Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Procuram-se roteiristas, autores e dramaturgos

TEXTO MULTIMÍDIA

Alexandre Gennari (*)

De um lado, estão aqueles que garantem que a origem da “crise da dramaturgia” brasileira está na falta de novos autores, de roteiristas de talento. De outro, aqueles que acreditam que há novos talentos, mas faltam oportunidades para que eles se projetem e aperfeiçoem sua técnica.

Marcelo Migliaccio, em artigo publicado pela Folha de S.Paulo [“Teledramaturgia ? esperança convicta” <http://www.webwritersbrasil.com.br/clipping/clip_r_30.htm>], comenta a substituição do roteirista Benedito Ruy Barbosa por Walcyr Carrasco na novela Esperança, da TV Globo. Ao refletir sobre o tema, Marcelo afirma que “todos sabemos o quanto é desgastante o trabalho de um autor de novelas (…)” e conclui que há “uma carência real por novos autores, capazes de reoxigenar a dramaturgia e, ao mesmo tempo, liberar fôlego aos autores consagrados”.

A suposta carência detectada por Marcelo parece não ser exclusividade da televisão. Em crítica sobre o novo filme do diretor Cacá Diegues [“Deus é brasileiro. Mas sabe fazer roteiros?” <http://www.webwritersbrasil.com.br/clipping/clip_r_34.htm>], Rubens Ewald Filho questiona: “Deus é brasileiro. Mas sabe fazer roteiros?” E explica: “Depois de um início curioso e promissor, o roteiro se perde por caminhos tortuosos e mal explicados (…) parece que Cacá começou trabalhando com João Ubaldo Ribeiro (autor do conto que originou a fita), mas de uma altura em diante o roteiro foi desenvolvido pelo próprio diretor e parceiros, inclusive sua mulher. Isso talvez explique porque o filme caminha em círculos, prejudicado pela falta de humor, por personagens mal delineados e pela ausência de uma mensagem mais concreta.”

O caso descrito por Ewald Filho é bastante específico, mas há uma corrente entre os profissionais de cinema que aponta a valorização do roteirista como uma das principais razões para a recente evolução da produção nacional.

Ainda falta o teatro, sobre o qual Marici Salomão, em artigo publicado pelo Estado de S.Paulo [“Eventos jogam luz sobre a produção dramatúrgica” <http://www.webwritersbrasil.com.br/clipping/clip_r_38.htm>], revela que “quatro eventos que objetivaram estimular e dar visibilidade à produção dramatúrgica paulista no ano passado prosseguem este ano com investimentos que, somados, chegam à casa do R$ 1,4 milhão (…) a ênfase ainda parece ser a de revelar novos autores…”

José Carlos Aragão, por sua vez, em artigo publicado neste Observatório [remissão abaixo], contesta a teoria de que “a tal ?crise da dramaturgia?, de que tanto se fala nas coxias, nos meios acadêmicos e nos botequins” tenha origem na falta de autores talentosos e, conseqüentemente, de bons textos. Segundo Aragão, produtores, diretores e atores preferem “buscar no exterior textos ditos ?universais?, que fizeram sucesso em Londres ou Nova Iorque (…) textos que não são ambientados aqui, não falam nossa língua, não entendem nossas especificidades culturais, geográficas, arquitetônicas, econômicas, políticas e, por isso, precisam ser traduzidos e adaptados”. E considera balela a alegação de que “não há textos brasileiros dignos de serem encenados”, Para ele “a razão de fundo é muito mais econômica (…) e, se há uma razão cultural em tudo isso, só pode ser a nossa histórica vocação terceiro-mundista de subserviência ao que o Hemisfério Norte nos empurra.” Mais uma vez, a questão dos “Enlatados” vem à tona, aqui, como um dos motivadores da falta de incentivo à formação de novos autores multimídia.

Fechando o ciclo há o artigo de Samir Yazbek, publicado no Estado de S.Paulo [“Iniciativas reavivam interesse dos autores” <http://www.webwritersbrasil.com.br/clipping/clip_r_39.htm> ] no qual o autor aponta para um crescente interesse, nos últimos anos, pela dramaturgia no Brasil. Samir alerta para o fato de que “no panorama teatral brasileiro é o talento que muitas vezes, por falta de conhecimento, costuma não se desenvolver plenamente (…) há bem poucos lugares em que se ensina dramaturgia no país (…) é sempre triste o aborto de um jovem talento promissor.” Samir aponta para a necessidade da geração de oportunidades e da cessão de espaço para novos autores, dramaturgos e roteiristas. Embora fale de Teatro, isso vale também para a televisão e para o cinema.

A “crise da dramaturgia” que vemos no teatro, na televisão e no cinema, talvez tenha surgido no mesmo berço da escassez do “bom texto” no jornalismo online ou do raro surgimento de novos escritores de talento. Este berço é o modelo de ensino do país, incapaz de formar indivíduos pensantes.

Além disso, para que apareçam novos (e talentosos) autores, dramaturgos, roteiristas e, conseqüentemente, novos bons filmes nacionais, boas peças de teatro e melhores programas de televisão; é preciso fomentar o surgimento de projetos que garimpem estes profissionais e proporcionem a eles conhecimento e oportunidades. Marici Salomão cita alguns projetos assim em seu artigo, enquanto Yazbek lamenta que “não se forja a consciência de um dramaturgo da noite para o dia”.

Também na arte, inclusive na de escrever roteiros, é preciso
que se façam investimentos no ensino e na formação
das pessoas. Não há outro caminho.

(*) Roteirista multimídia, editor de conteúdo do webwritersbrasil e escritor.

Leia também