Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Telemar, tudo pela transparência

TRIPÉ SATÂNICO

Rogério Gonçalves (*)

Não adianta. Brasileiro tem mania de reclamar de tudo. Nem mesmo a nossa querida Telemar, orgulho de todos nós, empresa genuinamente brasileira que concorre em pé de igualdade com gigantes multinacionais está livre das intrigas dos eternos insatisfeitos.

Tudo bem que o contrato do serviço de comunicação de dados conhecido como Velox [equivalente ao Speedy da Telefônica] tem lá as suas imperfeições, mas, são apenas pequenos detalhes bobos, desconhecidos pela empresa, que, certamente, assim que tomar conhecimento deles, fará o possível e até o impossível para solucioná-los prontamente.

O objetivo deste artigo é dar um basta nessas calúnias que andam fazendo por aí, visando somente queimar o filme de uma empresa que sempre esteve acima de qualquer suspeita.

Antes de mais nada, devemos nos lembrar que a Telemar é uma empresa de telecomunicações que está oferecendo serviços de telecomunicações. Sendo assim, o contrato deve ser regido pela Lei Geral das Telecomunicações (LGT), que no item IV de seu artigo 3? diz o seguinte:


Art. 3? O usuário de serviços de telecomunicações tem direito:

IV ? à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços;


A prestação de serviços de telecomunicações, até mesmo para proteger os interesses das próprias empresas, é bem diferente de se abrir uma birosca e sair vendendo tudo o que der na telha, pois os serviços de telecomunicações obedecem a regulamentações específicas, criadas a partir de critérios estabelecidos nos artigos 60 e 69 da LGT e são objeto de concessões e autorizações da Anatel para serem explorados. Com isso, torna-se obrigatório que constem de forma clara nos contratos de telecomunicações as modalidades de serviços que a prestadora está legalmente habilitada a explorar, pois, segundo o artigo 183 da LGT, a exploração clandestina de serviços de telecomunicações pode colocar o infrator em cana.

Para evitar que pessoas maliciosas fiquem inventando que a Telemar está intencionalmente tentando confundir os usuários, segue abaixo uma breve análise do contrato do Velox, na qual estão destacados alguns pontos meio obscuros que com toda certeza a empresa fará questão de corrigir, mantendo a tradição de transparência com que conduz os seus negócios. Portanto vamos a eles:


A) A definição do serviço Velox como:

? prestação de serviço que consiste no provimento de canais de transmissão de dados e imagens simultaneamente à prestação de STFC (serviço telefônico fixo comutado), através do mesmo par metálico. A prestação dos serviços Velox e STFC são independentes entre si e objeto de contratos distintos.


Devido à complexidade de alguns conceitos aplicados em telecomunicações, talvez alguém tenha se confundido ao redigir este item, pois "provimento de canais de transmissão de dados e imagens" dividindo o mesmo par metálico com o STFC é apenas um recurso, muito utilizado entre empresas de telecomunicações no exterior, chamado desagregação de redes (ou unbundling), através do qual uma empresa permite a utilização de parte das suas redes físicas para que uma outra empresa, até mesmo concorrente, possa prestar os seus serviços.

A desagregação é uma prática extremamente eficaz de otimização dos circuitos físicos de telecomunicações, pois a utilização da capacidade instalada ociosa, além de permitir que as empresas arrumem um cascalho extra, também evita a instalação de novos circuitos, muitas vezes completamente desnecessários, que no fim acabam até gerando mais capacidade ociosa.

Como no contrato está explícito que o Velox utiliza o padrão aDSL (recomendações ITU-T G.992.1, G.992.2, G.994.1, G.995.1, G.996.1 e G.997.1), este item na realidade refere-se a uma desagregação compartilhada (line sharing) do par metálico de telefonia local, que consiste na criação de dois canais de comunicações distintos, que utilizam as freqüências de 0 até 4Khz para o STFC (voz) e de 25Khz a 2Mhz para comunicação de dados. Inclusive, o nome de "banda larga", como também ficou conhecido o aDSL, deve-se justamente a esta grande capacidade de tráfego de dados que surge com a desagregação do par metálico do STFC.

O que não está nos conformes é o fato de desagregação de redes não ser um serviço de telecomunicações aberto à correspondência pública, pois a contratação deste recurso é feita exclusivamente entre empresas de telecomunicações e, além de obrigatório, ele foi criado justamente para incentivar a concorrência entre elas, estando previsto no artigo 155 da LGT e nas cláusulas 14.2, 24.1, 25.1 e 28.1 do próprio contrato de concessão da Telemar.

Assim, me parece que a descrição do Velox está meio capenga e este item não deveria constar num contrato entre a empresa e usuários finais.


B) Item 1.1:

? 1.1 O presente contrato tem como objeto a prestação de serviço Velox, que consiste na disponibilização de Acesso Dedicado para Transmissão de Sinais Digitais através do back bone da Telemar.


