Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Valéria Rossi


CASO ABRAVANEL

"?Quando olhei, ele já tinha pulado?, explica repórter", copyright O Estado de S. Paulo, 31/08/01

"A repórter da TV Bandeirantes Carla Augusta estava de plantão na frente da casa do apresentador Silvio Santos, por volta das 6h30 de ontem, quando avistou um rapaz vestido de moletom, camiseta e touca. O jovem era Fernando Dutra Pinto, de 22 anos, que havia seqüestrado Patrícia, uma das filhas do empresário.

Fernando estava parado perto da guarita localizada no portão de entrada da casa do apresentador. ?De repente, quando olhei, ele já tinha pulado para dentro da casa?, afirma a repórter. Carla conta que saiu correndo atrás do rapaz e chegou a esbarrar a cabeça na cerca elétrica da casa, que, segundo ela, estava desativada.

O próximo passo da jornalista foi avisar o ocorrido para os seguranças do empresário. A princípio, os vigilantes não levaram a história a sério. ?Eles demoraram dez minutos para acreditar em mim. Acharam que eu queria uma (entrevista) exclusiva.? Só depois, os guardas pediram para os demais vigias cercarem a casa. Em seguida, acionaram a Polícia Militar.

Carla disse que a PM levou de 10 a 15 minutos para chegar até a casa do empresário. Por volta das 8 horas, a família de Silvio Santos deixou o local."

 

"Banalização do seqüestro", editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 31/08/01

"O número de seqüestros ocorridos em São Paulo bateu recordes pelo segundo ano consecutivo. Entre 1999 e 2000, o aumento foi de 250%. De janeiro a junho deste ano, houve 120 casos no Estado, o que representa um crescimento de 60% em relação ao mesmo período de 2000. A explosão ocorreu, principalmente, porque os antigos autores de seqüestros relâmpagos migraram para esse tipo de crime. As medidas de segurança tomadas pelos bancos, os baixos limites permitidos para saques diários e o desligamento dos caixas automáticos no período noturno, determinado pela necessidade de redução de consumo de energia, dificultaram a ação dos marginais. Agora, em vez de reter suas vítimas apenas o tempo necessário para saques nos caixas automáticos ou o desconto de cheques, os bandidos passaram a levá-las para um cativeiro e a determinar o resgate a ser pago pela família.

O crime, antes cometido por quadrilhas organizadas, se banalizou. Há ocorrências em que os autores dos seqüestros negociam resgates de R$ 1 mil ou pouco mais e, em 12 horas, no máximo, a vítima volta para casa.

Em outros casos, os seqüestros são ?terceirizados?. Quadrilhas, antes especializadas em assaltos a bancos e roubos de carga, contratam os marginais especializados em seqüestros relâmpagos para capturar as vítimas e levá-las ao cativeiro. O pagamento pelo serviço é feito com drogas, armas e dinheiro. No cativeiro, os seqüestrados ficam sob cuidados de outro tipo de marginal, os viciados em drogas e assaltantes, cuja vigília custa aos mandantes 1% do valor do resgate.

Os mandantes só têm o trabalho de planejar o crime e negociar com as famílias e, nesses casos, o resgate alcança até R$ 200 mil. O seqüestro pode durar até dois dias, prazo necessário para as famílias, a maior parte de classe média alta, reunirem recursos e cumprirem o trato com os bandidos.

Há dois anos tal prática vem se intensificando de forma assustadora em São Paulo e somente agora a Secretaria da Segurança Pública se dispõe a combatê-la. Após a libertação de Patrícia Abravanel, filha do apresentador de televisão e empresário Sílvio Santos, que ficou em poder de seqüestradores durante uma semana, o secretário Marco Vinicio Petrelluzzi anunciou a criação de uma nova divisão policial especializada, com cinco delegacias – duas na capital e três no interior – e 140 homens.

