de 31 de dezembro de 1999, leram finalmente o texto em que o psicanalista e poeta Hélio Pellegrino, pai de Hélio e avô de Francisco e Antonia, fala sobre o nascimento de seu primeiro neto homem. ?A primeira idéia que me ocorreu: quando este homem, que acaba de nascer, tiver vinte anos, verá a virada do século. Você, Francisco, é o futuro. Você é a flecha novíssima, tensa ? ou velha de futuro. Eu sou flecha ao crepúsculo, rica de passado, tensa de presente, limitada de futuro. Você me dilata, me renova, me renasce?, diz um trecho.

A carta de Pellegrino para o neto Francisco é um dos destaques do livro que Antonia está organizando para a Editora Planeta e que vai ser lançado em março ou abril. Na mesma data, ele ganha uma homenagem da Editora Bem-Te-Vi, nos moldes da que foi feita com Vinicius de Moraes. O ?Arquivinho de Hélio Pellegrino? reunirá uma biografia, uma cronologia, fac-símiles de cartas de Mário de Andrade e Otto Lara Resende, um álbum de fotografias e reprodução de um retrato feito por Mary Vieira nos anos 40. O pacote inclui também seis poemas inéditos que ele escreveu para Maria Urbana quando eram noivos. Completando as homenagens ao poeta, há ainda o livro ?Meditação de Natal?, recém-lançado pela Planeta.

Referência da vida política e cultural do país

Hélio Pellegrino faria 80 anos hoje, se um enfarte não tivesse abreviado sua vida em 1988. Sua morte deixou desnorteados parentes, amigos e admiradores, acostumados que estavam a ter como bússola o intelectual que se transformou ?numa referência da vida política e cultural brasileira entre os anos 60 e 80?, como escreve o jornalista Paulo Roberto Pires no livro ?Hélio Pellegrino ? A paixão indignada?.

Em seus 64 anos, vividos intensamente, Pellegrino comprou todo tipo de briga ? e esteve sempre do lado certo. Como adversários, o fascismo, o Estado Novo, a tortura, a ditadura militar, as más condições carcerárias, as dores e angústias do outro. Como arena, o consultório, as páginas de jornais e revistas, os manifestos, as assembléias, os debates, os palanques, as ruas. Como armas, sua incomparável oratória ? que lhe valeu o apelido de homem-comício ? sua indignação permanente, sua lucidez, seu humor, sua generosidade, sua obstinação e a ira santa de que falava seu primo, o crítico teatral Sábato Magaldi.

O livro organizado por Antonia, neta mais velha de Pellegrino, vai dar conta de algumas das principais facetas do avô: a lírica, a ensaística, a política, a religiosa, a psicanalítica. A obra está dividida em três partes. A primeira, ?Hélio?, autobiográfica, reúne textos que ele escreveu sobre ele mesmo, sobre a filha Maria Clara, sobre a morte do pai, sobre o neto Francisco. O segundo capítulo, ?Outro?, junta escritos referentes a personalidades como Clarice Lispector, Paulo Emílio Salles Gomes, Tristão de Athayde, Mário de Andrade, Che Guevara. A última parte, ?Encontro?, traz ensaios e notas sobre política e psicanálise.

? No início de 2003, dei-me conta de que ele faria 80 anos em janeiro. A data não poderia passar em branco ? explica Antonia, de 24 anos, formada em ciências sociais, que se diz ?maravilhada? com o acervo de Pellegrino que encontrou na Casa de Ruy Barbosa. ? Percebo que amigos da minha idade, mesmo os que lêem e escrevem, não têm muita noção de sua importância. Quis, então, organizar um livro que mostrasse a multiplicidade de dimensões de meu avô.

Não é fácil resumir num livro ? que dizer numa reportagem ? a complexidade de uma figura como Hélio Pellegrino, chamado de ?poeta da psicanálise? pelo jornalista José Castello. Em sua militância política, participou de passeatas, ajudou a fundar o PT, liderou greves, negociou a libertação de estudantes detidos pelo regime militar e acabou preso pela ditadura.

No ambiente psicanalítico, combateu a atuação da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro (SPRJ), que tinha em seus quadros o médico Amílcar Lobo, acusado de envolvimento com a tortura. Acabou expulso da sociedade, junto com o colega Eduardo Mascarenhas. Também aproximou a psicanálise dos pobres com sua Clínica Social.

E, como intelectual, ?ninguém como ele sabia falar e escrever a palavra mais certa para abalar a iniqüidade e despertar o sentimento fraterno?, como disse o crítico Antonio Candido.”