Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

>>Brasília: nada a celebrar
>>Uma receita para os jornais

Brasília: nada a celebrar

Não foi possível outra abordagem: os cadernos especiais elaborados pelos jornais para comemorar os 50 anos de Brasília, nesta quarta-feira, estão contaminados pelo noticiário a respeito do escândalo que levou á prisão o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.

Assim, ao completar meio século, Brasília encontra sua síntese: na cidade em cruz desenhada por Lúcio Costa e projetada por Oscar Niemeyer, está representada a histórica mistura entre o sonho da modernidade e os vícios que nos atam ao passado.
 
Os cadernos comemorativos dos principais jornais de circulação nacional fazem um retrato impiedoso da capital federal.

Segundo o Estado de S.Paulo, Brasília é um cartão-postal cercado pela miséria.


De acordo com a Folha de S.Paulo, a cidade chega aos 50 anos imersa na maior crise política de sua história e com graves problemas de transporte, habitação e emprego.

Na visão do Globo, a festa é tímida, e a capital federal vai comemorar o aniversário envergonhada pela prisão de seu ex-governador e a ameaça de intervenção federal.
 
Os jornais partem do lugar-comum da ousadia arquitetônica de Niemeyer e Lúcio Costa e enveredam para as análises sobre a eterna obsessão brasileira com a modernidade.

Os analistas convidados observam que o isolamento da capital federal, no meio do Cerrado, facilitou a cristalização da política patrimonialista, que coloca no poder, sucessivamente, gente como Arruda e Joaquim Roriz.

O Estadão lembra que a nova capital pratica o que há de mais velho na política e faz aniversário com um governo tampão, eleito indiretamente.

A Folha propõe um hino para o cinqüentenário de Brasília.

Nada mais apropriado: a convite do jornal, constrói-se um rap, essa espécie de repentismo marginal que a imprensa chama de música.
 
Uma receita para os jornais

Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:

– O jornalista espanhol Juan Luis Cebrián esteve no Brasil para o lançamento de seu último livro, “O pianista no bordel”, que apareceu na Espanha em junho do ano passado e agora sai em português pela Editora Objetiva (Leia aqui um dos capítulos do livro, ‘Gacetilleros, gansos y embaucadores’, em espanhol). O volume reúne dez preciosos ensaios de um dos jornalistas mais importantes da Espanha atual, que traz no currículo além de uma profícua vivência em redações, um reconhecido dom pela literatura e para a reflexão sobre o ofício jornalístico.

Cebrián é um dos fundadores e o primeiro diretor de Redação do diário El País, que começou a circular em 1976 e converteu-se num veículo decisivo para o enfrentamento dos desafios do pós-franquismo; hoje, é tido como um dos cinco principais jornais do mundo.

Cebrián deixou a Redação para se tornar executivo-chefe do Grupo Prisa, o maior conglomerado espanhol de mídia, controlador do El País. Mesmo tendo passado para o outro lado do balcão, as entrevistas que concedeu em sua estada no Brasil revelaram um jornalista absolutamente antenado com o seu tempo (ver aqui e aqui).

Ele diz que o jornal impresso, tal como originalmente concebido, não tem futuro na economia digital. Para não desaparecer, o jornal em papel deverá encontrar seu nicho de mercado num mundo cada vez menos afeito à intermediação. Mas seja qual for a plataforma, o jornalismo será cada vez mais necessário.

Diz Cebrián: “O que nos cabe perguntar é que tipo de jornalismo queremos ter na rede”. E adiante: “Teremos de investir em capital humano (…) se quisermos fazer diferença: ter bons jornalistas, gente com preparo para enfrentar operações globais. Mas é preciso mudar nossa forma de pensar.” Disso não há dúvidas: o jornalismo é uma profissão marcada pelo eterno aprendizado. E pelo trabalho em equipe. De resto, o veterano jornalista demonstrou continuar em ótima forma.