Seqüestro é crime hediondo pela legislação brasileira. Seus autores não têm direito à fiança no caso de prisão e a condenação significa reclusão de 8 anos a 15 anos. Se a vítima morrer durante o seqüestro, a pena chega a 30 anos. Não importa se o seqüestro dura uma hora ou uma semana. Se este tipo de crime tivesse sido eficiente e rigorosamente combatido desde 1999, quando os seqüestros começaram a se multiplicar, certamente a população estaria menos insegura."

 

"Visões do espetáculo", copyright No. (www.no.com.br), 31/08/01

"Dando continuidade ao carnaval montado pelas emissoras de TV ontem, todos os jornais abriram hoje imensos espaços para a cobertura do drama de Sílvio Santos, mantido como refém por mais de sete horas por Fernando Dutra Pinto, o mesmo homem que seqüestrara na semana anterior sua filha Patrícia. Entre a profusão de textos, fotos e infográficos que o ?Estado de S. Paulo?, a ?Folha de S.Paulo?, o ?Jornal do Brasil? e ?O Globo? oferecem, o leitor fica sabendo do cronograma do caso, do passado do criminoso, da negociação e até, se duvidar, do mapa astral de Sílvio Santos.

Diante dessa overdose de informações, grande parte delas já transmitidas pelas TVs e pela Internet ontem, o que sobra de diferente são as visões dos articulistas, como o ex-capitão da PM carioca Rodrigo Pimentel, que critica duramente no JB a presença de autoridades como o governador Geraldo Alckmin na cena do seqüestro, lembrando que no Brasil as considerações políticas ainda falam mais alto que as regras de segurança. Alckmin também é o saco de pancadas de excelentes artigos de Clóvis Rossi e Jânio de Freitas na Folha – infelizmente nem todos os internautas têm como lê-los, pois o jornal restringe o acesso a seus assinantes e do provedor UOL. Rossi lembra que de agora em diante, por uma questão de coerência, o governador terá que ir a qualquer cenário de crise com reféns, sob o risco de assumir que governa apenas para os ricos e famosos. Já Freitas teme que, sufocada pelo espetáculo, a opinião pública acabe perdendo a capacidade de se indignar, como aconteceu com as rebeliões de presos após o massacre do Carandiru.

Ah, enquanto todos os especialistas apontam como jóia da coroa de trapalhadas a ida de Alckmin ao local do seqüestro para negociar com o criminoso, o ministro da Justiça, José Gregori, classifica o ato de bravura ?sem precedente histórico?. Será que a opinião seria a mesma se o governador não fosse do PSDB ou se o final não fosse feliz?

E, para a coisa não ficar pesada demais, nada como ler Luís Fernando Veríssimo concluir no ?Globo? que, ao contrário do que muita gente pensa, esses casos da vida real são mais impressionantes que os filmes, ou Millôr Fernandes, no JB, usar a chatice das cenas da TV para dizer que uma imagem está bem longe de valer mil palavras.

Ofensa à inteligência

Depois de enterrar a vítima sem ter feito autópsia ou perícia, a polícia de Altamira (PA) teve um acesso de eficiência, identificando o assassino do sindicalista Ademir Alfeu Federicci, que denunciava fraudes na Sudam e roubo de madeira no estado. Já preso, Júlio César dos Santos Filho confessou o crime e disse que matou o sindicalista para roubar uma TV, como conta o jornal ?O Liberal?. O problema é que só a polícia acredita nessa história, tanto que políticos e sindicalistas estão pedindo a entrada da Polícia Federal no caso. Diz uma piada que, encarregada de localizar um coelho no mato, a polícia brasileira volta instantes depois com um porco que, todo ensangüentado, grita: ?Eu sou um coelhinho, eu sou um coelhinho!? O triste é que isso cada vez menos parece piada.

