Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Paulo Ricardo Moreira

GLOBO vs. SBT

"Rede Globo: ?SBT tem consciência do valor dos direitos que adquirimos?", copyright O Globo, 31/10/01

"A Central Globo de Comunicação divulgou ontem à tarde uma nota em resposta a uma carta assinada pela direção do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) e distribuída à imprensa no mesmo dia. Anteontem, a Rede Globo decidira entrar na Justiça contra o SBT por plágio porque, domingo passado, a emissora paulista estreara o programa ?Casa dos artistas?, um reality show inspirado no formato do holandês ?Big brother? cujos direitos pertencem à Globo desde agosto deste ano. Nesta época foi criada a Endemol Globo, em conjunto pela emissora e pela Endemol Entertainment (com base na Holanda, mas pertencente ao grupo espanhol Telefónica).

A nota da Central Globo de Comunicação divulgada ontem diz que ?ignorar a contribuição da emissora ao desenvolvimento da indústria de entretenimento brasileira é desconhecer a história de 35 anos de artistas, autores e profissionais de TV ou falta de seriedade?. No comunicado, a CGCom lamenta ainda o tom irônico da carta do SBT.

Carta do SBT foi distribuída após decisão da Globo

A carta da diretoria do SBT foi distribuída à imprensa ontem de manhã, por volta das 11h30m. Após tomar conhecimento da decisão da Rede Globo de entrar na Justiça, a cúpula da emissora paulista passou a noite de segunda-feira elaborando o documento intitulado ?Não há direito a monopólio?.

Logo no começo, a carta diz que a ?Rede Globo comemora a primeira derrota do Fantástico ameaçando processar o SBT por plágio de programa não exibido?.

Em tom irônico e provocativo, a carta do SBT começa enumerando as vitórias da emissora de Silvio Santos contra os programas da Rede Globo na guerra pelo ibope:

?Não satisfeito em derrotar o índice de audiência da TV Globo durante todo o domingo, o SBT cometeu a leviandade de, pela primeira vez, derrotar o ?Fantástico?, sem pedir as desculpas devidas a este pilar de moralidade e correção que é a TV Globo.?

O documento do SBT termina dizendo ainda que ?o SBT, enquanto a Globo não for o único veículo, o único empregador, não for o único Poder, o Big Brother que anseia ser, dona da televisão que nos vigiará, até este dia, o SBT continuará trabalhando e derrotando, sem luxo e com modéstia, derrotando o poder, a riqueza e a prepotência, hoje disfarçados em moralistas?.

?A casa dos artistas?, que estreou na noite de domingo, promove o convívio de 12 artistas famosos durante 45 dias e acompanha o estilo do holandês ?Big brother?. Diariamente, durante meia hora, a emissora pretende exibir os principais momentos da relação entre artistas como Supla e Marco Mastronelli.

A atração foi ao ar em absoluto sigilo, sem que os próprios funcionários do SBT soubessem."

 

"?Fantástico? é novo alvo na ?guerra? do Ibope", copyright Folha de S. Paulo, 1/11/01

"Entre todas as preocupações que a estréia do programa ?Casa dos Artistas?, do SBT, trouxe para a Globo, uma das maiores é a concorrência com o ?Fantástico?.

O ?reality show? estreou sem divulgação prévia no domingo passado e venceu a atração global pela primeira vez em sua história, com média de 31 a 28.

O ?Fantástico? é responsável pela venda do terceiro anúncio mais caro da televisão. Na tabela nacional, um comercial de 30 segundos no programa custa R$ 141.180, perdendo apenas para o ?Jornal Nacional? (R$ 166.690) e a novela das oito (R$ 155.080).

Com a queda de 12% na venda de publicidade no primeiro semestre deste ano e a previsão de um acirramento da crise no mercado, a emissora teme que um de seus três principais produtos possa ser abalado comercialmente.

A estréia de ?Casa dos Artistas?, no último domingo, não é a primeira demonstração de que a ?guerra? entre Gugu e Faustão já é dada como vencida pelo SBT.

Silvio Santos deu recentemente outros indícios de que seu novo alvo é o ?Fantástico?. Um deles foi a mudança do horário do ?Show do Milhão?, que foi antecipado e passou a ser exibido logo depois do ?Domingo Legal?, de Gugu, para tentar segurar a audiência por mais tempo na disputa com o programa da Globo.

O ?Domingo Legal? também tem concentrado as atrações mais fortes para o final, hora em que o ?Domingão do Faustão? já saiu do ar e começou o ?Fantástico?. Foi assim, por exemplo, quando o programa do SBT fez a cobertura do sequestro de Silvio Santos.
Percebendo a estratégia da concorrente, a direção da Globo tem discutido a ameaça ao ?Fantástico? há algumas semanas. Nos últimos dias, com a novidade da ?Casa dos Artistas?, a ordem é para que as reportagens sejam fortes, capazes de atrair a audiência.

