Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

>>Padrões de elite
>>Américas do Sul

Toma-lá-dá-cá


Há hoje no Globo um bom material sobre doações de campanha. Cientistas políticos dizem que está tudo dentro das boas práticas. Claro, se comparado com doações como as do traficante Pablo Escobar, na Colômbia dos anos 80, é tranqüilo. Mas a lenga-lenga não deve tirar de foco o toma-lá-dá-cá das campanhas. Por sinal, assinalado por outros ouvidos pelo Globo.


Padrões de elite


Já existe um padrão de criminalidade de integrantes das elites brasileiras. Preso empresário que mandou matar auditor fiscal da Receita. Deputado eleito, advogado de grande banca, vai para a cadeia em Minas Gerais. Pai e filho acusados de traficar drogas são presos em condomínio de luxo no Rio. Fazendeiro que mandou matar fiscais do Trabalho vai aguardar o processo em liberdade. Notícias sobre trabalho escravo no ferro-gusa correm mundo. PMs trabalham como vigilantes de madeireiras irregulares no Pará. As notícias são dadas. Mas faltam reportagens que descrevam melhor o fenômeno. Fácil é associar pobreza a criminalidade e violência.


Américas do Sul


O professor da Uerj Antonio Carlos Peixoto, coordenador de Relações Internacionais do governo do estado do Rio de Janeiro, adverte que a cobertura jornalística do momento político na América do Sul deve fugir das generalizações que deixam escapar a especificidade de cada processo político nacional.


Antonio Carlos:


– O que está me parecendo é que quando a imprensa utiliza a expressão extremamente genérica “Há um deslocamento para a esquerda na América do Sul”, esta expressão encobre realidades que são extremamente diferenciadas. E isto tem a sua importância, porque essas diferenças é que, em última análise, vão poder determinar a dinâmica do processo político nos diferentes países em que esse deslocamento teria ocorrido ou efetivamente ocorreu. Não se pode confundir o caso de eleições nas quais um dos partidos do sistema partidário tradicional chega ao poder com casos como o de movimentos indigenistas na Bolívia, ou de um candidato que aparece com uma legenda de última hora, mas que, apesar disso, obtem uma maioria extremamente expressiva dos votos, como aconteceu no domingo passado no Equador. Ou, ainda, o caso da eleição peruana, onde um partido tradicional, com um candidato que já foi presidente do Peru, chega ao poder, derrotando uma coligação também armada na última hora, mas que conseguiu captar os votos das camadas populares e de uma parte dos movimentos indígenas. E, ainda, não se pode confundir esses dois casos com o que ocorre na Venezuela de Hugo Chávez, onde nós temos um caso de populismo mais tradicional, ou clássico. Ou seja: uma liderança carismática, com forte apoio em movimentos sociais difusos – mas esses movimentos não são etno-sociais – e uma base militar relativamente importante. Isso introduz diferenças que são sensíveis.


Mauro:


– O professor Antonio Carlos Peixoto mostra que há também pontos de identidade entre os diferentes processos.


Antonio Carlos:


– Basta ver o seguinte: Evo Morales convocou uma assembléia constituinte, como Chávez convocou também, no início de seu governo, e Rafael Corrêa agora está falando também na convocação de uma assembléia constituinte.


Leia aqui a entrevista completa de Antonio Carlos Peixoto.


Demagogia e cinismo


Na Venezuela, enquanto a sensação de crescimento da corrupção se generaliza, o canal estatal Venezoelana de Televisión deu 87 horas para o presidente Hugo Chávez e menos de duas horas para seu opositor nas eleições de domingo, Manuel Rosales. Nas TVs privadas, o inverso, embora em proporção mais discreta: Rosales teve 15 horas e meia e Chávez, pouco mais de dez horas. O candidato da oposição abriu inscrições para um hipotético cartão de crédito chamado “Mi Negra”. A negra é o petróleo. Demagogia de alta octanagem. Então, fica combinado assim: todos tentam se locupletar e o cinismo avança.


Que cultura é essa?


Muito mal explicado o conceito de cultura da pesquisa do IBGE divulgada ontem sobre o gasto no setor como proporção do PIB. No Jornal Nacional, as imagens mostravam aparelhos de televisão. Quanto disso é cultura e quanto é entretenimento ou baixaria? E quanto é jornalismo? Jornalismo é informação ou cultura? Informação é cultura? Para ilustrar os gastos da população negra, a Globo fez reportagem num curso de informática. Então, trata-se de um conceito de cultura bem amplo, que inclui a instrução e as técnicas, além do lazer, etc. No Globo de hoje aparecem itens como compra de brinquedos, aluguel de salão de festas e pesque-pague. Como dizia Bussunda e repete Ancelmo Gois: Fala sério!