Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O que falta lembrar

EMENDA AO 222

Alberto Dines

Na reta final da tramitação na Câmara, conseguida uma rara unanimidade graças à situação calamitosa em que se encontram todas as empresas jornalísticas, é conveniente lembrar alguns dados cruciais. Para evitar que esta história e a História não sejam soterradas na hora do triunfo:

** A iniciativa de sugerir uma emenda ao famigerado artigo não partiu do empresariado, dos profissionais, da academia, do governo, oposição ou da classe política. Partiu de uma entidade preocupada com os malabarismos marqueteiros e com a qualidade do jornalismo praticados no país em 1995, nos anos que se seguiram à derrubada de Collor de Mello. A primeira sugestão escrita foi publicada na seção "O Circo da Notícia", então veiculada no mensário Imprensa e hoje parte deste Observatório. Quem procurou o deputado Aloysio Nunes Ferreira para sugerir a emenda foi o LabJor (Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, da Unicamp), precursor deste Observatório, por intermédio de dois de seus dirigentes-fundadores. A primeira discussão pública ocorreu no seminário "A Imprensa Em Questão", organizado pelo mesmo LabJor, em abril de 1996, no auditório da Fiesp, em São Paulo, com a presença de dois vice-presidentes da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e do presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).

** A posição da Fenaj, antes mesmo de se discutirem os detalhes da emenda, foi de apoio a tudo o que pudesse significar uma capitalização das empresas jornalísticas ? inclusive com recursos do exterior ? já que isto significaria a manutenção e até mesmo ampliação dos postos de trabalho. Não pode ser esquecida uma entrevista deste Observador publicada em setembro de 1995 com grande destaque no jornal Unidade, do sindicato paulista. Uma posterior troca no comando da Fenaj promoveu o abandono desta postura de pragmatismo responsável.

** Embora nos dois primeiros anos de tramitação todos os grandes empresários de mídia estivessem engajados na luta pela aprovação da emenda, ficou evidente, a partir do fim de 1998, que o Grupo Globo dissociou-se da tendência majoritária. Como sempre, não opôs-se frontalmente mas trabalhou ativamente nos bastidores pelo impasse. Só aderiu há poucos meses, diante do endividamento generalizado que também o aflige.

** Embora a emenda ainda não tenha sido aprovada, ela já foi implantada de facto através de grandes e pequenas burlas levadas a cabo pelas principais empresas de mídia do país. E o fizeram com os seguintes expedientes: a) iniciado o processo de privatização da telefonia associaram-se a empresas com capital majoritário estrangeiro; b) venderam parte ou o total de suas instalações gráficas a grupos internacionais; c) alienaram parte do capital dos seus provedores de conteúdo para internet a grupos estrangeiros de telecomunicações ou criaram subsidiárias no exterior com as quais podem captar recursos locais ou internacionais que, depois, entram no "bolo"; d) como na redação da Constituição não foram previstas as possibilidades de transmissão de TV por satélite a questão ficou na "área cinza", estabelecendo-se por conta disso diversas parcerias com poderosos grupos internacionais para a exploração da TV por assinatura; e) porquanto seja lícito o licenciamento para editoras brasileiras de publicações estrangeiras em vernáculo (caso de Playboy, entre outras), contraria o espírito da lei a publicação de versões brasileiras por empresas estrangeiras mesmo quando encartadas dentro de veículos nacionais (caso do Time, Fortune, Wall Street Journal, The Economist etc.)

** As oposições, também nesta questão, mantiveram uma atitude omissa, embora na corrida final suas lideranças na Câmara tenham ajudado a apressar a tramitação. No início, tentaram estigmatizar a emenda com as habituais acusações de "neoliberalismo", "desnacionalização" etc. Depois, deram-se conta de que 30% do capital de uma empresa nas mãos de estrangeiros não chega a constituir perigo. Sobretudo diante da ampla desnacionalização que se processa clandestinamente. Comprova-se, mais uma vez, que as oposições são reformistas em algumas questões. Em outras, preferem o status quo ? quanto pior, melhor.

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