Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Um ano de rodadas do Ibope

MÍDIA & PESQUISAS

Chico Bruno (*)

O problema não é a pesquisa. O problema continua a ser a interpretação da pesquisa. Ao que parece, de nada adiantou o Ibope ter realizado dois seminários para jornalistas, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, antes das eleições de 2000, ensinando como se lêem e interpretam as pesquisas, distribuindo inclusive uma pequena cartilha.

Essa constatação é possível quando lemos as matérias sobre as últimas pesquisas divulgadas. É incrível, mas a imprensa não se deu ao trabalho de detalhar historicamente os resultados e analisar as circunstâncias do período pesquisado. O que mais importou para os jornalistas políticos, com raras exceções, foi o empate em segundo lugar entre Serra e Garotinho, na pesquisa do Ibope realizada entre 17 e 19 de maio, com 2.000 entrevistados e margem de erro de 2,22%: Serra caiu dois pontos, ficando com 16%, e Garotinho manteve a pontuação anterior, de 16%.

Ninguém se lembrou de noticiar que no dia 16 de maio foi exibido em todo o território nacional o programa de televisão do PSB, com 10 minutos de duração, e que o campo da pesquisa foi realizado nos três dias seguintes, o que demonstra que o programa de Garotinho não o favoreceu, ao contrário do de Lula, que imediatamente pesquisado fez com que o petista aumentasse sua pontuação em 11 pontos, segundo o mesmo Ibope. Essa análise foi completamente desprezada pela imprensa.

Importou muito mais a queda de dois pontos do Serra e seu empate com Garotinho, o que não quer dizer muita coisa, pois está na margem de erro da pesquisa; Serra pode ter mantido os 18% anteriores. Também não interessou à imprensa a análise de que, apesar de alvo de cerrado tiroteio, Serra saiu ileso, mantendo o mesmo patamar.

A imprensa continua a desprezar a leitura histórica das pesquisas. Tomando
por base os resultados das rodadas do Ibope no período de
junho de 2001 a maio de 2002, chega-se à seguinte conclusão:
Lula saiu de 28%,em junho de 2001 para 38% este mês, crescendo
no período 10 pontos. Serra saiu de 6% em junho de 2001 para
16% agora, subindo, também, 10 pontos. Garotinho, que começou
a ser pesquisado em setembro de 2001, saiu de 10% para 16%, subindo
6% nesse período; e Ciro, que tinha 12% em junho de 2001,
caiu para 10% este mês. Abaixo, o gráfico da série
histórica das pesquisas realizadas pelo Ibope.

Logo após a divulgação dos resultados da pesquisa realizada entre 17 e 19 de maio, o Ibope divulgou outra, feita entre 17 e 20 do mesmo mês, por encomenda da agência carioca Premiun, para seu cliente Garotinho, com intenção de avaliar o programa de TV exibido dia 16 de maio pelo PSB. Nela, Lula subiu para 42 pontos, e os outros mantiveram os mesmos números, com exceção de Ciro, que caiu mais dois pontos. Nessa pesquisa, o questionário trazia a pergunta estimulada antes da espontânea e, entre as duas, uma pergunta sobre o conhecimento dos candidatos. Pela diferença de questionário entre as demais, esse resultado não está sendo considerado nessa análise.

Quem perde é o leitor

Feito esse esclarecimento é hora de voltar à vaca fria. As pesquisas refletem o humor do momento pesquisado, e o gráfico demonstra isso. Basta ver que Lula começou essa série com 28%, chegou a 31% em dezembro de 2001, caiu para 24% em março deste ano, subiu para 35% em abril e chegou agora aos 38%. Durante esse período muita água rolou, como a ascensão e a queda de Roseana, o rompimento do PFL com o governo federal, a verticalização das coligações, as denúncias de arapongagem e propinagem contra Serra, a ascensão e a queda da aposentadoria precoce de Garotinho, as brigas da Frente Trabalhista de Ciro, entre outras escaramuças.

Nenhuma, contudo, contra Lula, que teve a seu favor um emotivo programa de televisão, que foi ao ar sem que ruídos atrapalhassem sua exibição ? ao contrário dos dois programas de Serra, o primeiro exibido justamente quando explodiu o caso Lunus e o segundo apresentado com as denúncias do suposto propinoduto da Vale do Rio Doce. E isso faz muita diferença numa pré-campanha eleitoral.

Infelizmente a imprensa brasileira não está nem aí para tudo o que foi analisado aqui, o que é uma pena, pois quem perde é o leitor, o ouvinte e o telespectador.

(*) Jornalista