Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Sérgio Dávila

CENSURA NO NYT

"?NYT? veta charge que ironiza atentados", copyright Folha de S. Paulo, 8/03/02

"Um cartum de conteúdo irônico em relação às viúvas das vítimas do ataque terrorista de 11 de setembro foi retirado do ar na última terça-feira do site do jornal americano ?The New York Times?, onde ficou por cerca de cinco horas. Foi o suficiente, no entanto, para causar uma onda de polêmica e mobilizar parte da opinião pública da cidade.

Em seis quadros, o desenho fala das ?viúvas do terror? e satiriza suas reais intenções e sentimentos, sugerindo que elas estão atrás apenas do dinheiro destinado aos familiares das vítimas e da fama decorrente dos programas de TV. O autor é o polêmico cartunista Ted Rall, 38, que é distribuído pelo Universal Press Syndicate (UPS) para 75 jornais e desenha na ?Time? e na ?Fortune?.

?Quando vi o cartum fiquei furiosa e triste?, disse à rede de TV NY1 Nicole Petrocelli, cujo marido morreu numa das torres do World Trade Center. ?Nenhuma de nós quer esse dinheiro. Tudo o que queremos são cinco minutos com nossos maridos para poder dizer adeus.? Com ela concordou Tom Manley, do sindicato dos bombeiros: ?Publicar isso é de uma desgraça absoluta?.

Procurado pela Folha, Rall não quis se manifestar. Assinou, no entanto, uma nota oficial conjunta com o UPS, segundo a qual ambos dizem entender ?a extrema sensibilidade que cerca esse assunto. (…) Mas forçar a mão na crítica construtiva é a função dos cartunistas editoriais?.

A diretoria corporativa do ?New York Times? também se limitou a soltar declaração oficial e colocar um aviso aos leitores no site desde então e na edição impressa de ontem. ?O cartum era inapropriado e nós lamentamos que tenha sido levado ao ar?, disse Christine Mohan, do ?Times?. Na nota aos leitores, o jornal vai na mesma linha.

?O cartum (…) foi retirado do site porque foi avaliado como de mau gosto?, começa o texto. Continua: ?Ao mesmo tempo em que apoiamos a liberdade de expressão, nós também reconhecemos a obrigação de garantir que o que publicamos, não importa a sua origem, não ofenda a sensibilidade de nosso público?.

Não é a primeira vez que as sensibilidades norte-americanas pós-11 de setembro são ofendidas. O linguista Noam Chomsky, a escritora Susan Sontag, o apresentador Bill Maher (?Politically Incorrect?), o cineasta Robert Altman e o roteirista Aaron Sorkin (?The West Wing?) foram alguns dos que sofreram ataques por terem feito declarações consideradas ?antipatrióticas?.

Pelo menos dois deles, Maher e Sorkin, e suas emissoras (ABC e NBC) foram ameaçados com sanções comerciais por parte dos anunciantes se não se retratassem. ?Politically Incorrect? ainda corre o risco de ser cancelado. Com exceção de Chomsky e Sontag, todos pediram desculpas ou amenizaram suas críticas.

Também não é a primeira vez que um cartum está no centro das ofensas. Em outubro de 2001, o desenhista negro Aaron McGruder teve sua tira diária cancelada por vários jornais devido ao tom excessivamente crítico que o personagem principal estava tomando em relação à Guerra do Afeganistão. ?The Boondocks? conta o dia-a-dia de uma família de negros americanos classe média pelos olhos do irascível filho caçula.

Na tira em questão, o garoto rezava no jantar: ?Nestes tempos de guerra contra Bin Laden, agradecemos pelo nosso presidente não ser o filho rico e mimado de uma poderosa família de políticos e empresários do petróleo, que é apoiado por fundamentalistas religiosos, bombardeia civis e usa a guerra como argumento contra as liberdades civis?. À época, McGruder disse que preferia ser polêmico a ingênuo. Uma coincidência e uma ironia: a tira é comercializada pelo mesmo UPS; e o primeiro jornal a trazer à tona as pressões sofridas por McGruder foi o ?NYT?, que, cinco meses depois, censuraria um cartum devido a seu conteúdo polêmico."

