Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Ópera-bufa na academia

UFRGS

Francisco Rüdiger (*)

Especulamos noutra ocasião [ver remissões abaixo] sobre a organização de uma Sociedade dos Amigos do Plágio em nossa universidade. Fatos há pouco trazidos à luz dão conta da ópera-bufa que, seguindo essa linha, reina há mais de dois anos na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Em 2000, trabalho infestado de plágio, fraudulentamente portanto, mas com nota máxima e vários elogios, conferiu o diploma de mestre a Gilberto Kmoham no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFRGS. Foram plagiados na ocasião, entre outros, autores como Sérgio Paulo Rouanet, Olgária Matos, Leandro Konder, Jeanne Marie Gagnebin, Willi Bole, Peter Bürger e Susan Buck-Morss.

Prosseguindo as investigações, o professor Luis Milman, denunciante do caso, descobriu na revista Famecos (PUS-RS, Vol. 13, 2000, p. 68-82) comunicação científica redigida e apresentada, com colaboradores, pelo referido mestre, no Encontro Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de 2000, intitulado "Poesia visual, hipertexto e ciberpoesia".

Enquanto aguardo do professor José Luís Braga, doutor pela Sorbonne, as referências bibliográficas e acadêmicas que sustentam e legitimam a instituição, por ele defendida em "parecer técnico", do "plágio não-intencional" em nossa vida acadêmica [ver remissão abaixo], noticio este fato, entre outras razões, para o leitor julgar o sentido e o valor do inqualificável "Manifesto em defesa da universidade pública e democrática" que colegas de minha faculdade, em grande número, fizeram publicar [ver remissão abaixo] e mantêm exposto no mural do Programa de Pós-Graduação de Comunicação e Informação, Fabico/UFRGS.

Cobertura aos envolvidos em fraude documentada seria título mais adequado para o referido documento, fundido em conclave de compadres, porque, conscientes ou não, escrevem eles sobre matéria na qual lhes falta conhecimento. Afinal, se desejassem estudar o caso não subscreveriam um texto assinado por dois docentes que, sabe-se, são colegas de plágio do autor da dissertação, professores Ana Cláudia Gruzinski e Sergio Caparelli (orientador de Kmoham).

Lamentável bufonaria

Parece inacreditável, sim, leitor; mas, mais uma vez, é fato, passível de comprovação, já notificado aos responsáveis pelas publicações. No artigo elaborado a seis mãos, confira, se tiver coragem: pelo menos página inteira do texto (formato 30 x 21 cm) é copiada da tradução para o espanhol da obra de Peter Burger, Theorie der Avantgarde.

Quem pensa que todo mal pode ser sanado, que a vida acadêmica pode ser sustentada em enganação argumentaria que, embora copiada literalmente (sem aspas), a obra está citada, na edição original (Suhrkamp Verlag), nas referências bibliográficas do trabalho. Descansaria por pouco tempo, porém, ao saber que os plagiadores não copiaram só ou em maior parte o texto do ensaísta alemão, preferindo em vez espoliar a lavra do talvez menos notável, o prefaciador castelhano da versão da Editorial Península (Barcelona), Hélio Piñon.

Reúne o texto outros plágios, como os reúne em sua quase totalidade o texto da dissertação de mestrado em juízo, "O conceito de aura em Walter Benjamin". Deixemos, porém, que com eles se divirtam seus autores e os acólitos que, todos juntos, subscreveram, a propósito do caso, o ridículo, senão vexatório "Manifesto em defesa da universidade pública e democrática".

Passaram-se dois anos da denúncia do estelionato acadêmico e da fraude contra a universidade pública federal. Até agora, esta não tomou nenhuma das medidas previstas pela legislação. Desde que assumiram suas posições no caso, o denunciante e este signatário tiveram a dignidade atacada em seu local de trabalho. Atingidos por omissões administrativas, têm vivido diversos tipos de prejuízos. Qual será o ato final dessa lamentável bufonaria, que só pode envergonhar nossa universidade?

(*) Professor da UFRGS, doutor em Ciências Sociais (USP)

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