Neste item as coisas começam a clarear um pouco, pois sendo o Velox uma desagregação de rede, aqui ficamos sabendo que a banda do par metálico não utilizada pelo STFC servirá como suporte para conectar os computadores dos usuários ao backbone da Telemar, um serviço típico de comunicação de dados, previsto no artigo 69 da LGT. Portanto, a empresa está desagregando para ela mesma um segmento de sua rede de STFC que fica entre a central telefônica e o PTR (Ponto de Terminação da Rede) dos usuários, trecho também conhecido como última milha, para prestar um outro serviço de telecomunicações.

Acontece que, com a desagregação, a banda destinada à transmissão de sinais digitais passa a integrar o serviço de comunicação de dados correspondente ao backbone Telemar e, neste caso, o tipo de serviço prestado pela empresa não tem mais nada a ver com o STFC, e sim com uma das modalidades constantes dos termos de Serviço de Rede de Transporte de Telecomunicações (SRTT) que a Anatel forneceu a todas as concessionárias de telefonia pública em julho de 1998, alguns dias antes de elas serem privatizadas.

E, sendo assim, parece bem irregular que o objeto do contrato dê ênfase justamente a um serviço de telecomunicações que deveria ser totalmente transparente para os usuários, em vez de utilizar o nome do serviço regulamentado de comunicação de dados constante no SRTT (anexo 1, item 4) que melhor caracteriza o serviço de telecomunicações efetivamente prestado, que no caso seria Serviço de Rede Comutada por Pacote, considerando-se que, de acordo com todos os protocolos internacionais de telecomunicações, os backbones enquadram-se exatamente neste tipo de serviço.


C) Item 9.14:

9.14 ? O serviço Velox está abrangido pelo conceito de Serviço de Linha Dedicada para transmissão de sinais digitais, incluído no Termo de Autorização do Serviço de Rede de Transporte de Telecomunicações ? Termo PVSS/SPV n.? 11/98 ANATEL, portaria 285 ? Norma n.? 09/95.


A referência ao SRTT, obrigatória e fundamental para classificar corretamente o serviço de telecomunicações prestado sob o nome fantasia de Velox, em vez de constar como objeto do contrato, inexplicavelmente encontra-se no fim dele e, ainda por cima, referindo-se a uma modalidade completamente diferente do serviço efetivamente prestado.

Isso só pode ter acontecido por puro descuido, pois melhor do que ninguém a Telemar sabe perfeitamente que o Velox não se enquadra de forma alguma no Serviço de Linha Dedicada para Sinais Digitais (SLDD), porque:

1) Sendo a linha dedicada, obviamente o seu circuito não poderia ser compartilhado com outro serviço de telecomunicações, neste caso com o STFC (voz).

2) As linhas dedicadas digitais ocupam toda a banda para transmissão de dados, não suportando o tráfego analógico de voz do STFC.

3) A velocidade de transmissão das linhas deste serviço é explicitamente garantida em contrato.

4) Seu custo mensal é proibitivo, de aproximadamente R$ 800 para velocidade de 64 kb/s.

5) As SLDDs são utilizadas para conexão entre dois pontos bem determinados. Porém, como no contrato está explícito o uso da tecnologia aDSL na desagregação da última milha para suporte a um outro serviço de comunicação de dados, a caracterização do serviço como SLDD me parece irregular.


D) Item 1.2:

1.2 ? São requisitos permanentes e indispensáveis para o acesso e fruição do serviço Velox:

** Terminal de STFC em operação ? integrante da rede Telemar e capaz de atender às condições técnicas exigidas no Teste de Habilitação.


Recapitulando o que foi dito anteriormente: existe uma empresa que, além da concessão de STFC, também possui um termo de autorização para prestação de alguns serviços adicionais de telecomunicações, o que na prática poderíamos considerar como sendo a "Telemar STFC" (voz) e a "Telemar SRTT" (dados).

Pois bem, de acordo com a legislação específica da área, estas empresas prestam serviços completamente independentes entre si. Assim, com relação ao serviço de comunicação de dados que permite aos usuários conectarem seus computadores diretamente ao backbone da Telemar, o que temos de fato é a "Telemar SRTT" contratando da "Telemar STFC", em regime de desagregação compartilhada, parte do par metálico da rede de telefonia publica, referente ao segmento de última milha de um determinado endereço, para fruição do Serviço de Rede Comutada por Pacote.

Como para a fruição do serviço de comunicação de dados da "Telemar SRTT" é necessária apenas a banda disponível no par metálico de 25 Khz a 2 Mhz, não fazendo a mínima diferença para ela a existência ou não do canal de voz do STFC, isto pode nos levar a concluir que o serviço de STFC pode perfeitamente ser dispensado, bastando apenas existir o par metálico no endereço do assinante do serviço de comunicação de dados.

Também devemos considerar que os serviços de comunicação de dados têm seus próprios protocolos de autenticação baseados na numeração individual de fábrica das placas de rede e que, por manipularem dados, seus terminais são computadores, e não telefones fixos.