 

11 DE SETEMBRO INÉDITO

"TV CBS mostra imagens inéditas do drama no WTC", copyright Folha de S. Paulo / The New York Times, 10/03/02

"A sensação é a de estar sendo enterrado vivo. Você está no chão, cinzas caem sobre sua cabeça como se estivessem sendo jogadas com uma pá e ouvem-se destroços caindo sobre carros como se fossem granizo.

Sob a perspectiva da câmera de Jules Naudet, você correu à rua após fugir do hall da primeira torre do World Trade Center a desabar, seis minutos antes da queda. Quando ela desaba, você é jogado no chão. Tudo fica escuro. Alguém grita: ?Vamos, antes que o carro exploda?.

Apesar de apenas seis meses terem se passado desde que o WTC foi atacado, parece que não conseguimos mais ficar chocados com os acontecimentos daquele dia.

Mas esse trecho, que deve passar hoje nos EUA em um programa de duas horas chamado ?9/11? no canal de TV CBS, tem um caráter de urgência tão forte que nos lembra do quão inimagináveis aqueles eventos costumavam ser.

O programa é uma edição de 180 horas de filmagem realizada pelos irmãos Jules e Gedeon Naudet, que, desde junho de 2001, estavam fazendo um documentário sobre um bombeiro que trabalhava perto do World Trade Center.

Gedeon, 31, era o cineasta mais experiente. Jules, 28, estava aprendendo a filmar e, em 11 de setembro, havia seguido o chefe do batalhão para praticar. Mesmo antes de entrar na primeira torre, ele demonstrou ter um notável instinto de documentarista. Ouvindo um barulho, ele apontou a câmera para cima e filmou o primeiro avião batendo na torre.

A CBS fez um bom trabalho de edição. Robert de Niro aparece como apresentador, advertindo que o linguajar dos bombeiros é pesado. O programa é narrado por James Hanlon, um bombeiro que trabalhara com os Naudets em seu documentário, e pelos dois irmãos, que descrevem o que filmaram e porquê. Mas a maioria das imagens e sons fala por si.

Apesar de o copião do filme dos irmãos Naudet ter sido tomado emprestado pelo FBI (polícia federal dos EUA) e exibido em estações de bombeiros, mostrá-lo na TV é um passo diferente.

Se há um vídeo da execução de Daniel Pearl, é razoável temer que uma cópia acabe na internet. Mas nada em ?9/11? chega perto desse tipo de exploração mórbida. Não há nada no programa que não deva ser mostrado e a maior parte do que é exibido é comovente.

A polêmica em torno do filme é que é chocante. Na semana passada, o âncora de um programa do canal Fox entrevistou o senador Jon Corzine, de Nova Jersey, que disse que famílias de vítimas estavam preocupadas com a ?exibição gráfica? de mortes.

Bem, não há tais exibições. O âncora perguntou se a CBS era ?irresponsável? por exibir o programa, mas não se Corzine havia visto o filme. E, quando o âncora disse que o programa havia sido feito por ?cineastas franceses?, conseguiu fazer com que ?franceses? soasse como ?membros da Al Qaeda?. (Os irmãos Naudet nasceram na França e moram em Nova York desde 1989. Jules é cidadão americano e Gedeon deve obter sua cidadania em breve).

O filme é atual porque revela o quão rapidamente até mesmo as imagens mais horripilantes de 11 de setembro foram absorvidas, transformadas em algo comum: uma forma necessária de entender uma realidade terrível, mas algo que torna aqueles eventos perigosamente fáceis de esquecer."

 

IMPÉRIO BERLUSCONI

"Berlusconi deve entregar TVs, dizem italianos", copyright Folha de S. Paulo, 9/03/02

"Cerca de 80% dos italianos acham que há um conflito de interesses no fato de que o primeiro-ministro Silvio Berlusconi seja dono de um império comercial, segundo uma pesquisa publicada ontem na revista ?L?Espresso?.

Questionados sobre o que Berlusconi deveria fazer para resolver a questão, 30% disseram que ele deveria vender suas empresas, que incluem as três principais emissoras de TV privadas italianas, e 27% afirmaram que ele deveria entregá-las a administradores independentes."