Maldito Graham Bell

O inventor do telefone ainda vai perder o posto de gênio e virar anátema. Lembram que o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) jurou por tudo que há de sagrado que desde 1996 só tinha contatos esporádicos com José Osmar Borges, considerado o maior fraudador da Sudam? Pois é, hoje ?O Globo? diz que a Polícia Federal descobriu nada menos que 240 ligações de Borges para Jader desde 1997. Nem mãe telefona tanto para filho.

Que coisa

Um convênio do Exército com a prefeitura de Santana do Livramento (RS) para ações sociais na área rural acabou provocando uma situação no mínimo inusitada: soldados fardados trabalhando dentro de um assentamento do MST. Se você não acredita, dê uma conferida no jornal ?Zero Hora?. Maior que a supresa dos sem-terra, só o constrangimento do comandante, rápido em esclarecer que as Forças Armadas não tem qualquer afinidade com o movimento – apontado como ?força antagônica? pelos arapongas desmascarados pelo MP no Pará.

Morte ao eufemismo

Prezados leitores, de agora em diante, ?maquiagem? é um termo que só aparecerá nesta coluna para se referir àqueles produtos que mulheres e músicos do Kiss passam na cara. Alteração de produtos para aumentar preço passa a ser tratada aqui com o nome correto: fraude. E é uma frande dessas que o Conselho Regional de Farmácia do Distrito Federal denuncia hoje no ?Globo?: laboratórios retiraram o mercado embalagens de remédios, lançaram outras com mais comprimidos e aumentaram o preço de maneira desproporcional, ou seja, cada comprimido ficou mais caro individualmente. Em outros casos, diminuíram a dosagem do princípio ativo e mantiveram o preço. Parafraseando Marx (Groucho, claro), qualquer criança de quatro anos vê que isso é crime, donde se conclui a falta que faz uma criança de quatro anos no governo federal.

Hierarquia da bandidagem

Além dos eufemismos (rico não rouba, faz ?desvio de verba? ou ?apropriação indébita?), existe uma outra peculiaridade brasileira, a diferenciação entre criminoso comum e criminoso com pedigree. Depois de ser desmascarado pela CPI do futebol com provas de sonegação fiscal e evasão de divisas, o presidente do meu Flamengo, Edmundo Santos Silva, irrompeu em lágrimas e disse que não admitia ser tratado como um criminoso comum, como mostra o JB. Pergunta da produção do nosso programa: o que faz dele um criminoso especial?

Descaso

Dura crítica à maneira como o governo do Amazonas trata os doentes mentais está hoje no jornal ?A Crítica? (nome apropriado, não?), de Manaus – e olhe que a autora das denúncias é a coordenadora da Comissão de Saúde Mental do Estado, Maria de Nazaré da Silva. Segundo ela, o estado não cumpriu dez das onze portarias do Ministério da Saúde para melhorar a qualidade de vida dos doentes mentais, e a décima-primeira só foi cumprida porque, se não fosse, o governo federal não aumentaria o repasse de verbas. A maneira como as autoridades aparecem na matéria tentando evitar o contato com o jornal serve apenas para mostrar que as denúncias devem ser verdadeiras.

Parece piada

Tudo bem que todo ser humano (mesmo os que não agem como tal) tem direito de defesa e que, para defender seus clientes, os advogados tentam de tudo, mas tem horas que chega a parecer brincadeira. Segundo o jornal ?O Povo?, de Fortaleza, o advogado de Luiz Miguel Melitão Guerreiro, mentor confesso da chacina de seis empresários portugueses como ele, não quer que seu cliente participe da reconstituição do crime. Ele diz que, como o assassinato provocou clamor popular, seu cliente corre risco de vida e que Melitão não foi o responsável pelas mortes, não podendo ajudar na reconstituição. Melitão foi o cérebro por trás da monstruosidade, recebeu os empresários no aeroporto, levou-os para o matadouro e, se não assistiu aos tiros propriamente ditos, foi porque estava em caixas eletrônicos roubando o dinheiro das vítimas. Vai dizer que não tem o que acrescentar à reconstituição?"

    
    
                     

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