Wednesday, 08 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

O jornalista, seis anos depois

PAULO FRANCIS (1930-1997)

Em 4 de fevereiro completaram-se seis anos da morte do jornalista Paulo Francis. Nesse dia entrou na internet um sítio em sua homenagem, que pode se encontrado em <http://www.paulofrancis.com/main/main.htm> e do qual foram extraídos os três textos publicados a seguir. Os títulos são da redação do Observatório.


Gosto que me leiam e saibam o que acho das coisas. É uma forma de existir. Trabalho é a melhor maneira de escapar da realidade ? Paulo Francis


Jorge Pontual (*)

Conheci o Francis em 1983 quando fui trabalhar no Jornal da Globo, o telejornal da noite da Rede Globo, onde ele teve uma coluna durante anos, até nos deixar em 97. Francis comentava o principal assunto internacional do dia. O estilo inconfundível, incisivo e dramático que o tornou famoso em todo o país, era a marca dessa coluna. Mas eu preferia as reportagens que ele fazia de vez em quando, sobre arte e cultura, e passei a dar mais espaço a ele no telejornal para essas matérias, sempre brilhantes e profundas. Quando vinha a Nova York com minha mulher, Angela, ele nos recebia com o carinho e a doçura que sua persona televisiva irascível escondia do público. Aos amigos que reclamavam da postura às vezes agressiva do Francis no ar, Angela sempre revelava: "Mas ele é um doce!"

Em 1996, vim trabalhar no escritório da Globo em Nova York. Para Francis foi o final do triste calvário que ele enfrentou na gestão anterior, cinco anos de batalhas diárias e humilhações insensatas que ele enfrentou com o estoicismo e a elegância de sempre. Em 1995, ele passou a ter na direção do jornalismo da Globo um fã e amigo, Evandro Carlos de Andrade, e a maré virou a favor do Francis. Tive o prazer, e a honra, de participar da ampliação da presença dele no vídeo: primeiro, uma coluna semanal sobre Nova York, deliciosa, no Bom Dia Brasil; depois, o programa Milênio, que ele dividiu com Edney Sylvestre e firmou como um dos produtos mais inteligentes da Globo News.

Durante anos, Francis gravou sua coluna diária nas piores condições possíveis, no meio da redação da Globo em Nova York. Ele tinha a capacidade de guardar na cabeça seu próprio texto, complexo e longo, cerca de um minuto e meio, e falava de improviso diante da câmera, sem o teleprompter que dá segurança aos âncoras da TV. Mas, no meio da redação, com 15 pessoas trabalhando em volta, um telefone tocava, alguém falava, e lá se ia a concentração do Francis. Furioso, ele xingava e recomeçava do início. Vê-lo gravar era um espetáculo à parte. Em 96, a central de jornalismo decidiu reformar o escritório de Nova York e construir um estúdio. O maior beneficiado foi o Francis, que finalmente podia gravar suas colunas em paz.

Ele era a pessoa mais querida na redação. Sempre com uma palavra carinhosa para cada colega de trabalho, ajudou a muitos, financeiramente, em momentos de dificuldade. Mas ninguém sabia disso. Ele exigia sigilo absoluto. Só depois que o Francis morreu ficamos todos sabendo da dimensão extraordinária da sua generosidade.

(*) Correspondente da GloboNews em Nova York; texto publicado originalmente em <http://www.paulofrancis.com/main/main.htm>

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