Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Voz da América pop

IRÃ

A Voz da América e a Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade (VOA e RFE/RL, siglas em inglês) mudarão sua programação para o Irã. Com hits como os de Back Street Boys, ‘N Sync e Britney Spears, as emissoras, operadas pelo governo dos EUA para fazer propaganda ideológica internacional, querem ganhar mais público no país que o presidente George W. Bush incluiu em seu "Eixo do Mal". O idealizador do projeto é Norman Pattiz, integrante do Comitê de Radiodifusão dos Governadores, entidade responsável por controlar as rádios internacionais estatais americanas. Foi ele quem comandou as mudanças na Voz da América árabe, que deu origem à Rádio Sawa, que também adotou a cultura pop como meio de se aproximar dos ouvintes.

A iniciativa de mudar a programação em farsi, idioma falado no Irã, chega depois de informações de que a população do país asiático está deixando de ouvir a emissora americana porque ela estaria apoiando demasiadamente o presidente Mohammad Khatami – a RFE/RL até teria ganhado apelido de Rádio Khatami. A idéia é reduzir o conteúdo jornalístico e informativo para apenas dez minutos por hora. "As mudanças são reflexo do que acontece em outros lugares. A demografia da região ? 70% da população tem menos de 20 anos ? deixa claro que o tipo de abordagem que usaremos, colocando 24 horas de música no ar, terá grande mérito no Irã como tem no Oriente Médio", anima-se Pattiz.

Críticos do projeto acham que a população que quer ouvir mensagens de "liberdade" pode se achar abandonada pelos EUA. "Os iranianos já têm um monte de música. O que precisam é de bons comentários, entrevistas, programas que lidam com os fatos", critica Ali Reza Nourizadeh, jornalista do Irã radicado em Londres. "Não é só rádio. Representa uma política, um país". Os opositores à mudança ressaltam que o sucesso da Rádio Sawa não pode servir como referência para implantação de modelo semelhante no país dos aiatolás porque os árabes, ao contrário dos iranianos, têm profundo sentimento antiamericano. "Se eles fizerem isso, será um grande erro. Os iranianos estão muito felizes com o que está aí. Acho que deveriam aumentar os comentários, em vez de diminui-los", afirma Assad Homayoun, presidente da Fundação Azadegan, sediada nos EUA, que promove o estabelecimento de um governo secular no Irã.

O acesso da população a DVDs, vídeos e outros tipos de tecnologia empurrou o cinema iraniano para uma crise profunda. A censura, que só permite filmes nacionais e rigidamente de acordo com leis islâmicas, condena as telonas à monotonia. Segundo a Reuters [11/9/02], ela é, em grande medida, responsável pela queda de cerca de 25% nas bilheterias das salas de exibição nos últimos quatro anos. "Filmes americanos são mais vivos e sem censura", comenta Babak, um administrador de empresas. Apesar dos mais de 300 prêmios ganhos por filmes iranianos no exterior e o reconhecimento de diretores como Abbas Kiarostami e Mohsen Makhmalbaf, o cinema do país perdeu contato com o público doméstico.

Em 1979, a Revolução Islâmica passou o controle da produção cinematográfica para o Estado para livrá-lo de influências culturais ocidentais e difundir valores muçulmanos. Agora, plano do governo do presidente Mohammad Khatami pretende estimular o cinema por meio de investimento privado. Contudo, a idéia tem tido pouco resultado porque ninguém quer investir em um filme que pode ser censurado. "Os produtores querem fazer filmes com mais itens críticos, que atrairiam mais público. Mas essas obras muitas vezes não recebem permissão de exibição", lamenta Mohammad Hossein Farahbaksh, da Associação de Produtores Cinematográficos do Irã. A falta de leis mais claras e as incertezas do mercado também têm afugentado investidores da construção de novas salas.

Em outra tentativa de melhorar a situação, o governo transferirá o controle da indústria do Ministério da Cultura e da Orientação Islâmica para a Casa do Cinema, entidade que congrega associações de classe autorizadas pelo Estado. Para críticos, contudo, essa iniciativa não mudará nada. Ao contrário, poderá até diminuir o número de produções. "Somos contra as políticas da Casa do Cinema, que impõe mais restrições ao conteúdo dos filmes", afirma Ali Reza Davoudnejad, também da Associação de Produtores Cinematográficos. Alguns donos de cinemas, desesperados, chegaram a pedir que filmes ocidentais, mais atraentes para o público, fossem autorizados.