Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Reali Júnior, Livio Oricchio e Chiquinho Leite Moreira

FÓRMULA 1 ANTIESPORTIVA

"Imprensa européia bate forte", copyright O Estado de S. Paulo, 14/05/02

"Os jornais europeus foram duros nas críticas à direção da Ferrari, por causa da ordem dada a Rubens Barrichello para deixar Michael Schumacher ultrapassá-lo no final do GP da Áustria. As publicações atacam Jean Todt, o diretor-esportivo, que é na verdade quem decide na equipe, e Schumacher.

Barrichello também não passou impune.

Os jornais ingleses deram destaque ao episódio. O The Sun traz em manchete ?O dia que a Fórmula 1 morreu de vergonha?. O The Daily Mirror decreta: ?O fim da Fórmula 1.? Os editoriais são pesados. Richard Williams, do The Guardian, definiu a ação de Schumacher no pódio, empurrando Rubinho para o primeiro degrau, como ?gesto hipócrita e nauseante?.

Barrichello recebeu críticas também, como a de Kevin Eason, do The Times, que o chama de mercenário. Eason argumenta que o piloto agiu daquela forma depois de ter assinado um contrato de US$ 12 milhões por dois anos. Enfoque semelhante teve o Corriere dello Sport, de Roma: ?Rubens, pago para perder.?

Nenhum jornal francês, emissora de rádio ou de TV justificou o que muitos definem como ?a palhaçada da Áustria?. O L’Equipe, principal periódico esportivo do país, abriu a primeira página com o título: ?Cartão Vermelho, uma dupla vitória da Ferrari com gosto amargo.? O Le Monde indaga: ?Depois de tal gesto, que sentido deve ser dado à noção de competição e de eqüidade??

Até o mais importante jornal esportivo da Itália, Gazzetta dello Sport, ligado ao grupo Fiat, dono da Ferrari, não isentou a equipe. ?Ferrari arruína tudo? é sua manchete. Os textos dizem que Schumacher poderia ter evitado essa situação. ?Ele tem força dentro do time para afrontar uma decisão dessas, capaz de deixar uma péssima imagem da escuderia por muito tempo.?

Logo depois da bandeirada ao alemão, a Gazzetta dello Sport pediu a opinião dos internautas sobre o episódio. Até o fim da tarde de ontem, 94% reprovavam decisão da Ferrari, o que só atesta que até os tifosi abominaram o comportamento da equipe.

A imprensa da Alemanha, país de Michael Schumacher, ficou, claro, do lado do alemão. ?Escândalo na Fórmula 1?, define em sua manchete o Bild. O jornal questiona se realmente o tetracampeão precisaria de uma ajuda como a de Barrichello para conquistar vitórias e títulos. Segundo o Bild, Schumacher não deveria aceitar este tipo de ajuda. Barrichello foi definido como uma espécie de ?escravo? do alemão, fazendo papel de servo e não de segundo piloto.

O Die Welt diz que Barichello deu um presente desnecessário para Schumacher.

O editorial afirma que o alemão estava no seu papel, o de acelerar e tentar a vitória, enquanto o brasileiro contrariou as regras do esporte."

 

TV ESTADÃO

"Grupo Estado, agora, tem canal de televisão UHF em São Paulo", copyright O Estado de S. Paulo, 14/05/02

"Portaria do Ministério das Comunicações, do dia 9, publicada ontem no Diário Oficial da União, concedeu ao Grupo Estado o canal 36 UHF de televisão em São Paulo, capital, onde o grupo mantém as sedes de suas principais empresas: O Estado de S. Paulo, Jornal da Tarde, Agência Estado, Oesp Mídia e Rádio Eldorado.

Esse canal retransmissor, que deverá ir ao ar no próximo ano, é o segundo passo do projeto de estruturação de uma rede de televisão do Grupo Estado. Em dezembro, o Grupo Estado anunciou a compra de um canal gerador de televisão no interior do Maranhão, agora TV Eldorado Santa Inês, que estreou no dia 4 de janeiro, data de fundação do jornal e de outras empresas do grupo, como afiliada da TV Cultura de São Paulo, com programação jornalística local.

Segundo o diretor-superintendente do Grupo Estado, Francisco Mesquita Neto, o ingresso no segmento televisivo é uma antiga aspiração estratégica da organização, visando à maior eficácia no fornecimento de informação de interesse da população. ?Quando colocar no ar sua rede de TV, o Grupo Estado estará oferecendo aos espectadores uma nova alternativa de programação de entretenimento e informação, caracterizada pela cobertura correta, ampla e rápida de notícias, bem como pela mais independente opinião jornalística, que sempre caracterizaram nossos veículos.?

Desde meados dos anos 90, o Grupo Estado vem realizando estudos e mantendo conversas com potenciais parceiros e fornecedores objetivando a montagem da sua rede de televisão. O início efetivo deu-se em fins de 2001, com a compra do canal 10 da TV Maranhão Central, que estava em operação havia mais de dez anos. O processo de transferência passou pela aprovação prévia do Ministério das Comunicações. Quase uma dezena de diferentes oportunidades de aquisição foram analisadas desde meados de 2000 em diferentes Estados brasileiros.

Após a compra da geradora, o grupo intensificou contatos técnicos e empresariais para a formação da sua rede. A intenção do Grupo Estado é constituí-la no prazo de dois anos, com prioridades a serem definidas pelas oportunidades de mercado mais interessantes que surgirem. O plano envolve participação em concorrências de mais geradoras, consultas de outras retransmissoras, novas aquisições, alianças e parcerias. Em paralelo, haveria a definição da linha de programação própria, bem como a implantação de suas instalações definitivas.

