Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

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Caos informativo

Os grandes jornais paulistas finalmente se deram conta da gravidade da situação provocada pela combinação das fortes chuvas com a incúria das autoridades.

Tanto o Estado de S.Paulo como a Folha de S.Paulo entregam a seus leitores, nesta quarta-feira, edições especiais sobre as enchentes e deslizamentos que atingem milhares de famílias na região metropolitana da capital.

Com uma novidade: os dois jornalões começam a questionar a competência do prefeito de São Paulo e do governador do Estado.
 
Segundo a Folha, o governador Geraldo Alckmin promete obras para o próximo verão e joga a culpa no colo de seu antecessor, José Serra. O jornal lembra que seu partido está há 16 anos no comando do Estado e que o próprio Alckmin, em mandato anterior, realizou uma obra bilionária de rebaixamento da calha do rio Tietê, com a promessa de acabar com as enchentes.

“O que deu errado?” questiona a manchete no caderno Cotidiano, da Folha, acrescentando a resposta: “faltou alerta” para fechar as ruas alagadas e “faltou fiscalização” para evitar a ocupação de morros e outras áreas instáveis.

Um jornalismo cheio de dedos impede que se declare a verdade: faltaram competência e sensibilidade.
 
Para se ter uma idéia de como os problemas são vistos com olhos diferentes conforme os personagens envolvidos, basta lembrar que, por muito menos, os jornais ainda tascam nas manchetes a expressão “caos aéreo” a cada atraso de vôo em algum aeroporto brasileiro.

A imprensa adotou a expressão após o acidente com o Boeing 737 da Gol, que se chocou em pleno vôo com um jato executivo Embraer Legacy, em 29 de setembro de 2006.

O afastamento de oito controladores de vôo para investigações deflagrou naquela ocasião uma “operação padrão” em aeroportos de todo o país, causando sucessivos atrasos e cancelamentos.
 
O caderno do Estadão também cobra a responsabilidade do governador e do prefeito, lembrando que os locais alagados são conhecidos há 24 anos, relata os dramas de muitas famílias e diz que as verbas para canalizações de córregos foram reduzidas.

A situação é descrita como caótica, mas em nenhum momento os jornais abrem manchetes sobre o “caos urbano”.

Caos deve ser apenas o aéreo, e conforme quem esteja no governo, é claro.
 
O debate engavetado

Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:

– Na semana passada, nos primeiros dias úteis de trabalho da equipe da presidente Dilma Rousseff, ao lado da cobertura da posse dos novos ministros, do noticiário sobre a política cambial, dos esperneios do PMDB na composição do segundo escalão do governo e das discussões sobre o novo valor do salário mínimo, o assunto da hora foi a entrevista do novo ministro das Comunicações Paulo Bernardo à repórter Elvira Lobato, da Folha de S.Paulo.

A matéria ganhou manchete na edição de sexta-feira do jornal. Nela o ministro afirma ser contrário à presença de políticos com mandato no controle de emissoras de rádio e TV. E foi por aí que a Folha puxou a chamada principal de primeira página daquele dia.

O assunto não é exatamente novo, pelo menos neste Observatório. Ainda em outubro de 2005, com base em pesquisa coordenada pelo professor Venício Lima, o Instituto Projor – entidade mantenedora do Observatório – protocolou uma representação junto à Procuradoria Geral da República solicitando medidas judiciais e extrajudiciais contra a promiscuidade do sistema de concessão de canais de radiodifusão a parlamentares. Muitos desses deputados e senadores já à época integravam as comissões das duas Casas encarregadas de renovar e homologar novas concessões. Conflito de interesses é o nome da coisa.

Ao investir contra esse descalabro, o ministro Paulo Bernardo emitiu um sinal importante sobre a agenda a que se propõe no ministério. O que se espera é que essa iniciativa, de todo meritória, não relegue a plano secundário a proposta de regulação da mídia – sobretudo da radiodifusão – gestada na Secretaria de Comunicação Social do governo passado. Não se tem detalhes sobre o teor do documento preparado pelo então ministro Franklin Martins e encaminhado ao novo governo. Esta, sim, é a discussão urgente. E necessária.