Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Regina Ribeiro

O POVO

"Coluna de sociedade", copyright O Povo, 28/9/02

"Não há dúvida nenhuma de que as colunas sociais têm e sempre tiveram um espaço privilegiado nos jornais. Alguns estudiosos acreditam, inclusive, que as raízes embrionárias do jornalismo estão fincadas na coleta de informações que era feita por trabalhadores subalternos nos castelos da Europa. Essas ?informações? palacianas, manuscritas, eram vendidas em pontos de encontro de pessoas da época. Não é preciso dizer que tudo isso foi se modificando ao longo da História, por meio de mudanças econômicas, culturais e tecnológicas, que transformou o jornalismo numa atividade essencial para a vida em sociedade.

Observando jornais cearenses do início do Século XX é visível a importância que essas seções tinham na imprensa da época. No O Povo, a primeira coluna social ganhou o nome de ?Mundanismo? e ali estavam o vai-e-vem dos colunáveis do seu tempo, os aniversários dos ?elementos da alta sociedade? e outros pormenores.

Algo que chamou a minha atenção enquanto observava essas longíquas colunas foi a semelhança de linguagem que elas mantêm até os dias atuais. Os leitores sabem e estão acompanhando a evolução deste jornal, tanto gráfica, quanto editorialmente. Ele tem perseguido a idéia de manter-se atualizado, adaptando-se aos novos moldes da indústria informativa, sem perder de vista os ideais que o formaram. No entanto, o colunismo social parece ter estacionado no tempo, embora tenha crescido de forma sistemática a sua participação no veículo.

Elogios demais e informação de menos

Atualmente, O Povo tem duas colunas sociais diárias e dois cadernos aos domingos que contemplam o tema: Buchicho e People. Não resta dúvida que existe público para esse tipo de informação. O mercado editorial prova que há uma expansão de títulos com conteúdo voltado para os ?famosos?, ?ricos? e ?bonitos? e também para aqueles que se esforçam o máximo para ser reconhecidos, pelo menos por um desses atributos que garantam uma aparição pública.

O que eu tenho me questionado nos últimos dias é sobre a qualidade do tipo de informação que é dada aos leitores por meio desses produtos. E aqui vou me deter no Buchicho. Esse caderno/revista nasceu com a proposta de unir, num só lugar, TV e um leque de outras temas, tipo culinária, moda, sociedade e comportamento. Ou seja, uma revista para um público heterogêneo, com foco no segmento feminino.

No entanto, parte do conteúdo desse caderno apresenta alguns problemas. Por exemplo: é fraco quando o assunto é TV. Já recebi reclamação de leitores sobre o quanto que a programação de TV ficou prejudicada aos domingos no O Povo. Isso se dá porque nem o Vida e Arte, nem o Buchicho conseguem oferecer a programação completa de filmes e demais atividades dos canais de TV (aberta) nesse dia. Esse é apenas um dos aspectos. Tem ainda a ausência total de matérias sobre personagens televisivos, shows, novelas, filmes ou estréias. Os textos se resumem às notas publicadas em colunas específicas.

Devo acrescentar que a linguagem utilizada na revista torna os eventos sociais mal cobertos. Os registros têm uma carga primorosa de adjetivos – às vezes forçosos – e uma pobreza espartana de qualidade textual. Algumas informações são publicadas com um atraso memorável. No domingo passado, por exemplo, a revista trouxe uma foto da modelo Gisele Bündchen com informações sobre a nova coleção de uma marca de roupa de praia, que foi lançada há quase um mês, quando fotos da moça viraram uma ?gripe espanhola? em todos os principais sites, jornais e revistas do País.

Quando se trata do colunismo social, a situação é crítica. Os textos se mantêm mal construídos. Na verdade, trata-se de um amontoado de termos elogiosos distribuídos de forma isonômica a todos os colunáveis e numa abundância que resvala em mau gosto, como aconteceu no último dia 15, ao falar do ?charme? dos homens presentes numa determinada festa: ?Tinha para todos os gostos: tímidos, atiradinhos, com sorrisinho fatal, magrinhos, fofinhos (…) verdadeiros colírios para os olhinhos?, dizia o colunista.

Os leitores se deparam também com o próprio autor das páginas da coluna social ?Íntimos e Chiques?, travestido de ?euzinho? permeando algumas informações num gesto que seria dispensável, como a seguir: ?Euzinho cliquei algumas dessas poderosas para deixar a coluna ainda mais linda?. Ou ?Esses apaixonados (…) pela vida assim como euzinho…?

O público gosta ou não tem opção?

Eu discordo prontamente do senso comum que espalha aos quatro ventos que as pessoas gostam desse tipo de tratamento ou de ser representadas como uma elite que só tem ?dentes? para ser ?clicada? pelo ?euzinho?. Ou será que elas estão presentes no produto que lhes é oferecido? Bom humor, elegância, informação correta, num texto claro e bem feito dariam uma qualidade muito melhor à revista Buchicho.

Essas e outras questões já foram motivo de comentário interno, e pelo menos uma delas já motivou um debate. O caso aconteceu com a seção ?Zen%?, quando questionei que os textos não trazem a fonte da informação. Os leitores vêem os temas passar diante dos olhos sem que saibam de onde eles surgiram. Não há entrevistas com profissionais ou usuários das tais técnicas. As indicações de sites e literaturas especializadas, que poderiam figurar como complemento, aparecem como fonte exclusiva de consulta para os leitores. Compreendo as informações expostas na ?Zen%? como material informativo, e como tal, precisa dizer qual a base do que está contido no texto.

Essa área do conhecimento humano tem se transformando numa das maiores indústrias do nosso tempo, tanto pela abrangência de técnicas, terapias e produtos disponíveis no mercado, como pela quantidade de profissionais que estão obtendo formação nesse setor. O papel do jornal é dar a informação, mas de forma que o leitor possa avaliar sua credibilidade.

A Redação do Buchicho não concordou, alegando que a forma como as informações estão dispostas cumpre a proposta da seção. Eu discordo porque considero que toda e qualquer proposta do que é publicado no jornal deve levar em conta que, o que O Povo faz é jornalismo e precisa ser feito dentro dos padrões que regem o veículo."