Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

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Luzes acesas

Os jornais de hoje produzem um anticlímax no cenário de crise que se desenhava desde o início do ano.

A notícia de que o governo federal já tomou providências para evitar o racionamento de energia abafou as declarações de dirigentes oposicionistas, que ensaiavam o coro do ‘apagão’.

A imprensa foi objetiva na medida certa, noticiando as medidas do Executivo e as críticas da oposição, mas se afastou do estilo alarmista que vinha ensaiando desde o começo desta semana.

Até o futuro ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, que finalmente teve sua indicação aceita pelo presidente Lula, mudou o discurso e afastou a tese de um ‘apagão’ iminente.

O que não descarta o bom senso de governo e imprensa estimularem o consumo consciente entre cidadãos, empresas e órgãos públicos.

Edison Lobão é indicado pelo onipresente senador José Sarney e representa a maior ambição do PMDB: controlar o setor de energia e combustíveis.

Deve tomar posse na semana que vem, mas com poderes limitados – os cargos estratégicos do Ministério das Minas e Energia continuarão ocupados por técnicos, sob controle da ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil e principal estrategista do governo.

Esse é exatamente o ponto onde fica incubada uma possível futura crise no governo: na questão da energia, Edison Lobão é influenciado basicamente pelos investidores privados que financiam o Instituto Acende Brasil e defendem o aumento dos investimentos no setor.

Dilma Rousseff também cultiva boas relações com os grandes grupos privados, mas alimenta um leque mais amplo de influências.

A volta da CPMF

Os jornais também surpreendem o leitor com a notícia de que os líderes da bancada de apoio ao governo começam a falar na criação de um substituto para a CPMF – um imposto igualzinho ao quie foi extinto no final do ano passado, mas com uma alíquota de 0,20%.

Como se sabe que em política quase tudo tem por trás um certo conchavo, deduz-se que a oposição não se oporia a essa medida.

Ontem, o PSDB resolveu imitar o partido Democratas e também entrou com recurso na justiça contra o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras, o que reforça a idéia de recompor a extinta Contribuição Provisória sobre Operações Financeiras.

Se a Justiça atender a oposição, é possível que ainda em fevereiro o Brasil assista a volta do imposto do cheque.

Fica, então, difícil para o leitor entender os movimentos da política, principalmente porque, ao dar grande destaque às declarações dos parlamentares, a imprensa acaba dissimulando as intenções por trás das manobras partidárias.

Por enquanto, resta ao cidadão repetir o verso de Vinícius de Moraes: ‘Se foi pra desfazer, por que é que fez?’

A torcida atrapalha

Os jornais brasileiros não comprometeram hoje a cobertura da libertação de Clara Rojas e Consuelo González, que eram reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colombia há mais de cinco anos.

O presidente venezuelano Hugo Chávez teve seus méritos reconhecidos, mas o espetáculo foi menos vistoso do que ele pretendia.

A Folha de S.Paulo, que manteve seus enviados especiais na região, conseguiu um tom diferenciado na reportagem.

No mais, a dependência das agências internacionais submetem a imprensa brasileira àquilo que for distribuido igualmente em todo o mundo.

No caso das prévias eleitorais dos Estados Unidos, por exemplo, todos os jornais embarcaram na interpretação de que a candidata Hillary Clinton virou o jogo por causa de suas lágrimas.

Alberto Dines:

– Não foram as lágrimas derramadas na véspera que deram a vitória a Hillary Clinton em New Hampshire. O adversário, Barack Obama, não cometeu nenhum erro, seguiu a mesma estratégia empregada com sucesso dias antes no Iowa: explorou o seu carisma. Quem errou e errou feio foram os institutos de pesquisa. ‘O eleitorado nos deu uma surra’, disse um especialista em sondagens eleitorais completando em tom de pilhéria ‘a culpa foi dos eleitores’. Fiasco histórico: as pesquisas apontavam uma vitória de Obama por nove pontos e Hillary teve a vantagem de três. O Globo ontem foi o único dos três jornalões a valorizar o erro das previsões. A Folha de S. Paulo que tem um Instituto de Pesquisas, o Datafolha, passou ao largo, falar em vulnerabilidade das previsões não seria de bom tom. O Estadão tocou no ponto central embora sem destaque: o entusiasmo da mídia influenciou os pesquisadores que não levaram em conta que o eleitorado de Obama é jovem e imprevisível. Não é só no Brasil que os jornais e jornalistas torcem em favor de um candidato. O que se viu agora é que esta torcida pode ser ilusória. Em vez de ajudar, prejudica.