Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Vítor Buaiz: “A imprensa não mostra as razões da crise na saúde”

O governador do Espírito Santo, Vítor Buaiz, reclama do jornalismo feito de fragmentos e que, por isso, não reproduz fielmente suas declarações, acha que a imprensa local não faz autocrítica e precisa de um ombudsman. Para ele, a imprensa não mostra as razões pelas quais os serviços públicos de saúde têm problemas.

Às vésperas da Semana Santa, três estudantes de jornalismo da UFES, pesquisadores do projeto “Avaliação Crítica do Jornalismo Impresso Capixaba: O Noticiário de Saúde e Educação” foram atendidos pelo governador do Espírito Santo, Vítor Buaiz, para a entrevista abaixo.

O governador Vítor Buaiz é médico e professor universitário. Sua história política é longa; sua vida pública iniciou-se como presidente do Sindicato dos Médicos. Foi deputado federal Constituinte e prefeito de Vitória, pelo PT. Durante toda esta longa convivência, Vítor ganhou traquejo na relação com jornalistas, dos jornais locais e dos jornalões, mas, conforme se vê na entrevista, não perdeu a visão crítica, o que ocorre com muitos que convivem diariamente com jornais e jornalistas.

Victor Gentilli

Como o senhor conceberia o jornalismo ideal?

É aquele jornalismo que informa a verdade para toda sociedade e ajuda a sociedade na fiscalização dos serviços públicos e na atuação da classe política. O jornalismo ideal é aquele que leva a verdadeira informação, não manipulada e que possa dar credibilidade àqueles que lêem jornais.

Os jornais locais, A Gazeta e A Tribuna, se aproximam desse modelo ou se afastam?

Em determinados momentos nós vemos que a imprensa local tem alguns desvios para a tendenciosidade. Mas isso também é muito comum na imprensa nacional.

O senhor conhece modelos de jornais nacionais que se aproximam mais desse modelo que o senhor define como ideal?

É difícil dizer que esse modelo é ideal quando você não tem nos jornais a figura do ombudsman. A Folha de S. Paulo é bem autocrítica. Quanto à atuação, a maior ou menor, do ombudsman, isso significa o melhor ou pior jornalismo que se faz no país.

O senhor acha que os jornais capixabas abrem espaço para uma autocrítica?

Nós não vemos esse espaço nos jornais.

Como o senhor avalia o jornalismo específico sobre saúde e educação no Estado?

As informações muitas vezes são distorcidas. Ele não exibe a realidade das causas que levam os serviços de saúde e educação a não funcionarem com eficiência. Veja por exemplo, quando se fala em atendimento à saúde, a imprensa logo procura centrar fogo em cima do hospital São Lucas [hospital que funciona como centro de referência para Pronto Socorro na Grande Vitória].

Criticar o Estado é mais fácil que criticar a iniciativa privada no noticiário de saúde?

Sem dúvida. A iniciativa privada atende quando bem entende. O serviço público não, ele tem que atender a todos, sem distinção. Essa questão tem sido colocada na imprensa muitas vezes de forma distorcida e isso acaba prejudicando a análise crítica que a sociedade faz do serviço de saúde. Além do mais, sempre colocam o governo no centro das discussões, deixando a União e os municípios de lado. Se não tem o recurso financeiro do governo federal o serviço não funciona bem. Se o município não dá atendimento nas ações básicas de saúde, sobrecarregam-se os hospitais. Por isso, estamos trabalhando numa campanha para incentivar as ações básicas da medicina preventiva. Para evitar que as pessoas tenham que recorrer ao serviço muito mais caro, que é o serviço hospitalar.

O senhor acha que os repórteres reproduzem com fidelidade as suas declarações?

Nem sempre. Eu estou dando uma entrevista para você e vamos supor que ela tenha uma página. De repente o repórter pinça uma frase que eu falei e coloca como a coisa mais importante da matéria. Aí a entrevista fica prejudicada.

Isso acontece com muita freqüência?

Vamos dizer que isso acontece em 40% dos casos.

Então a imprensa não pratica análise investigativa?

Ela é limitada. Não cumpre totalmente, cumpre parcialmente o seu papel.

A visão que o senhor tinha do Estado nos jornais há dez anos, antes de o senhor ser prefeito de Vitória e governador, é a mesma que o senhor tem hoje?

Uma coisa é a imprensa num regime autoritário, com censura. Outra coisa é a imprensa livre. A imprensa no regime autoritário teve um papel fundamental. Era uma trincheira de lutas para a democracia.

O senhor acha que médicos e professores encontram a imprensa como uma mediador para negociar com o governo?

Todo setor da sociedade tem a imprensa como mediador. Isso não significa dizer que o governo não está aberto para o diálogo com essas categorias. O contato é feito permanentemente através dos secretários. Só que muitas vezes os sindicalistas transmitem à imprensa fatos que não são verdadeiros. É uma tentativa de ganhar a opinião pública. Essa tentativa de manipular a informação por parte dos sindicatos faz muitas vezes com que a opinião pública fique confusa. Não sabe de que lado está a razão: se é o governo ou o sindicato que está falando a verdade.

A imprensa trabalha muito com o conceito da emoção coletiva…

É claro que sim. Muitas vezes a imprensa explora isso demais. Eu acho que a televisão, principalmente, apela para a emocionalidade. Quando entra dentro do pronto-socorro, focaliza o paciente deitado, sangrando, desmaiado. Isso é totalmente contra a ética jornalística e a ética médica. Eu como médico não tenho o direito de expor um paciente sem que a família tenha autorizado. No ano passado, a televisão mostrou um paciente no São Lucas tendo uma crise convulsiva. É lamentável. É profundamente lamentável tanto da parte do médico como da parte do jornalista que faz uma matéria dessas.

Quais seriam então as maiores dificuldades que o governo encontra para informar a população através da imprensa?

Comunicação é uma coisa cara. Trinta segundos na televisão custa muito dinheiro. No jornal impresso é a mesma situação, o governo não pode ficar produzindo matéria paga. Até mesmo porque matéria paga é uma coisa que as pessoas olham meio de lado.

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