Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Olhar sobre o sensacionalismo

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15 MINUTOS

Como filme de ação, 15 minutos, de John Herzfeld (título referente à famosa frase de Andy Warhol ? "No futuro, todo mundo será famoso por 15 minutos"), é sonolento. Como suspense policial, tem a profundidade de um pires. O que resta de bom é a simples porém interessante dissecação da relação entre mídia e crime nos Estados Unidos.

Dois bandidos, um tcheco e um russo ? é impressionante como o Ocidente gosta de pôr seus ex-inimigos de Guerra Fria como os antagonistas em seus roteiros, como mostrou Umberto Eco ao analisar as histórias de James Bond, mas isso é outro assunto ? voltam aos Estados Unidos para acertar contas com um ex-parceiro, e acabam se envolvendo em novos crimes. Assistindo àquilo que a TV tem de pior ? programas sensacionalistas interessados somente em expor vidas privadas com o consentimento dos participantes ?, descobrem que podem não apenas escapar da prisão se matarem uma celebridade, como também ganhar fama e, claro, rios de dinheiro.

O policial Eddie Flemming (Robert de Niro) e o especialista em incêndios criminosos Jordy Warsaw (Edward Burns) vão chegando aos poucos aos criminosos, que matam a tal celebridade. Daí em diante, é um festival de chantagens, segredos, negociatas.

Não há nada de muito novo. Mas algumas reflexões sobre a mídia que aparecem durante 15 minutos são pertinentes. Pode, por exemplo, um programa de TV exibir as imagens cruéis do assassinato de alguém só porque os bandidos negociaram a fita com o produtor? Este tem obrigação, como cidadão, de denunciá-los?

E sobre as leis? Em um momento, o bandido tcheco diz: "Na América, ninguém tem responsabilidade sobre seus atos". Basta declarar-se insano. Essa imunidade é exagerada quando ele, diante das câmeras de TV, diz a Jordy que pode matá-lo. "Sou insano". Até que ponto a mídia ajuda na tarefa de qualificar criminosos como doentes ou conscientes de suas faculdades mentais?

15 minutos também mostra o poder da opinião pública e, sobretudo, da imprensa. O chefe dos bombeiros diz que não gostaria de punir o subordinado por causa de manchetes, mas acaba o fazendo. Tudo porque um pivete tentou assaltar Jordy, mas ficou algemado preso a uma árvore pelo bombeiro. No final, o assaltante aparece bem vestido, no programa do mesmo apresentador que negociou a fita do assassinato.

Em suma, John Herzfeld questiona o papel de certos setores da mídia que, ao se intrometerem vulgar e descaradamente no universo dual polícia-bandido, acabam se desvirtuando de seu papel e, não raro, tornam-se tribunais, influenciando diretamente na verdade.

15 Minutos é inferior a filmes que suscitam reflexões sobre as relações entre mídia e sociedade, como Mera coincidência, O quarto poder e ED TV. Justificativa simples: ele não é sobre imprensa, e sim, um filme de ação, mas que acaba se perdendo por misturar vários aspectos em relação ao jornalismo sensacionalista. Não deixa de ser, porém, um ponto de partida para discussões importantes sobre o assunto, principalmente em tempos de Marcinho VP e Fernandinho Beira-Mar.

(*) Jornalista, analista de sistemas

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