Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Desviando o debate
>>A virtualidade e a guerra em Gaza

Desviando o debate

Três meses depois da eclosão da crise financeira internacional, o Estado de S.Paulo publicou, neste domingo, o primeiro texto que vai exatamente ao ponto central do tema.

Em duas páginas, o artigo traduzido do New York Times traz como título, dividido em dois: ‘O fim do mundo financeiro que conhecemos… e como consertar um mundo quebrado’.

A leitura dessa reportagem exige espírito forte.

Ela relata como o sistema econômico mundial foi incapaz de evitar o crescimento e a implosão da bolha de fraudes e especulações que conduziram as economias do todo o mundo à beira da catástrofe.

O trabalho, de autoria dos jornalistas Michael Lewis e David Einhorn, revela que um executivo financeiro de Boston, Harry Markopolos, passou nove anos tentando alertar as autoridades da Securities and Exchange Comission, a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, sobre os riscos da pirâmide financeira construída por Bernard Madoff, ex-presidente da Bolsa Nasdaq.

O que se conclui do relato é que as autoridades encarregadas de fiscalizar o mercado e proteger os investidores mantiveram os olhos fechados ou simplesmente passaram a defender os predadores.

As revelações são assustadoras, no sentido em que faz a radiografia de um sistema absolutamente caótico, que em algum momento perdeu o sentido e passou a atuar contra os interesses de longo prazo do próprio mercado.

Os altos proventos pagos aos executos dos bancos e corretoras passaram a ser o objetivo perseguido por todo o sistema, em detrimento da economia real.

O que se deve perguntar, neste posto de observação, é: qual foi a contribuição da imprensa para que o processo de degeneração do sistema chegasse ao ponto de ruptura?

Não é preciso um grande esforço de pesquisa para constatar que a imprensa passou a última década registrando recordes e recordes de lucros e incensando os deuses do mercado, fugindo do debate sobre a necessidade de controles externos sobre os fluxos de capital.

Visto de hoje, o sistema parece tão frágil que surpreende o fato de ninguém ter dado importância aos estudos de Harry Markopolos.

Seu relatório de 2005, citado na reportagem do New York Times reproduzida pelo Estadão, revela que o sistema foi tomado pelos especuladores.

Aquilo que a imprensa chama de mercado financeiro é uma imensa fraude.

A virtualidade e a guerra em Gaza

Ouça o comentário de Alberto Dines:

– Ontem, domingo, no portal UOL de notícias travou-se um debate virtual sobre a Batalha de Gaza. Sob o ponto de vista tecnológico é um avanço. O acessador escolhe um dos temas oferecidos, depois escolhe um dos dois participantes e então vê e ouve em português as respectivas opiniões. Pode ficar apenas com um lado e, se quiser, pode comparar as argumentações. Combinação de TV com internet e uma fascinante amostra das imensas possibilidades que se abrem no mundo digital. Mas sob o ponto de vista político e do interesse público, a iniciativa é lamentável. Quem estava ali para defender os pontos de vista das partes em conflito não era um israelense e um palestino. Era um judeu, Ricardo Birkiensztat, representante da Federação Israelita de S. Paulo e Jamile Latif apresentada como representante da Federação das Entidades Palestinas. Ambos brasileiros. Acontece que o conflito no Oriente Médio é um conflito entre o Estado de Israel e os palestinos ou uma parte dos palestinos que defende o Hamas. Há judeus que não apóiam a violenta retaliação israelense e há palestinos que não concordam com os métodos do Hamas. As comunidades árabes e judaicas sempre viveram em paz mesmo quando solidárias com seus correligionários de além-mar. Trazer o conflito para o Brasil é um desserviço à sociedade brasileira, aos valores brasileiros, aos interesses brasileiros. Quem deveria representar as duas facções são seus representantes diplomáticos. Os meios de comunicação podem desempenhar um papel crucial em conflitos internacionais, a mídia pode aumentar ressentimentos e pode atenuá-los. A virtualidade oferecida pelo UOL nos arrasta para dentro de uma guerra real.