Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

>>Beirando o ridículo
>>Candidatos a censores

Beirando o ridículo


Os jornais vinham acompanhando sem muito empenho os debates e a votação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal sobre as novas regras eleitorais, através das quais os parlamentares tentam pela primeira vez regulamentar o uso da internet em campanha política.


Longe dos olhos da opinião pública, os deputados haviam enfiado no projeto de reforma uma série de medidas que, na prática, tentam equiparar a internet ao rádio e à televisão, que têm o conteúdo monitorado durante o período da campanha.


Do jeito que chegou ao Senado, a proposta aprovada na Câmara proibia, por exemplo, a divulgação de charges e comentários em sites e blogs durante os três meses da campanha que começa oficialmente no dia 5 de julho.


Os relatores das comissões do Senado, Marco Maciel e Eduardo Azeredo, deixaram passar a tentativa de controle, sob os olhares pouco interessados da chamada grande imprensa.


Somente no final do dia, nesta quarta-feira, depois que o assunto já provocava muita indignação de internautas e de alguns juristas, os senadores começaram a se manifestar contra a proposta e a decisão acabou sendo adiada para a semana que vem.


Durante os debates, ficou muito claro que Maciel e Azeredo andaram tomando decisões sobre assunto que desconhecem.


O senador do PSDB, por exemplo, chegou a declarar que o YouTube deveria seguir as mesmas regras da televisão.


Só não explicou como a Justiça Eleitoral iria proibir alguém de montar um site no exterior e postar vídeos a favor ou contra determinado candidato.


No meio dos debates, quando finalmente o tema começou a agitar o Senado e atrair maior atenção dos sites jornalísticos, foi divulgado o resumo do julgamento da Lei de Imprensa no Supremo Tribunal Federal.


No texto, o relator, ministro Carlos Ayres Britto, deixa claro que a internet deve ser considerada “território virtual livremente veiculador de idéias, debate, notícia e tudo mais que se contenha no conceito essencial da plenitude da informação jornalística”.


O processo de impor restrições à internet foi interrompido.


Mas o assunto está longe de ser encerrado e o Congresso Nacional andou beirando o ridículo.


O Brasil tem quase 70 milhões de usuários de internet, e os brasileiros são os mais ativos nas chamadas redes sociais virtuais.


Assim, é natural que políticos conservadores, habituados a controlar seus currais eleitorais, temam os resultados de uma eleição na qual as escolhas não ficarão restritas à influência do rádio e da televisão.


Lembre-se o leitor (e ouvinte) atento que muitos parlamentares são donos de concessões de rádio e TV, e que a imprensa tradicional nunca colocou esse tema em debate público; tem sido cúmplice dessa ilegalidade.


Quando o desenvolvimento tecnológico coloca à disposição da sociedade um meio amplo, livre de controles, os parlamentares tentam inventar uma forma de restringir seu uso.


Sob o olhar distraído da imprensa.


Candidatos a censores


Os candidatos a controladores da internet seguem ativos no Congresso, mas nesta quinta-feira, pela primeira vez, os jornais dedicam à mini reforma eleitoral um espaço adequado.


O tema deve ir à votação no começo da semana que vem, e não se pode adivinhar o que vai sair da cabeça dos legisladores, mas alguns ensaios de liberalização já começaram a aparecer.


Uma das propostas consiste em agilizar o direito de resposta, que teria de ser garantido no prazo máximo de 48 horas após a inserção de conteúdo considerado ofensivo a algum candidato.


Além disso, a correção poderá ficar no ar por pelo menos o dobro do tempo em que ficou exposto o conteúdo ofensivo.


A proposta aprovada nesta quarta-feira pelas comissões de Constituição e Justiça e de Ciência e Tecnologia do Senado é um primor de conservadorismo e uma clara demonstração de que os integrantes dos dois comitês caminharam ao largo dos direitos essenciais de acesso à informação.


Além disso, pelas declarações com as quais tentaram se justificar, fica claro que além de não serem muito entusiasmados com o livre debate de idéias, também estão muito longe de entender o que são os novos meios de comunicação em rede.


Mas o que mais chama atenção do observador é o fato de que os chamados grandes jornais demonstram surpresa com os pareceres aprovados nas duas comissões.


A solução encontrada para remediar a situação foi tentar aprovar uma emenda no plenário revogando os itens que representam censura aos meios online.


Mas nada garante que não acabe passando um monstrengo sem sentido.


Ainda corremos o risco de ter uma lei que tentará submeter a controle aquilo que nasceu para ser livre.