Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Por que o boicote não é irresponsável

PROVÃO

É engraçado o modo de pensar e argumentar do pensamento conservador. Primeiro, não se pode ser contra. Tudo bem, pode ser contra, mas tem que ter algo para pôr no lugar. Tudo bem, há algo para pôr no lugar, mas bem que as duas opções poderiam conviver pacificamente. Tudo bem, são objetivos diferentes, mas não protestem. Tudo bem, protestem, mas não prejudiquem ninguém, se dêem mal vocês.

Ouso me intrometer na discussão mesmo não fazendo o Provão. Ora, bolas, não é nenhum desserviço à minha escola que os formandos boicotem a prova. Esse argumento é de quem acredita no ranking ou no conceito A, B, C, D, E, F, G, H, Z, Y, B que sai dele. Tirar A é sim, para mim, um desserviço. Mas eu não quero convencer disso a quem acredita no Provão. Faz parte da coerência do raciocínio.

Parece óbvio para todos que um dos apelos principais do Provão é o midiático. E o principal objetivo do boicote é mexer nisso. Se não acreditamos no ranking, desvirtuemo-lo, pois. É claro que quanto maior o boicote melhor. Mas o fato de os 15% de provas em branco estarem nas escolas mais "renomadas" (sabe-se lá por que) do país faz com que o ranqueamento em Jornalismo fique sem valor. E faltar à prova está longe de ter esse efeito.

Não estamos brigando para saber quem é o mais radical. Ficamos com o sentido mais interessante ? e não pejorativo ? da palavra, e tentamos ir à raiz da questão. Não temos que nos prejudicar nem apanhar da polícia para nos manifestarmos. Nosso objetivo está claro. Não é nem apanhar nem aparecer. É não permitir que uma avaliação equivocada se torne referência para a área.

O MEC, vale salientar, não é preservado em nada com essa atitude. Foi o boicote que levou a discussão do Provão à Comissão de Educação da Câmara, em audiência de que participei como expositor [ver observação abaixo]. Como resultado dessa audiência, da qual até os deputados mais conservadores saíram descontentes com o Provão, deve emanar um projeto propondo o fim do exame. Se o boicote não incomodasse o MEC, eles não iriam dar as bolsas da Capes aos melhores colocados. Não iriam fazer a revista do Provão (que bizarrice!) com uma charge ridícula (confiram) e com uma frase prepotente de uma alta patente da Globo comentando o boicote de escolas fluminenses. Numa lembrança vaga, algo como "os estudantes da UFF e da UFRJ formados em 2000 são como os vinhos Bordeaux de não sei quando, uma safra sob suspeita". Francamente.

Com o não-comparecimento dos que são contra o Provão, os que são a favor fazem a prova e tiram A. E o debate sobre o tema é abafado. E as reformas ou discussões sobre currículo são interrompidas. Afinal, estamos num curso nota A. Perguntem aos alunos da UFRJ ou da UnB o que os fez boicotar o Provão no ano passado.

Sabemos de nossa condição de Davis lutando contra Golias. Se o MEC usa métodos coercitivos de avaliar ? se não for, não recebe o diploma ?, cada um tem uma funda na mão que usa se quiser. Por que será que quando os formandos da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) deixaram de comparecer (só três fizeram a prova) houve pouquíssimo destaque? Deixem eles lá, não atrapalham o nosso exame. E os vários Davis tiveram que comparecer ao Provão no ano seguinte porque nem na Justiça conseguiram seu diploma.

Agradecemos o desafio que nos é colocado, mas fiquem tranqüilos. Não se preocupem em escolher a nossa estratégia de ação. O não-comparecimento é uma delas, mas a entrega de provas em branco tem se mostrado mais eficaz. Pelo menos sobre isso quem tem que decidir são os próprios estudantes.

Obs.: Sobre a audiência, escrevi um texto para a revista Avaliação, que enviarei a este Observatório assim que publicado.

(*) Estudante do 5? ano de Comunicação Social (rádio e TV) na USP

Curiosa a forma como João Brant qualifica o pensamento diferente do dele. Embora não cite meu nome, ele se refere claramente a mim e me eleva ao status de porta-voz do pensamento conservador. O autor diz que não sabe porque as melhores escolas são aquelas que boicotam; mas sabe e prefere não dizer. Da mesma forma, ele sabe que quando outras escolas (não tão qualificadas) boicotam, o efeito é desastroso. Se os alunos em vez do "boicote" fizessem boicote (faltassem à prova), o efeito midiático seria maior ainda. E, em vez de prejudicar suas próprias escolas, prejudicariam o MEC, que se veria em palpos de aranha para negar o diploma ? com mais mídia ainda. Falo de 15% de ausências, de movimento coletivo. Mas João Brant ainda deve explicar porque sou conservador.

    
    
                     

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