Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Pacto Globofolha e o pacto de silêncio

 

Gilberto C. Marotta

Mesmo uma leitura desleixada da imprensa atual não impede a percepção de que alguns grandes jornais (escritos e falados) – e não só os candidatos, como seria de se esperar – já estão em campanha. Ora miram em 2002 para acertar 2000. Ora o contrário.

Um episódio recente e exemplar dessa história é a ressurreição daquela velha campanha em torno da já mundialmente consagrada violência do Rio de Janeiro, que ganhou novo impulso na mídia por conta da proposta demagógica (também esta ressurreta) do prefeito Conde de colocar os exércitos nas ruas.

Que o PFL do prefeito tenha saudades do exército nas ruas é fato passível de compreensão. Afinal, algumas vocações são tão naturais e arraigadas que não seria sensato esperar que se apagassem assim, na poeira do tempo. O que se estranha no caso é a complacência da mídia com tais vocações – logo a mídia que, de um modo geral, foi tão atingida por elas.

Pouco importa que todas as estatísticas comprovem que a violência exacerbou-se no Rio (pari passu à truculência da polícia) a partir do governo Moreira Franco. Para a opinião pública ficará sempre a impressão de que foi Brizola quem trouxe a insegurança para o estado, tal a força da campanha orquestrada por importantes setores da mídia contra ele.

Também não importa que se comparem as estatísticas do Rio com São Paulo: haverá sempre gente capaz de dizer que o Rio é a metrópole mais violenta do país, quiçá do mundo. Eis a herança que nossa imprensa nos legou, com uma cobertura tão sensacionalista de um assunto tão sério.

Há mais por trás de tudo isso, porém. Sempre que um candidato de esquerda avança no país, demonstra algum fôlego para alcançar o poder majoritário, forças conservadoras extremamente organizadas se unem para minar seu caminho, e contam com a ajuda, ora explícita (como na edição para o JN do debate Lula x Collor em 89 ou, mais recentemente, no episódio do Ibope nas eleições para o governo do estado de São Paulo), ora velada (isso temos visto todos os dias), de boa parte da imprensa nacional, que lhes tem servido de garota de recados.

Nada, porém, do que tenho visto, teria me preparado psicologicamente para a última proeza de Veja. Desde a capa, elegendo Ciro Gomes o expoente máximo de uma tal esquerda “light” (que será isso? terão as ideologias se deteriorado tanto a ponto de as correntes político-partidárias poderem ser comparadas a refrigerantes ou margarinas, com versões light e diet, para todos os gostos?), até o outdoor degradante (“Sabe quem está namorando o Ciro Gomes agora? O eleitor”), passando pela extensa matéria, Veja esforçou-se ao máximo para oferecer aos leitores tudo, menos jornalismo de qualidade. Ou melhor, esforça-se já, tão prematuramente, diante do óbvio fracasso de suas apostas anteriores, para oferecer aos eleitores um cardápio diferente e mais palatável que Lula em 2002. E isso é só o começo…

 

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