Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

"Os cursos precisam de uma chacoalhada geral"

ENTREVISTA / HAMILTON
OCTÁVIO DE SOUZA

Jornalista e professor, Hamilton Octavio de Souza é chefe do Departamento de Jornalismo da PUC de São Paulo e uma das lideranças do movimento que constituiu o Fórum dos Cursos de Jornalismo. Nesta entrevista ao OI, concedida a Victor Gentilli, esclarece as principais dúvidas com relação à nova entidade recém-criada em São Paulo.

Como você vê o panorama do jornalismo no Brasil e em São Paulo, em particular?

Hamilton Octávio de Souza ? O jornalismo está sofrendo uma crise semelhante a de outras atividades econômicas e culturais. É reflexo e parte de um quadro mais geral da sociedade brasileira ? mais especificamente do modelo político-econômico que o país adotou. As empresas jornalísticas apostaram na redução do estado e na dependência externa, e agora estão sofrendo com a queda da atividade econômica, a falta de investimentos, o pífio crescimento nacional (1,5%). Há mais de ano as empresas estão fazendo violentos cortes de pessoal, tentam se associar, promover fusões ? e agora apostam nas alterações do artigo 222 da Constituição para entregar parte da comunicação para o capital estrangeiro. Essa situação interfere diretamente na qualidade do jornalismo praticado no país. Aumenta o oficialismo, diminui o investimento na reportagem, as empresas preservam os profissionais mais dóceis e subservientes, e que aceitam trabalhar sem respeito às conquistas trabalhistas da categoria e por salários aviltantes.

O jornalismo brasileiro já perdeu a visão plural, democrática, o compromisso com a diversidade e com a verdade ? e agora está ameaçado de perder a independência, a identidade nacional.Por isso, é preciso criar canais de discussão e de articulação através dos quais se possa organizar uma reação a essa crise, se possa minimamente reafirmar valores que são fundamentais a uma prática jornalística que ajude a sociedade brasileira a encontrar um novo rumo.

E o panorama dos cursos?

H.O.S. ? Não tenho informação para tratar genericamente sobre os cursos de jornalismo espalhados pelo Brasil. Sei que temos bons cursos em São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina e Brasília. Mas devemos ter certamente muitos cursos sem o necessário aparato técnico e teórico, sem profissionais ou professores minimamente preparados.

Muitos cursos nortearam seus projetos para o mercado e estão contaminados pela crise desse mesmo mercado. Os cursos que trabalharam nos últimos anos com o ideal do jornalismo, com a reflexão e com a crítica, esses estão menos arrebentados. Mas todos os cursos, neste momento, estão precisando de uma chacoalhada geral ? é preciso sair da passividade e adotar postura afirmativa.

Diante dessa realidade, quais as iniciativas mais prementes que o Fórum pretende realizar, independentemente daquelas já divulgadas no manifesto de lançamento?

H.O.S. ? O Fórum dos Cursos de Jornalismo ainda é algo embrionário. Nasceu de contatos estabelecidos entre professores da Cásper Líbero, Metodista e PUC-SP. Nós fizemos algumas reuniões e discussões, e percebemos que podemos unir forças para semear um debate mais amplo. Vários outros cursos já manifestaram interesse em caminhar com a gente, entre os quais a ECA-USP, a Anhembi-Morumbi e a FIAM.

Acho que podemos debater questões que nos afetam, como regulamentação da profissão, sistemas de avaliação, projetos pedagógicos; e as que têm a ver com o nosso mercado profissional ? a crise das empresas nacionais, o capital estrangeiro na mídia, a democratização das comunicações. Podemos também, e acho que devemos caminhar para isso, provocar o debate com outros atores políticos e econômicos e tentar interferir na realidade para melhorar a qualidade da formação superior e do mercado profissional do jornalismo.

O Fórum reúne professores, estudantes e profissionais de imprensa. A associação é individual ou por cursos?

H.O.S. ? Estamos convidando professores e alunos de jornalismo para que participem do Fórum. A participação é individual. Na organização, temos um coletivo que representa os cursos que iniciaram esse movimento: PUC-SP, Cásper Líbero e Metodista.

O Fórum pretende iniciar formalmente suas atividades num evento na Cásper Líbero durante a Semana Santa. Poderia antecipar a programação do evento?

H.O.S. ? Nós alteramos a data e o local inicialmente previstos. Mas conseguimos o Teatro Gazetinha, que tem 900 lugares, e quinze salas da Cásper Líbero, na avenida Paulista. O 1? Encontro do Fórum dos Cursos de Jornalismo será nos dias 29, 30 e 31 de março, na Semana Santa. A programação contempla reuniões plenárias e nos grupos temáticos. Ainda estamos acertando o temário, mas certamente vamos tratar de (1) capital estrangeiro na imprensa, (2) democratização da comunicação, (3) formação superior e regulamentação da profissão, (4) sistemas de avaliação dos cursos de jornalismo, (5) valores e princípios que devem nortear o jornalismo no Brasil. Queremos tratar esses temas na interface escola-mercado. Queremos aprofundar nosso diagnóstico e nossa visão sobre o jornalismo praticado pelo mercado.

De 28 a 30 de abril haverá o V Fórum Nacional de Professores de Jornalismo. Os professores ligados ao Fórum de São Paulo pretendem participar do evento?

H.O.S. ? Acho que essa é uma questão que poderá surgir nas nossas reuniões. Em princípio, cada curso e cada escola deve verificar sua participação. Nós, da PUC-SP, já discutimos essa questão em reunião do Departamento de Jornalismo e aprovamos que devemos participar do Fórum de Porto Alegre.