Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Veja

BERNARD GOLDBERG

"A mentira ao vivo", copyright Veja, 28/01/02

"?Mentiroso?, ?traidor?, ?limitado?, ?sem talento?, ?extremista de direita?. Esses adjetivos raramente acompanham o nome de um autor que conseguiu colocar seu livro no primeiro lugar da lista dos mais vendidos do jornal The New York Times um mês depois de lançado. Mas foi com essas e outras impublicáveis qualificações que o jornalista americano Bernard Goldberg foi descrito pelos colegas que escreveram ou deram entrevistas sobre seu livro de sucesso. Não é para menos. A obra de Goldberg, que chegou às livrarias em 20 de dezembro e ao topo da lista dos mais vendidos na semana passada, traz já no título uma acusação pesada aos profissionais de imprensa. Ele usa o termo ?bias?, palavra da língua inglesa que significa viés e é empregada para definir alguém tendencioso, preconceituoso, que toma partido de determinado lado de uma questão em relação à qual deveria ser imparcial. Goldberg a usa contra os ícones sagrados do jornalismo de televisão dos Estados Unidos, como Dan Rather e Peter Jennings, que são vistos todas as noites por dezenas de milhões de americanos. Em Bias: a CBS Insider Exposes How the Media Distort the News (Um Conhecedor da CBS Mostra Como a Imprensa Distorce as Notícias), Goldberg revela segredos dos bastidores da televisão americana, onde trabalhou durante quase trinta anos.

?Os jornalistas adoram sujeitos que contam as sujeiras dos bastidores de empresas e do governo. Não deveriam ficar tão irritados quando alguém conta o que se passa atrás das câmaras de televisão e mostra como as notícias são distorcidas?, diz Goldberg. Em alguns trechos do livro o autor assume o tom rancoroso de alguém que se julga preterido em promoções para as quais se sentia mais qualificado que outros, escolhidos em seu lugar. Seu ódio contra Dan Rather é indisfarçável. Ele qualifica seu antigo protetor e chefe na CBS de mafioso e lhe dá o apelido de ?Don Rather?, com o qual passa a tratá-lo no livro. Até aí nada de mais. Goldberg era produtor, cargo que na televisão americana corresponde ao de editor – um profissional que tem certo poder de decisão sobre o conteúdo das notícias veiculadas mas invariavelmente fica atrás das câmaras. Já Dan Rather é muito mais que isso. Ele é o que se chama de âncora. Ou seja, a pessoa que dá a palavra final sobre o conteúdo e a forma do que vai ao ar nos noticiários – e ainda os apresenta ao vivo. É até natural que surgisse no jornalista menos exposto um sentimento de inveja do colega famoso. Mas o livro de Goldberg não chegou ao primeiro lugar na lista de mais vendidos por essa razão.

Ele fez sucesso porque mostrou, de modo convincente em alguns casos, que as notícias são distorcidas. Para favorecer quem? As grandes empresas? O governo? Não. Nada disso. Segundo Goldberg, os jornais da TV americana servem aos telespectadores notícias distorcidas por excesso de zelo em não ferir os sentimentos das minorias raciais, dos sem-teto, dos homossexuais e dos políticos mais à esquerda do espectro ideológico do país. Enfim, as emissoras estariam padecendo de um caso terminal da doença do politicamente correto. ?Parece inofensivo, mas a distorção feita de propósito por anos a fio é destruidora para a verdade. A servidão ao politicamente correto destruiu o jornalismo de televisão neste país?, diz Goldberg. Na semana passada, o canal Fox, considerado mais conservador que os concorrentes, ofereceu a Goldberg o comando de um programa semanal.

O livro conta histórias de exageros dos editores da CBS no afã de não ofender as minorias. Goldberg relata o caso de uma equipe de reportagem enviada às Ilhas Virgens para cobrir uma furiosa onda de saques que se seguiu a um furacão. ?A matéria foi vetada porque nas imagens só apareciam saqueadores negros?, conta Goldberg. ?É risível. Eles só poderiam ser negros, pois 95% da população da ilha é formada de negros.? Em outra reportagem semelhante, uma equipe foi ao Estado sulista do Alabama filmar o ressurgimento nas penitenciárias estaduais de um tipo de punição que tinha sido banido dos Estados Unidos havia pelo menos quatro décadas: as correntes em que grupos de até vinte presos são levados para trabalhar ao ar livre. ?Nas cenas, dezenove dos vinte detentos eram negros. Os yuppies que editam os noticiários em Nova York, e nunca foram ao sul do país, mandaram fazer uma nova filmagem, dessa vez colocando mais prisioneiros brancos?, conta Goldberg. ?Ora, dezenove de cada vinte presos no Alabama são negros. Colocar mais brancos na imagem seria uma falsificação. A equipe se recusou. A reportagem não foi ao ar.?