A Telemar, o povo e a torcida do Flamengo já estão sabendo que começou a contagem regressiva para que outros prestadores de serviços de comunicação de dados comecem a oferecer seus serviços através de desagregação, plena, compartilhada ou em alta velocidade, da rede de STFC de todas as concessionárias. E aí pinta uma dúvida: será que, neste caso, os clientes das outras fornecedoras também seriam obrigados a adquirir o serviço de STFC da Telemar?

De repente, o item XI da cláusula 7.1. do termo de SRTT, sobre direitos dos usuários pode ter a resposta:


7.1. A autorizada deverá respeitar os direitos dos usuários do serviço cuja exploração ora é autorizada, em especial:

XI ? não ser obrigado a consumir serviços ou a adquirir bens ou equipamentos que não sejam de seu interesse.


Sei não… Pelo que entendi deste artigo, o assunto merece ser mais discutido.

Para quem ainda não sabe, backbone é a denominação genérica das estruturas centrais de redes de dados que interligam vários computadores que utilizam os protocolos TCP/IP da internet para se comunicarem entre si. Muitas pessoas também costumam considerar que os backbones são formados apenas por canais de telecomunicações de alta velocidade, capazes de transportar grandes volumes de dados, que utilizam roteadores para encaminhar pacotes IP (nome dos blocos de informações que circulam na rede) até os seus destinos.

Com as informações obtidas até agora, finalmente podemos interpretar que o Velox é um serviço de comunicação de dados que consiste em conectar fisicamente os computadores dos usuários ao backbone Telemar, para que eles possam trocar informações com os demais computadores que estejam conectados a este backbone.

De acordo com o que consta no site da Telemar <http://www.telemar.com.br> e no monte de propaganda que anda rolando por aí, o Velox permite acesso ao conteúdo da internet, o que significa que o backbone Telemar tem links permanentes com backbones conectados diretamente com o núcleo da internet nos EUA e utiliza números IP válidos para identificar de forma inequívoca os computadores dos seus usuários em âmbito mundial.

A condição de rede internet do backbone da Telemar é confirmada no item 2.8 do contrato:


2.8 ? Para configuração do serviço Velox, será atribuído pela Telemar, via rede IP, um endereço IP válido e dinâmico.


Isto demonstra que, ao contratar links permanentes com backbones internet, a Telemar segue rigorosamente o que determina a cláusula 6.3 do seu termo de SRTT:


6.3. A autorizada é livre para contratar com terceiros o desenvolvimento de atividade inerente, acessória ou complementar ao serviço ora autorizado, bem como para a implantação de projetos associados, na forma da regulamentação.


Para arrematar a lição de transparência da Telemar, ainda existem as pérolas abaixo, que jamais poderiam constar em contrato de serviço de telecomunicações:


2.11 ? A prestação do serviço Velox não inclui provedor de acesso à internet, ficando por conta do assinante a contratação do referido serviço, que deverá ser feito com provedores compatíveis com o serviço Velox.

7.1 ? O assinante será inteiramente responsável pela manutenção de seus equipamentos e de sua rede interna, bem como pela contratação com o provedor de acesso à internet de sua livre escolha.


Isto está sendo colocado como obrigação do assinante… Os itens acima contrariam frontalmente a cláusula 6.3 do termo de SRTT, pois a obrigação de contratar serviços complementares de terceiros é da autorizada do serviço, no caso a Telemar.


9.5 ? O serviço Velox não permite o acesso direto do assinante à internet, sendo necessária, para tanto, a contratação, pelo assinante, de provedor de acesso apto a prover o serviço Velox.


Ora, internet é apenas um nome genérico para uma rede de dados de abrangência mundial formada através da interconexão de várias outras redes de dados isoladas, portanto um serviço de comunicação de dados típico de telecomunicações.

Como a cláusula 1.1 do contrato afirma existir uma conexão dedicada para transmissão de sinais digitais no backbone da Telemar, que por ter links permanentes com outros backbones internet torna-se dela parte integrante, pode-se supor que existe, sim, um acesso direto do computador do assinante com a rede internet.

Baseando-se na definição do Velox existente no início do contrato, conclui-se que o único provedor apto a prover desagregação de redes seja a própria Telemar.


9.6 ? A Lista de provedores de Acesso habilitados para prestar o serviço Velox, nos termos do item acima, encontra-se disponível no site da Telemar na internet, no endereço <http://www.telemar.com.br/velox.


A Telemar precisa esclarecer melhor esse negócio de provedores habilitados para prestar os serviços de telecomunicações que são atribuições exclusivas dela, como autorizada de SRTT.

Afinal, se o Velox é um serviço que deve ser prestado por empresas alheias à área de telecomunicações, para que então existe este contrato?


9.12 ? Este contrato obriga as partes, seus herdeiros e sucessores, aplicando-se, no que couber, a legislação de Defesa do Consumidor;


Ué… Se este contrato é específico de telecomunicações, por que a Telemar está elegendo o Código de Defesa do Consumidor, e não a LGT, para solucionar conflitos?

Caso vocês ainda tenham alguma dúvida, sugiro que entrem em contato diretamente com a própria Telemar, que certamente terá enorme prazer em atendê-los.

Valeu?

(*) Webmaster username:Brasil <http://user.atualize.net>