Para Francisco Mesquita Neto, o caminho natural para as empresas de comunicação é a convergência das mídias. A nova estratégia atende também, diz ele, exigências do próprio mercado, ?uma vez que os anunciantes serão beneficiados com maior diversidade de veículos para a disseminação de seus anúncios, numa sinergia benéfica a todos?."

 

JORNALISMO PREGUIÇOSO

"A era do jornalismo preguiçoso", copyright Jornal do Brasil, 14/05/02

"O que é uma notícia? O que significa ?reportar? algum acontecimento? Até que ponto o leitor acredita realmente no que lê? Eu sempre equacionei jornalismo com grande investigação. Mas o jornalismo de hoje está longe disso, está preguiçoso. Hoje em dia, a maioria dos repórteres não sai mais do seu pequeno círculo de contatos e confia demais nas notas oficiais. Existem as exceções, como o recém-assassinado Daniel Pearl, do Wall Street Journal. No Paquistão. Foi longe demais? Não, foi longe no dia errado, mas assim deveria ser essa profissão. Pearl foi meter o bedelho onde não devia. O repórter precisa voltar a ter essa coragem.

Quem viu, nesse domingo que passou, a incrível entrevista que Wolf Blitzer fez com Yasser Arafat entende o que eu digo. Arafat é líder mesmo ou simplesmente mais um louco (solto), que deveria estar na clínica do Dr. Eiras correndo atrás de borboletas?

Blitzer provou que, nas questões religiosas, políticas e étnicas que corroem o mundo atual, entrevistas não bastam. São completamente redundantes. Vejo esse pool de repórteres entrevistando ora o Sharon, ora o Netanyahu e o Erakat (assessor de Arafat). E fica-se nessa punheta retórica que nada mais faz do que justificar o status quo do caos. O repórter tem que ir além, tem que ver janelas onde elas não existem, tem que provocar, especular e, às vezes, ir além dos fatos reais para poder chegar neles.

Se Woodward e Bernstein tivessem somente entrevistado Richard Nixon, nos anos 70, teriam chegado a Watergate e à renúncia do presidente?

Enquanto escrevo, Jimmy Carter está em Cuba. Os símbolos podem parecer óbvios ou simples, mas há muito mais do que uma simples missão de Carter ?em nome dos direitos humanos? nessa viagem histórica. Mas o que será? Investimentos? Uma travestida reaproximação entre governos, usando um ex-presidente como desvio?

O Festival de Cinema de Tribeca foi um sucesso. Todos estão se curvando perante Robert DeNiro. Mas não sejamos infantis. Não é por patriotismo puro que o queridíssimo ator está tornando aquela região (devastada pelo ataque de 11 de setembro) numa batalha pessoal. Seus investimentos, seus restaurantes (vários) e suas empresas estão todas lá.

Poucos são os jornalistas que querem ir além daquilo que está em seu imediato raio de visão. Especular é parte dessa profissão (da qual não faço parte). Tive essa experiência na sexta-feira passada, quando fui ?cobrir? a manifestação do PT em frente ao banco Morgan Stanley. Minha curiosidade, na opinião de alguns (inclusive de e-mails que recebi do próprio Morgan Stanley), beirava a paranóia. Mas tudo que fiz foi ir um pouco além do pequeno círculo (apático) da reportagem tradicional. Vi um grupo de construtores de rua, abrindo um buraco e fazendo um gigantesco barulho naquele exato momento da demonstração.

Fui até os construtores. Fiz perguntas. Não obtive respostas. Hoje, segunda-feira, quando escrevo, curiosamente, o buraco está tapado e não há nenhum sinal de que alguma companhia de luz, gás ou telefone tenha realmente utilizado aquela mini-cratera.

Eu vejo os eventos políticos como performances. Claro, eles são reais e afetam nossas vidas, mas são cercados de uma mise-en-scène e isso dá margem a interpretações. Quando Arafat pegou das mãos de Blitzer o documento em que (supostamente) provava-se que o líder palestino estava por trás de todos os suicide bombers e o jogou no chão dizendo ?Lies, all just lies?, estava fazendo uma performance digna dos maiores canastrões da História.

Falta a mesma qualidade de investigação jornalística no campo da cultura. Esse meio está infestado pelos divulgadores e pela maquinaria que faz tudo ficar ?vendável? e bonitinho. Fora as eventuais críticas, os cadernos culturais estão ralos e rasos porque a preguiça não parece motivar o repórter a ir até as fontes originárias da arte, os eventos sociais que a provocam.

Michael Moore é um desses jornalistas que cruzam as fronteiras entre realidade e ficção, mas em seu percurso, acende algumas fogueiras. Seu livro Stupid white men está virando um escândalo. Ele diz ter provas de que a tal ?guerra contra o terror? de Bush nada mais é senão uma armação entre empresas para controlar o petróleo e um oleoduto que atravessaria o Afeganistão. Ele chega a dizer que o colapso da Enron leva diretamente à família Bush e que o governo do Talibã nada mais era senão um cover up entre interesses financeiros.

Mas Moore, assim como muitos que levantam suspeitas, já teve seu programa de TV cancelado no passado, por ter ido longe demais. Mas onde fica essa fronteira?

Olhem bem no fundo dos olhos de um Arafat. O que ele estará enxergando quando olha Wolf Blitzer nos olhos? O que será que ele vê? Será que os dois, Blitzer e Arafat, estão realmente no mesmo tempo e no mesmo espaço?

?O tempo dirá?, diz o provérbio popular. Bobagem. O tempo não dirá nada se o espaço em volta continuar sendo esse preguiçoso relatório de retóricas que enchem nossas bocas, mas não satisfazem nossas fomes."