Goldberg sustenta que invariavelmente as televisões exageram os problemas sociais por temor de ser alvo de retaliações dos ativistas. Ele cita a questão dos sem-teto de Nova York e de outras metrópoles. ?Nós sabíamos que eles eram em geral bêbados, loucos, drogados e pessoas solitárias por opção. Mas acabávamos levando ao ar histórias falsas, dizendo que na maioria eram pais e mães com filhos?, escreveu ele, referindo-se à situação de meados dos anos 90. Intrigantes também são as histórias de repórteres obrigados a procurar personagens pertencentes às minorias raciais para cumprir a ?cota de diversidade? exigida pelos editores. ?É patético, mas uma repórter passou um dia inteiro à cata de um astrônomo asiático para comentar um eclipse, quando é óbvio que ela deveria apenas procurar um bom astrônomo?, conta Goldberg. Estatisticamente, um ponto mais forte do livro é o que se chamou de ?mito da Aids heterossexual?. Goldberg cita um estudo que mostra a distorção numérica entre a população aidética da vida real e a que aparecia dando entrevista nos telejornais. Embora a maioria dos aidéticos fossem homossexuais, negros ou hispânicos, nas emissoras apareciam em muito menor número que os brancos. ?A palavra de ordem do lobby gay era transformar a Aids numa doença heterossexual, pois assim se pesquisaria a cura para ela. As televisões embarcaram sem crítica nessa distorção?, diz ele, para perguntar em seguida: ?Os jornalistas ajudaram a acelerar as pesquisas para a cura da Aids? É discutível. Mas sem dúvida mataram a verdade.?

O livro de Goldberg nasceu da ampliação de um rumoroso artigo escrito por ele em 1996 e publicado no mais lido jornal de economia dos Estados Unidos, o Wall Street. Nele, Goldberg demonstrou como os colegas de televisão tratavam com ironia e desdém os políticos de direita, ao mesmo tempo que mostravam reverência pelos de esquerda, só justificável por simpatia ideológica. Ele conta que depois da publicação do artigo passou a ser discriminado na redação da CBS. Dan Rather nunca mais falou com ele, por exemplo. ?Idiotas de esquerda eram tratados como sumidades e políticos de direita com algum tutano, transformados em patetas?, diz ele. Questões como as discutidas por Goldberg são sempre explosivas, mas não é só por isso que ele foi para a lista dos best-sellers. Entre os quinze livros da lista dos mais vendidos do New York Times, cinco são de autores francamente conservadores. Isso parece indicar que os exageros do politicamente correto podem estar cansando o público americano."

 

"Bush exibe livro de cabeceira", copyright O Estado de S. Paulo, 26/01/02

"O presidente americano, George Bush, chamou ontem a atenção da imprensa ao sair da Casa Branca. Nenhuma declaração bombástica ou mal-estar. O objeto de curiosidade ficou por conta de um livro que Bush trazia debaixo do braço: Prejuízo – Um veterano da CBS descobre como a imprensa distorce as notícias. Escrito pelo veterano jornalista Bernard Goldberg, a obra acusa os meios de comunicação americanos de serem influenciados pela esquerda.

Bush nada falou sobre o livro, mas especula-se que se trate de uma ?indicação? Bush foi flagrado quando saía da Casa Branca em direção ao helicóptero que o levou a Portland, no Estado do Maine. Contrariando seus hábitos, o presidente fez questão de mostrar ostensivamente o livro, sob o braço direito, quando passava em frente às câmeras de tevê e fotógrafos.

Ao tentar questionar o presidente sobre a escolha do livro, em meio ao barulho emitido pelas turbinas do Marine One, um jornalista ouviu de Bush apenas um ?não posso ouvi-los?.

A obra de Goldberg – que por 28 anos foi correspondente da rede de tevê CBS – acusa tanto a própria emissora quanto os demais meios de imprensa de distorcer as notícias por influência da esquerda – leia-se Partido Democrata.

O livro, que acabou se tornando um best seller entre os conservadores, vem tendo boa venda nas livrarias. Tanto que passou a ser citado na lista dos mais vendidos do New York Times.

Mais do que uma escolha pessoal, Bush pode estar fazendo da leitura do livro de Goldberg uma forma de agradar seus colegas republicanos. Há tempos eles vêm alertando Bush de que os democratas há décadas ?mandam? na imprensa americana."

"Leitura de bordo polêmica", copyright O Globo, 27/01/02

"O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, se recusou a falar com os jornalistas ao deixar a Casa Branca rumo ao helicóptero que o levaria ao Maine. Mas a escolha do que leria na viagem do fim de semana pode dar uma idéia do que o presidente anda pensando em relação às empresas de comunicação.

Ao passar por câmeras de TV e fotógrafos rumo ao Marine One, Bush carregava um livro que se tornou famoso entre os conservadores: ?Bias: A CBS insider exposes how the media distorts the news? (?Preconceito: um empregado da CBS mostra como a mídia distorce as informações?), escrito pelo jornalista Bernard Goldberg, que foi correspondente da rede por 28 anos. ?Não consigo ouvi-los?, disse Bush aos jornalistas, carregando o livro.

O presidente dos EUA não costuma ser famoso por seu amor aos livros. Por isso, ao surgir ontem com este e mostrando-o de forma tão clara, despertou comentários de que estaria mandando um recado às empresas de comunicação. Isso acontece no momento em que a imprensa americana volta a criticá-lo, após uma trégua de meses, iniciada depois dos atentados de 11 de setembro.

No livro, Goldberg acusa a CBS e outras empresas de comunicação de sofrerem de um preconceito liberal e adotarem um discurso mais à esquerda na hora de informar. O Partido Republicano, ao qual Bush pertence, acusa há décadas os principais meios de comunicação do país de distorcer informações em favor dos democratas."