Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O vexame de Colin Powell

PEDIDO DE CENSURA 

Nem toda a mídia americana bate continência para o governo. Michael Young, correspondente da Reason Magazine, comentou de Beirute, em 8 de outubro, os "tolos" esforços da Casa Branca para censurar a TV por satélite árabe Al Jazira. "Não é sempre que líderes árabes defendem a liberdade de sua mídia diante dos americanos, mas foi justamente o que aconteceu quando o secretário de Estado dos EUA, Colin Powell, pediu ao emir-líder do Catar, Hamad bin Khalifa Al Thani, que contivesse a TV al-Jazira neste momento de conflito", escreveu Young. "O emir diplomaticamente aconselhou Powell a cuidar da própria vida."

Para Young, Powell pisou na bola. Não só ignorou os princípios constitucionais americanos, mas subestimou a importância da emissora para o emir. O general acertou, porém, ao perceber que a TV do Catar era um obstáculo para que os EUA convençam a opinião pública árabe contra Osama bin Laden. O canal não só recusou entrar no coro americano da "guerra ao terrorismo", como "exibe fortes críticas à política dos EUA no Oriente Médio e simpatiza com o regime talibã", afirma Young.

Al Jazira é o mais livre veículo de notícias do mundo árabe. Criada há cinco anos pelo emir Hamad numa região em que TV, rádio e jornais normalmente pertencem aos governos e são deprimentes, a Jazira tem sido um popular banho de ar fresco. A TV é mal vista pela maioria dos regimes árabes porque dá espaço às oposições, e seus apresentadores se vêem mais como jornalistas do que como funcionários do governo. Seus painéis de discussão abrem raras oportunidades para o debate genuíno.

O esforço de Powell em controlar o emir Hamad expôs o pior do comportamento americano. Revelou o desconforto dos EUA em lidar com as sociedades do Oriente Médio e seus inexplicáveis déspotas. Suas políticas deram certo com o Iraque e o Irã, mas os tempos mudaram. O Catar mesmo já foi alvo da ira americana. O emirado tem se mostrado independente da Arábia Saudita no assuntos da região, irritando Washington. Com apoio dos EUA, o emir criou laços com Israel ? agora congelados pela intifada ?, atraindo o ódio dos vizinhos árabes. Al-Jazira funciona, nesse contexto complicado, como um escudo protetor do emir.

O governo Bush faria melhor se usasse a TV do Catar para mostrar sua posição ao público árabe altamente cético sobre as ações dos EUA no Oriente Médio. Poderia mostrar também que os ataques terroristas nada têm a ver com o sofrimento do povo palestino. Al-Jazira provou que os árabes não são tolos quando conseguem fóruns legítimos para a discordância. A proposta de Powell de calar a emissora favorita dos árabes não foi apenas um insulto, mas também sugere que os EUA não têm argumentos sérios a oferecer na defesa de suas ações contra bin Laden.

    
    
                     

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