Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Tudo é negociável menos os avanços

INTERNET GRATUITA

Alberto Dines

A polêmica sobre a internet gratuita ganha força e espaços na mídia, mas falta encarar algumas premissas. Sem elas a sociedade continuará à margem da questão que para ela é de capital importância:

** A mídia impressa, a única capaz de esmiuçar uma questão tão complexa, está distante e, quando não, revela-se comprometida com uma das posições. Portanto, não dispõe da necessária isenção para apresentar ao cidadão não especializado um quadro eqüidistante das duas argumentações. Isso acontece porque alguns veículos impressos são parceiros dos provedores "tradicionais" de acesso (pago).

** A mídia eletrônica está na encolha mas, evidentemente, favorece medidas e regulamentações de modo a impedir que as operadoras de telefonia tornem-se direta ou indiretamente empresas de mídia (isto é, provedoras de conteúdo). Reconhecem que os avanços tecnológicos são inevitáveis e que num futuro não muito distante as empresas de telecomunicações estarão oferecendo, junto com voz e dados, conteúdo radiofônico e televisivo e, assim, ameaçando o seu nicho.

** Significa que o establishment da mídia está apostando na reserva de mercado: só empresas ou grupos de mídia "tradicionais" poderiam habilitar-se como fontes confiáveis de informação digital ? o que contraria a imperiosa descentralização do processo midiático no Brasil.

** A letra e o espírito do novo artigo 222 da Constituição abriram espaço para que as empresas de comunicação tenham o seu capital parcialmente aberto a pessoas jurídicas. O legislador entendeu que o circuito informativo no Brasil precisa ser aberto, descartelizado e, sobretudo, libertado das oligarquias (poderosíssimas no plano regional).

** A internet é um extraordinário avanço na universalização da informação. Há duas décadas a Unesco preocupava-se com o "free flow of information"; hoje, o fluxo informativo mundial libertou-se de grande número de controles e constrangimentos. Graças à TV por satélite mas também graças à internet.

** O acesso gratuito à rede mundial de computadores acrescentou-se à revolução digital. É sua conseqüência lógica e natural. Facilitou a inclusão informativa, abriu caminho para a participação cívica e colocou à disposição de grandes parcelas da sociedade o conhecimento tecnológico indispensável para a inserção no processo produtivo.

** É justa a inquietação dos provedores de acesso tradicionais (e suas matrizes na grande imprensa) diante da possibilidade de que grandes grupos internacionais de telecomunicações venham a apossar-se dos provedores de acesso gratuito ? e através destes debilitem a capacidade de enfrentá-los.

** Indispensável um mínimo de regulamentação ? a própria velocidade da tecnologia o impõe. Mas esta regulamentaç&atiatilde;o não pode restringir-se apenas à área da internet e internet grátis deixando-se o resto como está. O sistema informativo brasileiro, como um todo, precisa ser avaliado. Está na hora de examinar em profundidade a questão intocada da "propriedade cruzada" dos meios de comunicação num determinada cidade ou região e seus efeitos perniciosos na diversificação das fontes. A questão da concentração da mídia no país não pode ser segmentada ou enviesada, regulamentando-se um setor e deixando-se os demais na mesma condição em que se encontram há algumas décadas.

** O debate ora iniciado sobre a internet gratuita em algum momento terá que ser complementado na mesa de negociações. Nenhuma das partes quer perder vantagens. Nem a sociedade.