Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

>>Existe mídia independente?

Existe mídia independente?

O Observatório da Imprensa no Rádio entrevista hoje a jornalista Luiza Caires, que é mestranda da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.


Ela estuda o Centro de Mídia Independente, CMI Brasil. O centro faz parte da rede internacional Indy Media, que existe desde 1999.


O CMI Brasil tem um site de publicação aberta, que permite que qualquer pessoa possa contribuir com conteúdos informativos, e também produz jornais, vídeos e rádio. O centro trabalha pela democratização da comunicação e articula textos políticos, em especial a cobertura sobre movimentos sociais.


Nessa entrevista, Luiza fala da importância do estudo do jornalismo alternativo e das formas de participação das pessoas no CMI.

Luciano Martins – Por que você escolheu o Centro de Mídia Independente como objeto?

Luiza Caires – Já tem algumas pesquisas sobre o Centro de Mídia Independente, só que não são muitas. É difícil você encontrar. E quando você pega em internet, fica mais difícil ainda. Talvez por um preconceito, de não se reconheça que o CMI pratique realmente jornalismo – porque não é uma iniciativa profissional, é uma coisa voluntária, colaborativa. Mas eu acho muito interessante, na medida em que, na minha avaliação, é a mídia principal dos movimentos sociais hoje.


LM – O que você tem constatado com relação à participação de pessoas comuns no CMI? Eles têm um sistema de moderação do material postado, não têm?


LC – A participação é bastante variada. A gente percebe que é um público que conhece a iniciativa do CMI, sabe por que é que está ali, que é um site voltado para as questões sociais, para essas lutas. E tem muita gente que, na verdade, não tem muito interesse por conhecer mais a proposta do site, na parte de publicação livre, e acaba colocando textos que às vezes não têm tanto a ver. O pessoal faz uma moderação, mas é uma moderação bem livre: eles só removem para uma outra seção, que é uma seção que se chama ‘Arquivos Escondidos’, mas na verdade eles ficam ali. Coisas que firam mesmo a política editorial, como coisas racistas, neonazistas. Mas, às vezes, textos opinativos, que, na minha opinião, simplesmente não contribuem tanto para a proposta que o CMI quer trazer, continuam ali. Tem muita coisa boa também. O cerne mesmo da proposta do CMI está ali nos editoriais e eles não são produzidos só por organizadores do CMI; são produzidos pelas pessoas comuns também, só que têm uma moderação maior. Eles alçam àquele local de maior destaque coisas que julgam que são mais importantes, ou questões que aconteceram, coisas com características mais jornalísticas também.

O Observatório da Imprensa segue conversando com a acadêmica da USP Luiza Caires, que está realizando uma pesquisa sobre a mídia alternativa e independente no Brasil.

LM – No que o CMI difere positivamente de outras alternativas de mídia colaborativa na internet? Por que é importante esse caráter de ser um centro de mídia alternativa, efetivamente?

LC – O CMI é independente. Você pode até colocar várias críticas – não estou atuando aqui como uma participante -, mas ainda é uma coisa bem independente. Porque, por exemplo, em relação a financiamento, que foi uma questão colocada na apresentação do trabalho, não tem financiamento mesmo. Teve até uma época em que eles tiveram uma proposta da Fundação Ford, que queria doar um dinheiro até alto para a Rede CMI global, como um todo. Fizeram uma discussão e chegaram à conclusão de que: não, eles não podiam aceitar aquele dinheiro, que é contra tudo o que eles estão falando ali. Então acho que comparando com as outras mídias colaborativas, o que tem de diferencial ali é a temática. Porque a gente pega alguns sites de cultura, como o Overmundo, sites que falam de tecnologia, como o Slashdot, e você chama de jornalismo cidadão só porque são pessoas comuns fazendo. Mas em relação à cidadania… no que é que aquilo está sendo útil para a promoção da cidadania? Não sei. Não desmerecendo, dentro do seu nicho, aquelas iniciativas, mas falando de cidadania mesmo, eu acho que o CMI e a Rede Indy Media ainda é a mais importante.

LM – Qual é o perfil do público que participa do CMI?

LC – As pessoas que fazem uso livre, uma coisa que chama atenção é que é um público muito masculino. Mais de 80% é homem. São pessoas com nível universitário. Isso chama atenção também, porque, apesar de estarem falando de lutas sociais e geralmente se referirem a um público desfavorecido economicamente e culturalmente, quem acaba usando mesmo são essas pessoas. Em relação a esse nível educacional, é uma característica dos movimentos sociais contemporâneos. Já foi diagnosticado por outros pesquisadores de movimentos sociais que são, geralmente, jovens urbanos, de classe média, com nível universitário, que participam desses movimentos.

LM – Muito obrigado, Luiza.


O Observatório da Imprensa conversou hoje com Luiza Caires, acadêmica da USP que está realizando um trabalho sobre o Centro de Mídia Independente no Brasil.