A questão principal, avalia a cúpula da Globo, não é uma briga entre os ?reality shows? ?No Limite? e ?Casa dos Artistas?, já que o global venceu o programa de 32 a 27, durante os 38 minutos em que concorreram. Na média geral, a atração da Globo venceu o SBT de 33 a 22 (cada ponto equivale a 44 mil domicílios na Grande SP).

O diretor de ?No Limite?, J.B. de Oliveira, o Boninho, falou à Folha, do Pará, onde a gincana está sendo gravada, e afirmou que não deve alterar a linha do programa, mantendo a linha da edição.

Anunciante

A vitória isolada de ?Casa dos Artistas? no último domingo, no entanto, não é suficiente para mudar a percepção do anunciante, na opinião de Flávio Corrêa, presidente da Associação Brasileira dos Anunciantes (ABA). Para ele, é preciso que o programa mantenha a liderança por mais de um mês, pelo menos, para que as agências passem a reavaliar a estratégia dos anúncios.

?É claro que, se ficar claro que houve uma mudança consolidada na audiência, o mercado irá responder a isso. A publicidade é um ato de venda e é importante saber quantas pessoas assistem ao programa. Mas as atitudes não são imediatas, não responderiam a vitórias isoladas?, afirma Corrêa.

O ?Show do Milhão? aos domingos já é considerado pelo mercado publicitário um produto confiável, tanto que o anúncio no programa é o mais caro do SBT. O comercial de 30 segundos custa, na tabela, R$ 85.148, o mesmo valor que o programa de Silvio Santos que vem depois do jogo e costuma manter a audiência elevada.

Processo

Além da disputa por audiência, ?Casa dos Artistas? deve levar Globo e SBT a uma longa e polêmica batalha judicial. A Globo acusa Silvio Santos de plagiar o ?Big Brother?, do qual é detentora dos direitos de produção.

No programa de Silvio Santos, planejado em segredo para evitar que a Globo tentasse impedir a estréia na Justiça, 12 artistas ficam presos em uma casa e são filmados 24 horas por dia. ?Casa? ficará no ar até o dia 16 de dezembro e o vencedor receberá R$ 300 mil.
De segunda a sábado, o SBT exibe uma edição dos ?melhores momentos? e, no domingo, Silvio Santos deve participar da atração comandando alguma gincana.

A concepção é a mesma do ?Big Brother?, sucesso em vários países, que ganhará uma versão brasileira pela Globo em 2002. A manobra de Silvio Santos irritou a Globo e gerou uma ?guerra? de comunicados entre as emissoras. Na segunda-feira, a Globo soltou uma nota dizendo que o programa era um plágio. Na terça, o SBT respondeu, acusando a Globo de monopólio, e a emissora redigiu uma ?tréplica?."

 

"SBT não envia programa para a classificação", copyright Folha de S. Paulo, 1/11/01

"Para garantir a surpresa da estréia de ?Casa dos Artistas?, Silvio Santos acabou infringindo uma norma da portaria 796, do Ministério da Justiça, não enviando a atração para a prévia classificação do governo.

Qualquer atração que não seja ao vivo deve receber classificação do governo, que indica para qual faixa etária não é recomendada. A parte da lei que torna o horário de exibição obrigatório está suspensa pela Justiça, mas a classificação indicativa continua válida."

 

"Globo contra-ataca", copyright Jornal do Brasil, 1/11/01

"No fim da tarde de ontem, o juiz da 4? Vara Cível de Osasco, em São Paulo, Paulo Campos Filho, concedeu liminar favorável à Rede Globo determinando a proibição de exibição do reality show Casa dos artistas, do SBT. A decisão, que prevê multa diária de R$ 200 mil caso não seja cumprida, é mais um round na guerra que começou a ser travada, entre Globo e SBT, na segunda-feira. Uma guerra repleta de acusações, farpas e ironias, que teve como ponto de partida a estréia do programa Casa dos artistas na emissora de Silvio Santos, no último domingo, na surdina, sem qualquer anúncio.

A brincadeira – que consiste em confinar 12 artistas, por sete semanas, numa mansão do bairro paulistano do Morumbi, com a finalidade de ver como eles se relacionam – tirou o sono da direção da Globo. Por dois motivos. O primeiro, mais imediato, foi o fato de que a nova atração do SBT ofuscou a estréia, no mesmo dia, da terceira fase de No limite, estrela da programação global.

Ibope – Na meia hora em que os dois programas estiveram no ar, na noite de domingo, a Globo marcou 32 pontos de média no ibope, sendo seguida bem de perto pelo SBT, que ficou com 27. O outro motivo de irritação na direção da emissora carioca foi o fato de Casa dos artistas se utilizar amplamente dos princípios do reality show holandês Big brother, cujos direitos para o Brasil pertencem à Globo. Num memorando divulgado na segunda-feira, a emissora anunciou que processaria o SBT, que reagiu com artilharia pesada, e, entre outras coisas, acusou a concorrente carioca de não deixar a indústria do entretenimento crescer.

