Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Mídia, janela aberta
>>A medida da relevância

Mídia, janela aberta


Como em outros momentos da crise do “mensalão”, o noticiário se desdobra em múltiplas frentes. O governo manobra para reduzir danos políticos que possam advir do trabalho das CPIs do Congresso Nacional, mas essa linha de defesa se mostra frágil diante do surgimento constante de novos fatos. A mídia desempenha um papel decisivo no processo. É a janela por onde passam denúncias como a da ex-assessora financeira do PT em Londrina, Soraya Garcia, dispensada ontem de depor na CPI dos Correios. Soraya relaciona uma visita do deputado José Dirceu à cidade com o surgimento de 300 mil reais no caixa do partido.


A imprensa comete erros, mas ao longo da crise tem sido cautelosa. Para entender melhor isso basta comparar com o que diziam os jornais há 50 anos neste 10 de novembro, véspera do antigolpe do general Henrique Lott a favor da democracia.


Economia na linha de fogo


Pela primeira vez o maior alicerce do governo Lula, a estabilidade macroeconômica, corre risco sério. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, aparece no noticiário bombardeado por denúncias relacionadas com sua passagem pela prefeitura de Ribeirão Preto, para não mencionar fundos da campanha de Lula em 2002.


Hoje está previsto o depoimento na CPI dos Bingos de Vladimir Poleto, ex-diretor da Contadoria Geral da Fazenda de Ribeirão Preto. Ele teria sido o protagonista da suposta remessa de dólares voadores cubanos para o PT. Mas o fogo pesado contra Palocci partiu da ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, que fulminou em entrevista ao Estado de S. Paulo, ontem, a política econômica do governo. Dilma não se retratou e o presidente Lula não a desautorizou.


Para ficar bem claro: quem mais preza a estabilidade da economia é o povão. Os outros sobrevivem melhor nas crises.



A medida da relevância


O Alberto Dines explica que não é o ibope que mede a relevância de um programa de televisão como a entrevista dada pelo presidente Lula no Roda Viva da TV Cultura.


Dines:


– Mauro, na terça-feira foi a Folha, ontem foi o Globo que comentou o ibope da entrevista do presidente Lula no Roda Viva. A Folha informou que no segundo bloco o programa alcançou 3,1 pontos da audiência, segundo o Globo, o índice variou entre dois pontos e dois ponto nove. Ambos reconheceram que houve um salto mas ambos procuraram minimizar o feito e deram a entender que este salto é inexpressivo se comparado com os índices obtidos pela TV comercial.


Mas onde está escrito que as televisões públicas devem curvar-se reverentemente às medições e parâmetros da televisão privada? Qualquer que tenha sido o ibope da entrevista do Roda Viva, é preciso reconhecer que o país parou para ouvir o programa. O país que decide, o país político, o país que importa, este queria ouvir o presidente Lula. Nenhuma entrevista desde a sua posse teve tanta repercussão e ela não foi levada ao ar pela Globo, SBT ou pela Band. Parte desta repercussão deve-se à credibilidade de um programa que está há 19 anos no ar e também à credibilidade de uma emissora de TV que não se sujeitaria a combinações prévias com o entrevistado ou seus assessores. O Roda Viva lavrou um tento e ele não pode ser medido pelos paradigmas que medem telenovelas ou baixarias.


Polícia midiática


A Folha de S. Paulo chama a atenção em editorial, hoje, para o contraste entre a coreografia midiática espetacular da Polícia Federal e a realidade de seus meios precários. A Polícia Federal não consegue nem guardar dinheiro e drogas apreendidos. Mas para as câmeras de TV exibe uniformes nos trinques e armas vistosas.


A crise do The New York Times


A repórter Judith Miller, que passou quase três meses presa para não revelar fontes de informação, decidiu deixar o The New York Times. Questiona-se a maneira como Judith alimentou o noticiário que precedeu a invasão do Iraque. E como seus editores deixaram de fazer uma checagem rigorosa. O jornal mais prestigioso do mundo ainda vai percorrer um longo caminho até reencontrar-se com os padrões que fizeram sua glória. E não há garantia de que o faça.


Rebeldes sem discurso


O professor Demétrio Magnoli faz hoje uma advertência pertinente em artigo na Folha de S. Paulo. Os jovens que incendeiam e depredam na França não apresentaram ainda um discurso político próprio, diz Magnoli. E talvez nem o façam. Até aqui, tudo o que se ouve deles são manifestações de inconformismo com a notória exclusão social. Na falta de discurso, há analistas que produzem um, e em face dele montam seu próprio discurso. Isso joga água na corrente do maniqueísmo. No Ocidente cristão, contra os amotinados. No mundo árabe, não se sabe, porque não há por aqui noticiário sobre a maneira como o assunto é tratado lá.