Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>A notícia fragmentada

A notícia fragmentada


Hoje nós conversamos com o professor Vinicius Romanini, da Escola de Comunicações e Artes da USP.


Luciano Martins – Professor, é impressão do observador, ou o noticiário da imprensa brasileira é fragmentado?


Vinicius Romanini – Não é impressão. Isso é uma percepção real. O conceito com que o jornalista trabalha de notícia, no meu entender, está ultrapassado. A notícia, a teoria da notícia, a teoria do Jornalismo não acompanhou o entendimento do que é comunicação. Hoje as teorias da comunicação mais avançadas tentam incluir conceitos como complexidade, relação, sistema, fluxos continuados. E a teoria da notícia, que ainda se ensina e que se pratica nas redações, é de que a notícia é uma unidade fechada. Ela é uma construção que tem um formato e os manuais repetem isso continuadamente, de forma que a gente tem aí um ciclo vicioso. O Jornalismo se construiu historicamente em cima disso; as teorias da comunicação jornalística repetem este modelo; e os novos jornalistas estão chegando às redações sem a criatividade para ultrapassar esse modelo.


LM – Na sua opinião, trata-se de falta de capacitação, falta de interesse ou falta de percepção dessa mudança?


VR – Na academia, é falta de novas teorias. A gente precisa avançar na produção teórica do Jornalismo. Precisamos pensar mais, refletir mais sobre o que é o Jornalismo em uma sociedade complexa, em uma sociedade que se estrutura a partir da informação, da comunicação. Hoje você tem em todos os âmbitos, em todos os estágios da sociedade, fluxos de informação circulando. A sociedade hoje se estrutura a partir da informação e a informação jornalística é uma parte crucial, importante, fundamental, mas é uma parte desse fluxo. Só que ela não está se conectando com os demais fluxos. Então essa visão sistêmica de que a sociedade se constrói dentro de uma estrutura maior, mais ampla, ela não está sendo praticada no fazer jornalístico.


Seguimos conversando com o professor Vinicius Romanini, da Escola de Comunicações e Artes da USP.


LM – Professor, se as empresas jornalísticas investem bastante na capacitação de seus profissionais, porque é que não se consegue produzir um jornalismo mais adequado à sociedade contemporânea?


VR – É a história do ovo e da galinha. A gente ainda faz aquilo que é mais fácil. Aquilo que industrialmente é mais viável. A gente faz um Jornalismo para caber dentro das possibilidades industriais de produção e de veiculação. A gente não está fazendo um Jornalismo que questione o modelo de produção jornalística, para fazer esses modelos acompanharem o desenvolvimento das necessidades sociais de informação. A gente continua fazendo aquilo que é mais fácil, mais facilmente empacotado, para servir normalmente a interesses de marketing, de publicidade. Então o Jornalismo hoje é um agregado: ele vai à reboque das necessidades de veiculação industrial que são ditadas pelas agências de publicidade, pelos esquemas de marketing, pelos projetos de marketing. E o jornalista hoje é uma figura secundária na indústria de produção jornalística. Ele não é mais o principal.


LM – Por que então esse Jornalismo mais moderno, esse Jornalismo mais avançado não brota nos sites de jornais na internet?


VR – Porque a internet e, principalmente, os sites dos veículos de comunicação repetem esses mesmos erros. Muito raramente você tem um site de uma empresa jornalística que realmente ousa a integrar na sua forma de produção noticiosa as potencialidades desses meios de comunicação. O que a gente vê é que fora dos sites das empresas jornalísticas, na sociedade, começam a brotar formas de fazer jornalístico, de fazer comunicacional, eventualmente, por jornalistas que não estão empregados, não estão com carteira em jornais, esses jornalistas testam novas possibilidades e conseguem resultados muito mais criativos, muito mais efetivos, do que o Jornalismo mais tradicional, feito pelas empresas mais conhecidas.


LM – Essa pode ser uma das explicações para a queda na leitura do jornal e da revista impressos?


VR – Não tenho dúvida. Acho que os meios digitais, não só colocaram em cheque a sustentabilidade do modelo impresso… Hoje, no meu entender, não faz mais sentido, dada a possibilidade de você fazer circular em tempo praticamente real, em tempo online, informação, você ter todo um parque industrial pesado, que consome energia, recursos, tinta, papel. Aquele parque industrial que não pertence nem ao século XX, mas ao século XIX. A gente pensar que o Jornalismo vai se estruturar a partir de meios físicos, é um engano hoje. O que a gente tem é que investir em um Jornalismo que absorva a complexidade das novas mídias, das novas tecnologias e que saiba se aproveitar delas.


LM – Professor, obrigada pela excelente conversa.


Hoje nós falamos com o professor Vinicius Romanini, da Escola de Comunicações e Artes da USP.