O comunicado oficial divulgado terça-feira pelo SBT, apesar do tom jocoso, trouxe à tona um assunto sério: a agressiva política de concorrência que rege a TV aberta brasileira. A nota, assinada pela diretoria da emissora paulista, vai mais longe. Pela primeira vez, oficialmente, o SBT acusa a Globo de exercer monopólio de mercado, ao ?pagar multas e assumir os processos judiciais de autores sob contrato, para que o SBT não possa contar com um único escritor?. Acusa-a ainda de ?comprar eventos para não exibi-los?, ?aliciar contratados apenas para desorganizar os concorrentes? e contar ?com a exclusividade apenas de todo o futebol brasileiro e das próximas duas Copas do Mundo?.

A agressividade da política de mercado da Globo é inegável. Basta lembrar que, em 1999, contratou de uma só tacada nomes como Serginho Groisman e Jô Soares, ex-SBT, Ana Maria Braga, ex-Record, Luciano Huck, ex-Band, e Cazé Peçanha, ex-MTV. Groisman, que chegou a ter uma rodada de negociações em um hangar do Aeroporto Santos Dumont, no Rio, foi encaixado na madrugada de sábado da Globo, horário de baixíssima audiência.

Visibilidade – O talk show de Jô Soares obtém na Globo quase o mesmo índice de audiência que tinha no SBT. Ana Maria, recordista em tempo de permanência no ar na Record, ganhou um programa diário de uma hora no início das manhãs. Luciano teve maior visibilidade nas tardes de sábado, mas perde para o Programa Raul Gil, da Record. Cazé, depois de uma frustrada experiência nas noites de domingo, não terá seu contrato renovado.

A Globo justifica as investidas no mercado. ?É parte essencial da estratégia da Rede Globo ter os melhores profissionais em todas as áreas, tanto artísticas, como técnicas e administrativas?, ressalta nota da Central Globo de Comunicação (CGCom). A emissora, no entanto, garante que ?não negocia, não paga multa, nem aceita multa de nenhum talento seu que queria rescindir o contrato?. Segundo um executivo da Globo, este motivo impediu contratações como a do pagodeiro Netinho, José Luís Datena e o próprio Raul Gil, com quem a Globo tentou negociar recentemente.

Pode-se dizer, no entanto, que cada acusação feita pelo SBT tem endereço certo, já que as duas emissoras se estranham há bastante tempo. Em 1996, por exemplo, o SBT tentou levar Benedito Ruy Barbosa, Walter Negrão e Glória Perez, três autores do primeiro time da Globo, que ainda tinham contratos válidos com a emissora. Os três chegaram a assinar com o SBT e voltaram atrás após contrapropostas da Globo. O imbróglio foi parar na Justiça: Silvio Santos processou os autores para receber a multa rescisória, em torno de R$ 36 milhões. Em primeira instância, a causa foi ganha pelo SBT, mas o processo ainda está em curso.

Ponteiros – A humorista Gorete Milagres, hoje nos quadros do SBT, também já esteve no centro da disputa. Em 1998, Gorete, criadora da personagem Filó, pediu emprego na Globo, foi encaixada em A turma do Didi, chegou a gravar alguns pilotos e, quando a emissora quis impor mudanças, voltou correndo para o SBT. Em 1999, Globo e Gorete, com um salário de R$ 500 mil, acertaram novamente os ponteiros. Por pouco tempo. Diante de uma contraproposta milionária de Silvio Santos (R$ 2 milhões e o cargo de assessora artística), a humorista desistiu seis dias depois. Em tempo: Gorete, hoje ainda contratada pelo SBT, está fora do ar.

E isto apenas quando se fala das contratações artísticas. Quando o assunto caminha para eventos e produtos, a guerra continua. Consta que a Globo, no ano passado, comprou os direitos da novela colombiana Jo soy Bete, la fea, sucesso no mundo todo, só porque o SBT estava de olho no dramalhão. O mesmo aconteceu com a Festa do Peão Boiadeiro de Barretos. A Record adquiriu os direitos em 1999 e a Globo correu atrás em 2000 – a acabou exibindo apenas pequenos flashes.

?Este ano foi a vez de o SBT fazer o mesmo com a Festa de Barretos e com a Oktoberfest?, acusa um executivo da Globo. De acordo com a assessoria de imprensa do SBT, o contrato não previa a exibição integral tanto do evento country quanto do outro.

Bastidores – Nem o milionário contrato entre o SBT e a rede mexicana Televisa – R$ 200 milhões em troca de exclusividade de cinco anos – escapou da competição. Nos bastidores do SBT dizem que a formalização do acordo demorou porque a Globo tentou flertar com a Televisa ao mesmo tempo que o SBT.

Voltando o foco da questão para a disputa do formato do reality show Big brother, uma das frentes usadas pela Globo para enfrentar o SBT, a publicação de anúncios de página inteira nos jornais, era não só impensada até bem pouco tempo como também amplamente usada pela emissora de Silvio Santos para provocar a concorrente. ?Na essência, a importância deste caso só mostra que o mercado de TV está mudando seu eixo. E ele aponta para o fim do monopólio da Globo sobre a audiência e os patrocinadores?, ressalta Luiz Gonzaga Mineiro, diretor de Jornalismo da Record."

    
    
                     
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