Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Liberdade sem ranking
>>As vítimas

Legalismos
 
O Brasil é o país do legalismo estéril. Sobram leis contra o crime, mas falta quem as faça cumprir. E existe o legalismo cínico, como o da indústria de cerveja e do setor de publicidade. Não discutem se o país precisa conter os estragos do álcool, mas se as medidas para isso são ou não juridicamente perfeitas.


Liberdade sem ranking
 
Alberto Dines questiona métodos usados para medir o grau de liberdade de imprensa no mundo.
 
Dines:
 
– Discutir a liberdade é sempre bom, discutir a liberdade de imprensa é ainda melhor porque ela é a mãe de todas as liberdades. Sem uma imprensa verdadeiramente livre não existe liberdade política, religiosa, moral ou econômica. Hoje, no Dia Internacional da Liberdade de Imprensa criado pela Unesco circulam diversos relatórios sobre o estado da mídia no mundo, acompanhados pelos indefectíveis rankings classificatórios. Ora, a quantificação de valores abstratos não pode produzir conclusões exatas. Veja-se, como exemplo, um ranking que ontem circulou pela Internet preparado pela Freedom House, entidade não-governamental sediada em Washington, criada em 1941 para combater o nazismo. Seu ranking de liberdade de imprensa é naturalmente liderado por países como a Finlândia e a Islândia, Portugal aparece surpreendentemente em décimo segundo lugar. E o Brasil? O Brasil aparece na nonagésima, repito, nonagésima colocação. As duas posições são injustas e enganosas: nem Portugal é o paraíso nem o Brasil é o inferno. Nossa imprensa andou muito ameaçada nos dois últimos anos e soube reagir com alguma galhardia, o regime decididamente não merece ficar abaixo de Moçambique e Cabo Verde. A democracia é um processo em construção. A liberdade, ou existe ou não existe. Se existe, avança sempre.
 
Mauro:
 
– O PT voltou a pedir, pela palavra do deputado federal Carlos Zaratini, de São Paulo, censura dos jornais em período eleitoral. Zaratini diz que rádios, concessões públicas, devem manter equilíbrio, como já fazem emissoras de televisão, o que é correto. Mas jornais não são concessões públicas.


As vítimas
 
O Jornal Nacional, como os demais telejornais da Globo, decidiu ontem ignorar as denúncias da Anistia Internacional a respeito da atuação das polícias no Brasil, em especial a polícia do Rio de Janeiro. Foi a manchete do Globo de ontem, quarta-feira.


Não se conhece com exatidão a posição doutrinária da Rede Globo sobre o assunto. Pelo tom do noticiário, a Globo apóia, como o jornal O Globo, as invasões militarizadas das favelas, sem jamais questionar o que exatamente a polícia vai fazer nelas. É como se a polícia estivesse integralmente a serviço da sociedade e não, em parte, a serviço de interesses criminosos.


Essa atividade criminosa de integrantes da polícia é uma das causas mais importantes da explosão de violência que existe hoje no Rio e em muitas outras partes do Brasil. E os cidadãos pagam o pato. O laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro constatou que entre 1987 e 2006 morreram na favela da Rocinha mais inocentes em batalhas entre polícia e bandidos do que em tiroteios entre traficantes, informa hoje Ancelmo Gois.


Hipocrisias


Há divergências crescentes nos pronunciamentos do governador Sérgio Cabral Filho e do secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame. O governador fala em guerra, como falaram em guerra todos os seus antecessores nas últimas duas décadas. O secretário valoriza o que classifica como trabalho de inteligência policial.


Cabral defende legalização de drogas, Beltrame criticou ontem certo tipo de hipocrisia, abre aspas: “Eu vejo campanhas e passeatas pela paz. Eu quero ver é passeatas para que as pessoas parem de dar dinheiro ao tráfico, cheirando e fumando”, fecha aspas.


Faltou pedir passeatas contra a corrupção policial, que é um dos nós do problema.


Aritmética


O governo de São Paulo divulgou entre 2004 e 2006, quando era comandado por Geraldo Alckmin, estatísticas falsas sobre o número de assaltos a bancos no estado. O número oficial era inferior ao número real, claro. Onde estava a mídia, incapaz de descobrir a diferença?


Editora aceita censura


O escritor Paulo Coelho está coberto de razão nas críticas que fez a Roberto Carlos, que vai destruir milhares de exemplares de uma biografia sua, e à editora Planeta, que fez acordo na Justiça com Roberto Carlos. A Planeta é a editora de Paulo Coelho. O assunto é grave. Como disse certa vez Jorge Amado, não se trata de uma exceção, mas de um precedente. Muito perigoso.