Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Governismo indigesto
>>Fisiologismo compulsório

Governismo indigesto


Dá nos nervos ouvir discursos moralizadores de personagens que passaram décadas servindo-se do Estado para propósitos particulares. Mas é difícil recordar, desde o início da crise de corrupção que marcou o ano, declarações de políticos governistas com as quais se pudesse concordar. Provocam uma reação da mídia, que, explícita ou tacitamente, transmite sua irritação ao cidadão comum.


Ontem o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia, declarou ao Jornal Nacional que toda a culpa pelos resultados até aqui nulos da convocação extraordinária do Congresso cabe à oposição. Depois o PT diz que existe um complô da mídia contra o governo.


São exceções no PT, entre outros, e devem ser mencionados, o senador Eduardo Suplicy e os deputados José Eduardo Martins Cardoso e Paulo Delgado.


Encomendas antigas


Nesta sexta-feira, 30 de dezembro, o ano calendário de denúncias termina com novas acusações de corrupção nos Correios. A notícia serve como duplo lembrete: o primeiro personagem da crise do “mensalão” foi um funcionário dos Correios, Maurício Marinho. E os problemas na estatal não começaram no governo Lula.



O avesso dos Fundos


Notas publicadas nos últimos dias prenunciam que um dos focos de atenção das investigações parlamentares na retomada dos trabalhos do Congresso, dentro de três semanas, serão irregularidades nos fundos de pensão. A crise não vai tirar férias. Ainda mais em ano eleitoral.


Fisiologismo compulsório


O Alberto Dines extrai da peregrinação do deputado Osmar Serraglio em busca de verbas conclusões sobre o sistema representativo brasileiro.


Dines:


– A notícia saiu nos jornais de ontem, quinta, lá nos confins do noticiário político. O que torna o episódio ainda mais aberrante. O deputado Osmar Serraglio, do PMDB paranaense e relator da CPI dos Correios, teve que interromper as investigações sobre o mensalão e as origens do valerioduto para ir ao Palácio do Planalto em busca de um padrinho capaz de garantir suas emendas ao Orçamento da União no valor de três milhões e meio de reais a que todo parlamentar tem direito. O relator da CPI do Mensalão é uma das agradáveis surpresas nesta temporada com tantas decepções políticas e humanas. Desempenha a sua função com notável discrição e diligência. Na sede do Executivo só conseguiu ser recebido por um funcionário do terceiro escalão. Fácil imaginar as razões da descortesia. Mas o que surpreende é este sistema humilhante imposto a todos os congressistas. Não importa a sua competência, dedicação, honestidade e rigor. Se o deputado não fizer creches, escolas, quadras esportivas ou ajudar entidades filantrópicas do seu curral eleitoral não será eleito. Em outras palavras, o sistema vigente não premia a competência parlamentar, apenas garante verba para a compra de votos com recursos públicos. É incrível, Mauro: se a CPI dos Correios cumprir o que está prometendo, Osmar Serraglio não precisa de verbas do Executivo, pode ser campeão de votos, ir para o Senado ou até mesmo para o governo do Estado. Isso numa democracia plena e numa república decente. Aqui, não.


O São Francisco esquecido


Um dos grandes temas negligenciados pela imprensa em 2005 foi o projeto de transposição das águas do São Francisco. Houve algum noticiário, atrasado, na época da greve de fome do bispo Dom Luiz Flávio Cappio, mas depois ninguém se preocupou em saber como está a preparação para o início das obras. E ainda não houve na mídia um debate que esclarecesse mais o assunto.


Ano Novo


A maioria das pessoas espera do novo ano boas notícias. Bons jornalistas esperam notícias bem apuradas e bem editadas. Mas a mídia prefere as más notícias, como mostra hoje no Estadão o pesquisador Andrew Mack. Ele diz que o número de conflitos armados cai desde o final da Guerra Fria, mas a percepção da opinião pública vai na direção oposta. Mack explica que “a mídia global dá muito mais cobertura às guerras que começam do que aos conflitos que terminam silenciosamente”.


Com mais ou menos guerras, haverá problemas em 2006. Para enfrentá-los, o primeiro passo é conhecê-los. Sem mídia livre e competente, isso não é possível.


Bom Ano Novo para todos.