Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

>>Entrevista: conversa com um mestre do jornalismo

Entrevista: conversa com um mestre do jornalismo

Seguimos hoje dedicando o programa à entrevista com Matias Molina, autor do livro Os Melhores Jornais do Mundo.

Luciano Martins: – Molina, qual seria sua definição da qualidade da imprensa em cada uma das mídias? A notícia de impacto, a análise ou o que é que define essa qualidade?

Matias Molina: – O que está havendo é que talvez, na mídia, haja menos reflexão do que havia antes. E a reflexão quem proporciona, principalmente, é  à mídia impressa, os jornais diários impressos. A televisão é um bom meio, ela tem um impacto imediato, mas não permite a reflexão e não permite, por exemplo, a apresentação de questões complexas. O jornal impresso e a revistas, mas o jornal diário, por causa da peridiocidade, que tem um impacto grande, é o grande meio para a reflexão.

Luciano Martins: – Molina, vamos falar um pouco do futuro. Apesar de tudo, você parece otimista na sua análise da imprensa, a chamada imprensa que importa.

Matias Molina: – Bom, eu acho que a sociedade precisa de informação e análise, e quem tem feito esse papel tem sido a imprensa escrita, os jornais que menciono, jornais de elite. Acho que isso vai continuar – talvez de maneira um pouco diferente, mas vai continuar.

Vou lhe contar um exemplo da revista The Economist. O editor da Economist saiu, ficou uns doze anos, é o Bill Emmott, o anterior, e quando saiu, o jornalista do Guardian perguntou como explicava como uma revista como a Economist conseguiu dobrar circulação, no período em que ele foi editor chefe, quando os jornais de qualidade estavam com problema de circulação e problema de negócios. E ele deu uma resposta muito interessante. Disse: ‘Na nossa visão, no mundo inteiro, cada vez há mais pessoas com curso superior, com pós-graduação que para sua profissão precisam estar bem informados e ter uma visão clara do mundo e de análise. Nós nos dedicamos a dar informação e sobretudo análise para essas pessoas. Muitos jornais que eram de qualidade foram na tendência contrária. Foram prover mais entretenimento às pessoas: fotografias maiores, títulos maiores e menos análise, achando que com isso atrairiam o leitor. Essa não é a nossa visão. Nossa visão é a contrária, tanto assim que a Economist hoje tem uma circulação de um milhão e trezentos mil exemplares por semana; é uma circulação paga e muito bem paga, pois a assinatura é cara, faz questão de te cobrar a qualidade que ele te oferece’.

Acho que esse exemplo ajuda a entender um pouco a perspectiva para um imprensa séria que se dedica a respeitar o interesse do leitor e a fornecer informações e análises para seu leitor. É claro que, no mundo inteiro, em todos os países, há uma elite no país. Uma elite na área pública, um elite na área privada, dos negócios, da cultura, universidade, que precisa dessa confirmação.

Acho que sempre haverá uma maneira do jornal impresso ou pela internet, ou ambos, para fornecer essa informação, porque há demanda para isso.

Luciano Martins: – Molina, eu gostaria agora que você falasse sobre as novas pautas do jornalismo econômico. Existe agora uma cobrança muito maior em relação à questão da sustentabilidade, à questão da eficiência energética, ambiental e social das empresas. E o jornalismo econômico não parece ainda sensibilizado para o estado do mundo. Existe a possibilidade ou não vai fazer parte do mundo do jornalismo econômico essa preocupação nunca?

Matias Molina: – Eu acho que vai fazer parte sim e já começou a fazer parte. Talvez alguns jornais não tenham percebido a velocidade com que mudou o mundo dos negócios e há, em alguns casos, uma preocupação grande em cobrir aspectos como a produção e menos o ambiente dos negócios. Ou de cobrir as personalidades dos negócios e não de cobrir os efeitos dos negócios.

Mas eu acho que a tendência é os jornais perceberem isso. Alguns  deles podem não ir com a velocidade que seria necessária ou adequada. O grande salto que houve no mercado de capitais, com a criação do novo mercado das bolsas, que é um dos grandes fatores para as mudanças dos negócios feitos aqui, a exigência de mais transparência nas empresas, que obriga, como você disse, a uma renovação da cobertura dos jornais e dos negócios nos jornais, que está acontecendo, mas que ainda demora um pouco mais para ser verdade.

Luciano Martins: – Você é otimista. Qual a capacidade que os jornais têm de se renovar diante desses desafios e seguir em frente no século XXI?

Matias Molina: – Potencialmente, há essa capacidade. O que tem que ver é se as empresas estão dispostas a investir nisto. Elas sofreram muito no começo desta década, tiveram que fazer grandes cortes de custos; a situação econômica está mudando agora. No ano passado, o crescimento do número de negócios de jornais foi bastante sensível, significativo. O que temos que ver agora é se essas empresas estão dispostas também a realocar alguns desses recursos para aumentar a qualidade dos jornais – que caiu bastante com a crise econômica. E temos que ver se eles têm a visão de melhorar a qualidade. Porque é o fator mais importante de sua sobrevivência a longo prazo. Se um dia o jornal não se tornar indispensável ao leitor, ele não vai ler.

Luciano Martins: – Muito obrigado, Molina. Essa foi a parte final da nossa conversa com Matias Molina, o autor do livro Os melhores Jornais do Mundo, uma visão da imprensa internacional, uma publicação do jornal Valor Econômico – através da editora Globo e em parceria com a Companhia da Notícia.