Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Comparação despropositada
>>Palocci, o sobrevivente

Comparação despropositada


Depois do presidente Lula, do ex-ministro Dirceu, da direção do PT, da professora Marilena Chauí e do presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, no fim de semana natalino coube à ministra Dilma Rousseff culpar a imprensa pela crise de corrupção que envolveu o governo e o PT.


A ministra Dilma usou o recurso inaceitável de comparar favoravelmente a Justiça da ditadura militar com o trabalho da CPI dos Correios.


No Globo de hoje, o presidente da CPI, senador Delcídio Amaral, reafirma o compromisso de chegar aos mandantes dos esquemas de corrupção.


Palocci, o sobrevivente


O episódio mais intrigante da crise de corrupção deste ano foi a salvação do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e, até aqui, da política econômica que ele encarna.


Na segunda quinzena de novembro o ministro chegou a ser dado como fora do governo. Até agora não saiu uma só reportagem que explicasse como Palocci evitou a degola. A grande imprensa levou um baile na previsão da iminente queda de Palocci. Talvez por não ter entendido tudo o que estava em jogo no episódio.



Conflitos numéricos


O Ministério da Reforma Agrária e o Movimento dos Sem-Terra brigaram na semana passada em torno do número de assentamentos realizados no governo Lula. A disputa se polariza em torno de estatísticas, mas o assunto é complexo demais e não deveria ser tratado na base da propaganda e da contra-propaganda. Para ter uma linha própria de abordagem, a mídia precisa dedicar tempo e atenção. É mais fácil receber na redação material com o tiroteio promovido pelos dois lados e publicá-lo. O leitor que decida quem tem razão.


IBGE, o campeão


Seria instrutivo mapear todas as fontes de pesquisas usadas pela grande imprensa brasileira ao longo de 2005. O trabalho ficaria mais ambicioso caso se pudesse avaliar como o material recebido foi tratado nas redações.


O maior fornecedor de informações de boa qualidade à mídia brasileira é o IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O IBGE faz pesquisas conjunturais, como a Pesquisa Mensal de Emprego, ou a Pesquisa Trimestral do Abate de Animais, por exemplo, e pesquisas ditas estruturais, como o Censo Demográfico, de dez em dez anos, ou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Pnad, que é anual.


Em 2005, o IBGE divulgou quase 170 pesquisas, mais de três a cada quatro dias úteis. Isso gerou uma massa de noticiário cujo balanço será feito pela instituição nos primeiros dias de janeiro. O que já se sabe é que o site do IBGE foi consultado por 9,5 milhões de usuários no ano que está terminando.



Sínteses mais difíceis


O repórter da TV Globo Edney Silvestre publicou em novembro o livro Contestadores, que reúne entrevistas com pessoas notáveis, como Norman Mailer, Noam Chomsky, Camille Paglia e Salman Rushdie, feitas durante o período em que ele foi correspondente da emissora em Nova York. Edney Silvestre diz que hoje é mais difícil obter entrevistas desse calibre, com pessoas capazes de fazer uma síntese dos tempos correntes.


Edney:


– Havia, por exemplo, a presença do Paulo Freire. A última entrevista que ele deu foi exatamente a que está incluída no Contestadores. O Paulo Freire criou um método, que alfabetiza adultos em no máximo três meses, que é usado até hoje, e que, caso não tivesse havido aquele ato ignorante, literalmente, dos militares, caso ele não tivesse sido cassado, hoje nós teríamos um país praticamente sem analfabetos. Seria um outro país. Então, era fácil colocar, por exemplo, o Paulo Freire nessa seleção, porque é uma pessoa que teria mudado o Brasil. Eu não sei quem teria mudado o Brasil, neste momento.


Mauro:


– Outro fato, de ordem política global, complicou a vida dos jornalistas, segundo Edney Silvestre:


– Tornou-se muito mais difícil também entrevistar as pessoas depois do 11 de Setembro, por causa de segurança, mesmo. Antes do 11 de Setembro, Clinton já não era mais presidente, mas eu tinha costurado uma entrevista com ele. Eu tentei durante um bom tempo, o Clinton. Com o 11 de Setembro, acabou. As chances passaram a ser as menores. Ele, Giuliani, enfim, todo mundo se tornou muito mais difícil.


Mídia e polícia


Está na hora de se fazer um amplo balanço da atividade da Polícia Federal. O ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, elogia o trabalho da corporação, que funcionalmente lhe é subordinada. A PF apareceu muito na mídia em 2005, em operações espalhafatosas, mas pouco em análises sérias. Será que a mídia tem isenção suficiente para traçar o retrato dessa sua grande colaboradora?