Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

>>Jornalismo bandido
>>Jornalismo de férias

Jornalismo bandido

A Folha de S.Paulo noticia nesta segunda-feira, mas o Jornal do Brasil (online), alguns portais de informação e emissoras de TV já haviam relatado o caso da jornalista presa por ligações com criminosos no Paraná.

Segundo o noticiário, a repórter Maritânia Forlin, que trabalha para uma afiliada da Rede Record em Campo Mourão, transmitia avisos sobre operações policiais para um traficante em troca de informações privilegiadas sobre crimes.
 
Não é o primeiro nem será o último caso, e o mais bizarro de todos certamente é aquele que envolveu um apresentador de televisão de Manaus e um grupo de extermínio da Polícia Militar do Amazonas.

Mas o episódio pode servir como ponto de partida para uma conversa sobre limites do jornalismo.

Até que ponto deve ir um repórter na busca da informação?

Que critérios um editor deve estabelecer para aceitar como fontes personagens envolvidos em crimes?

E o que dizer dos inquéritos policiais montados em ambientes suspeitos de corrupção?
 
A polícia do Paraná exibe gravações de conversas que teriam sido mantidas por Maritânia Forlin com um traficante, e numa delas a jornalista é avisada de que vai haver um homicídio.

Segundo o noticiário, esse criminoso, com quem ela teria um relacionamento amoroso, funcionaria como um produtor ou pauteiro de suas reportagens.

Não se sabe ainda quanto do material publicado sobre essa história é confiável, uma vez que todos os envolvidos, inclusive os jornalistas que noticiam o caso, têm como fonte primária vazamentos de informação e não a reportagem investigativa.
 
Para além dos mais básicos princípios do exercício profissional, que a repórter teria desrespeitado, fica no ar a sensação de que alguma coisa vai mal por aí.

Num cenário de alta competição, o trabalho jornalístico há muito tempo se transformou num vale-tudo.

Picuinhas na política, adivinhações na economia e press-releases no jornalismo de negócio competem com o voyerismo da vida privada de celebridades de todos os tipos.

Há quem diga que o capital do jornalista é a informação. Está errado. É a ética.

Jornalismo de férias

Alberto Dines:

– Um indício de que o presidente Barack Obama deixou de ser o queridinho da nossa mídia pode ser encontrado no pífio noticiário dos jornalões de ontem sobre o atentado terrorista no Arizona contra a deputada democrata Gabrielle Giffords. O fato aconteceu em Tucson às 10 da manhã de sábado, 15 horas em Brasília. Havia tempo de sobra para avaliar aquele monte de informações que a mídia americana disponibiliza em minutos. Os exemplares distribuídos pela Folha e Estadão aos seus assinantes em S. Paulo – aqueles que supostamente devem ser agraciados com um produto mais qualificado – continham uma precária cobertura.

A Folha ainda conseguiu enfiar uma chamadinha na parte inferior da capa, o Estadão nem isso.  Aos assinantes paulistanos O Globo nada ofereceu e aos cariocas – sua praia – um modesto destaque abaixo da dobra. Se fosse um atentado contra algum líder direitista do Tea Party a cobertura teria sido histérica.

A deputada Gabrielle Giffords sobreviveu à bala que atravessou o seu crânio, defende o revolucionário programa de saúde de Obama, é a favor do aborto e contra os super-poderes que o Arizona quer dar aos seus policiais. Por isto estava na lista negra do grupo ultraconservador liderado por Sarah Palin. O jovem que planejou e executou o atentado matou seis pessoas, três delas ligadas à parlamentar. Era leitor do Mein Kampf de Adolf Hitler, a deputada é judia, o assassino a conhecia muito bem.

O Arizona adotou há pouco uma draconiana legislação de cunho racista para punir os imigrantes ilegais vindos do México e o clima político no estado radicalizou-se. O atentado terá profundas implicações na vida política americana já que hoje começaria a ofensiva dos republicanos para derrotar Obama no Congresso. A mídia brasileira esqueceu o seu fascínio inicial por Obama e passou a ecoar as críticas contra o “socialismo” do primeiro negro a ocupar a Casa Branca.

Ideologias à parte, a verdade é que mais uma vez se comprova que os nossos diários saem setes vezes por semana, mas só podem ser considerados informativos de terça a sábado. Convém lembrar que a edição latino-americana do espanhol El País impressa em S. Paulo destacou o atentado em manchete de primeira página e lhe dedicou duas páginas inteiras. O jornal é feito em Madri cujo fuso horário, ao contrário do brasileiro, rouba-lhe três horas.