Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Testemunha consciente

DIPLOMA DE JORNALISTA

Luiz Carlos Santos Lopes (*)

Em todas as profissões a dicotomia teoria e prática está presente. No jornalismo, pelo fantástico progresso experimentado pelas técnicas de comunicação nos últimos tempos, não poderia ser diferente. Ser jornalista não é apenas saber escrever ou apresentar um programa de televisão ou de rádio. Isso qualquer um que tenha habilidade pode fazer. É preciso mais. É preciso uma formação universitária, para obter o embasamento cultural que permitirá transmitir corretamente os fatos ou a sua própria opinião, aliada à prática, com que ampliará a visão para distinguir o que é notícia, já que será um dos responsáveis pela sua produção.

A habilidade em usar as palavras poderá informar e construir, ou desinformar e destruir. Mentiras, meias-verdades, boataria podem ferir de morte reputações, destruir vidas, ou desinformar o leitor com manchetes de impacto, porém desatreladas da verdade. Ética e transparência exigem coragem, e são os pilares da credibilidade de um jornalista. A formação universitária lhe permitirá ter contato com as disciplinas específicas do curso, além de noções gerais de outras matérias, de que se valerá para seu sucesso profissional. A prática lhe mostrará os caminhos para situar os acontecimentos no espaço, no tempo ou no contexto social.

Os conhecimentos acadêmicos lhe ensinarão a esquadrinhar a realidade com a perspicácia de um bom detetive e buscar os acontecimentos onde estiverem. Aprenderá a evitar a auto-suficiência e a encarar as respostas como mais importantes do que as perguntas, para evitar que a informação seja prejudicada pela precipitação e pela falta de uma procura mais atenta dos fatos. A formação universitária o levará a vencer desafios e atualizar-se sempre. Aprenderá a ser uma testemunha consciente do que acontece à sua volta, procurando com obstinação incessante os acontecimentos, identificando os que podem e devem ser notícias.

Submissão ao patronato

Os conhecimentos pragmáticos o levarão a fazer parte do processo de informação e a não se distanciar do mundo ao seu redor, sob pena de se tornar um mero repetidor das notícias de outros veículos de comunicação, da internet, ou virar um gillete press: ampliará a visão para distinguir as armadilhas a que estará sujeito, como sabotagens e manipulações deliberadas em sua trajetória na busca da notícia, e também a agir com imparcialidade. Jamais com neutralidade, porque a emoção é inerente ao jornalismo. Com a vivência adquirirá conhecimentos que lhe permitirão ter uma visão da estrutura e da dinâmica dos veículos informativos, sem os quais ficará tão desinformado e sem experiência quanto um jornalista autodidata, como diz Jorge Calmon.

Não há fórmulas prontas para um bom jornalista, esta profissão que a alguns incomoda e a tantos fascina. Há, sim, a capacidade individual de cada um em se reinventar a cada dia e buscar se aproximar o mais possível da verdade, ainda que isso possa lhe custar alguns dissabores. Segundo Nilson Lage, "o jornalista é, antes de mais nada, a pessoa que escreve e edita informações em diferentes meios, e a competência é algo fundamental para que se possa exercer a profissão com dignidade".

Por tais razões, não se entende o porquê da decisão da juíza Carla Rister ao suspender, em todo o país, a obrigatoriedade do diploma de Jornalismo para a obtenção do registro profissional no Ministério do Trabalho. Embora a decisão da juíza tenha sido revista, a quem interessa, afinal, o fim da exigência do diploma? Às empresas de comunicação, que terão à disposição mais oferta de mão-de-obra, sem qualquer regulamentação?

Aos jornalistas incompetentes, inescrupulosos e inseguros que, para se manterem empregados, não hesitam em se submeter ao patronato, passando a culpar as faculdades e a subestimar os próprios colegas de profissão pelos defeitos que têm e pelos que não têm? A advogados, juízes, promotores, médicos, engenheiros, além de profissionais de outras áreas, que se acham no direito de se intrometer como senhores do conhecimento no campo do jornalismo, ainda que, como diz Nilson Lage, "não saibam distinguir informação de propaganda e imaginem os jornalistas com poderes absolutos sobre o público, que eles chamam de massa quando lhes é hostil, e povo quando lhes é simpático?".

Cheiro da tinta

Causou indignação aos jornalistas ? sobretudo aos éticos ?, aos estudantes de Jornalismo e à própria sociedade a decisão do Tribunal Regional Federal de São Paulo de manter a suspensão em todo o país da obrigatoriedade do diploma de Jornalismo, ao negar pedidos de liminar em recurso de autoria da Fenaj e da AGU. Desta maneira, a determinação em primeira instância da juíza Carla Rister, da 16? Vara Cível, continua valendo. O que equivale dizer que a União não pode exigir o diploma, fiscalizar o exercício da profissão ou autuar profissionais.

Como diz Antonio de Oliveira, "de repente, devido a um ?canetaço? bem articulado entre uma juíza e os proprietários das grandes empresas de comunicação do país, os jornalistas diplomados vêem jogados no lixo todos os seus sonhos e os de milhares de jovens que buscam anualmente as faculdades de Jornalismo para estudar, se formar e exercer a profissão com dignidade e respeito".

Para Álvaro Laranjeira, "os suseranos da imprensa brasileira se incomodam com a exigência do diploma de curso superior em Jornalismo para a obtenção do registro profissional de jornalista porque o canudo simboliza um campo nebuloso aos cruzados do feudalismo midiático: a universidade". Jorge Calmon afirmou que "(…) não lhe basta escrever certo e fluente. Precisa dispor de conhecimentos variados, como são os oferecidos pelo curso de humanas e, na etapa seguinte, pelo curso superior".

Mário Erbolato disse que "sem sentir o cheiro da tinta, ouvir o ruído das impressoras e o tilintar dos telefones das redações e sentir o telex funcionando ninguém pode ter a vaidade de considerar-se jornalista". Ricardo Mendes diz acreditar que para haver uma completa profissionalização de jornalista no Brasil é preciso uma base teórica, que lhe dê sustentação, além de entidades corporativas mais fortes, a exemplo de uma ordem dos jornalistas do Brasil ou um conselho federal de jornalismo. Segundo Mendes, "não simplesmente pela criação da entidade, mas pelo que tal fato deve significar dentro de uma trajetória histórica da profissão".

(*) Estudante de jornalismo da FIB