Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Vestibular: cadê o jornalismo?

Victor Gentilli

 

O

s jornais esbaldam-se com os resultados dos exames para ingresso no ensino superior. Ganham leitores e anunciantes. Em troca, publicam apenas a relação de nomes dos aprovados.

Há anos, os cursos preparatórios para o vestibular centram suas campanhas no êxito de seus alunos. Abundam estatísticas nos anúncios, que os jornais publicam sem qualquer checagem.

Os jovens consumidores de cursinhos e jornais vêem números que se contradizem nos anúncios e nenhuma reportagem.

Os jornais bem que podiam cativar esses leitores com algum produto jornalístico mais qualificado. Os estudantes compram os jornais, conferem seus nomes e confirmam que os jornais não são para eles.

Na verdade, a prática de confundir jornalismo com outros negócios permanece na imprensa brasileira. Neste momento em que os chamados “homens de marketing” passam a ter cada vez mais poder sobre decisões jornalísticas, um problema que parecia em fase de superação, que andava escondido, passa a se exibir cada vez mais à luz do sol.

Nos jornalões ainda dissimulam-se em cadernos dominicais (onde os classificados ganham capa aparentemente jornalística) ou nos cadernos culturais. Não foi uma nem duas vezes que Alberto Dines chamou a atenção para a mudança editorial de cadernos culturais que ganham anúncios de páginas inteiras em suas capas de griffes famosas.

Mas no jornalismo regional fora dos grande centros, tal prática parece retornar com muito vigor. A crise acentua a tendência, na medida em que qualquer ganho de receita vale a pena.

Cadernos organizados por departamentos de marketing aparecem encharcados de anúncios com alguns textos de louvação aos anunciantes. Faria bem se os jornais alertassem os seus leitores com uma tipologia diferente ou a expressão informe publicitário em destaque. Faria.

 


V. G.

 

O OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, em suas duas últimas edições, apresentou textos de quatro professores das cinco escolas que obtiveram conceito AAA no provão do MEC que avaliou os cursos de Jornalismo.

Apresento, a seguir, trechos dos textos dos professores das melhores cursos de Jornalismo, segundo o provão, que ajudam a montar uma espécie de receita para um curso de Jornalismo nota A:

De Sônia Virgínia Moreira, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

“Os cursos de jornalismo precisam estar atrelados à realidade que os cerca, servindo de espaço privilegiado para o estudo e a crítica dos meios de comunicação como canais de informação para comunidades locais, regionais, globais. A meta do estudante de jornalismo é se integrar a uma equipe de redação, mas um curso de jornalismo só estará formando profissionais quando eles estiverem capacitados para a prática efetiva daquilo que tiveram a oportunidade de estudar, aprender, exercitar, criar e testar na academia. Para que isso aconteça, a universidade e o mercado de trabalho devem se dar a conhecer: a primeira mostrando as pesquisas que produz para aprimorar a formação e a atividade profissional; o segundo atuando como parceiro na composição de um perfil básico para o jornalista, com qualidades suficientes para iniciar carreira em qualquer redação – de jornal, revista, rádio, TV ou media online.”

De Márcia Franz Amaral, da Universidade Federal de Santa Maria:

“Temos muitos limites a romper. Um curso de jornalismo conceito A deve estar em permanente diálogo com o mercado e com a sociedade. Deve ser a vanguarda e apontar tendências e não andar a reboque dos acontecimentos. Precisamos incorporar disciplinas que discutam a teoria do jornalismo, façam a abordagem crítica à mídia e abordem outras técnicas e linguagens. É urgente repensar o campo do jornalismo e incrementar também ações de pesquisa e extensão. É premente a construção de um projeto acadêmico para o curso. Precisamos aproveitar a reforma curricular e inserir disciplinas que discutam as especificidades do jornalismo, capacitando o aluno para o relacionamento entre a teoria e a técnica e amarrando as atividades de ensino, pesquisa e extensão. Precisamos resgatar o espaço e a identidade do jornalismo no universo comunicacional, como já sugeriram os professores integrantes do Fórum Nacional de Professores da área.

De Eduardo Refkalefski, da UFRJ:

“Um curso precisa ser muito, mas muito ruim mesmo, para que o aluno fique ouvindo os professores e os colegas durante quase meia década e não lembre nem de alguns termos técnicos, como jornalismo declaratório.

Isto levando-se em conta que há pequenas variações de conceitos: eu, por exemplo, chamo de jornalismo-taquígrafo; o professor e editor do jornal Monitor Mercantil, Sérgio Souto, chama de jornalismo-papagaio, que repete a fala do entrevistado; Hélio Fernandes diz que é entrevista-vôlei, em que o repórter levanta para o entrevistado cortar; o professor Victor Gentilli chama de moleque de recados, ACM quer dar uma bronca em José Serra e chama a imprensa para uma coletiva…”

De Luiz Martins da Silva, da Universidade de Brasília:

“Desde que existe, o Curso de Jornalismo da UnB tem-se caracterizado por um saudável trânsito entre a academia e o mercado, seja no revezamento de professores, entre as redações e as assessorias e as salas de aula, seja na ocupação de vagas por parte dos recém-formados. Nas redações do Correio Braziliense, do Jornal de Brasília e das sucursais, ter-se formado na UnB não só é uma boa referência, como, freqüentemente, as equipes são formadas por antigos e novos alunos e professores da UnB.

(… …)

Para os interessados, uma das linhas de pesquisa do novo doutorado chama-se, exatamente, Produção Social do Jornalismo. A pesquisa tem sido um dos pontos marcantes na graduação em Jornalismo da UnB. Professores e alunos têm desenvolvido projetos integrados, com apoio do CNPq, entre eles, o SOS-Imprensa.”

Como se vê, não há mistério no sucesso de um curso de Jornalismo.