Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Vermes televisivos de identidade duvidosa

Fiquei alarmado com o tratamento dispensado à matéria sobre o novo medicamento Xenical, no Jornal da Cultura de 11/1. A repórter descreveu brevemente o efeito esperado do medicamento, entrevistou rapidamente uma consumidora, a qual recomendou enfaticamente o consumo do produto (e ela sequer podia provar sua eficácia, pois “destruiu as fotos onde aparecia gorda”…), e a seguir a repórter indicou os preços e as farmácias onde o produto pode ser encontrado.

Isso para mim se chama *propaganda. Jornalismo supõe isenção, confronto de opiniões, informação. É no mínimo curioso que não se entrevistasse um médico ou um farmacêutico, que poderiam alertar sobre possíveis efeitos colaterais, ou fornecer informações científicas sobre o produto. E, neste caso em particular, como a droga se destina a uma grande parcela da população, esse “descuido” beira a irresponsabilidade (a não ser que a emissora parta do princípio de que sua audiência tende a zero, e que portanto ninguém será possivelmente prejudicado).

Não sei como outras emissoras e órgãos de comunicação trataram da chegada desse medicamento. Espero que não tenham cometido o mesmo deslize. Entretanto, independentemente disso, é preocupante ver o “novo jornalismo da TV Cultura” iniciando desse modo. Se essa é uma amostra do que está por vir, lamentavelmente deixarei de assistir a um dos poucos telejornalismos no qual depositava alguma confiança.

Esta mensagem está sendo enviada simultaneamente ao Jornal da Cultura e ao Observatório da Imprensa. Do primeiro, espero que reconheça o problema e se policie para que não aconteça novamente. Do segundo, gostaria que contribuísse para a discussão da responsabilidade no telejornalismo, especialmente com relação aos produtos medicamentosos destinados (explicita ou implicitamente) ao consumo maciço, como por exemplo este Xenical e o célebre Viagra.

Marcelo P. Allen, São Paulo

 

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