Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Mudança de estilo
>>Pacto de suspeitos

Sotaque espanhol


A primeira grande privatização do governo Lula foi manchete nos principais jornais brasileiros.


Seis dos sete trechos de rodovias a serem reformadas e administradas pela iniciativa privada foram arrematados por empresas espanholas.


As reportagens são bastante esclarecedoras, com infográficos e mapas, mas os jornais perderam uma boa chance de delinear o novo perfil da gestão petista neste segundo mandato.


Mudança de estilo


O Estadão publica declaração do presidente Lula, comemorando o resultado e fazendo as costumeiras comparações com o governo do seu antecessor, mas nenhum dos grandes jornais explorou a mudança de rumo petista, que há dez anos comandava uma oposição feroz às privatizações.


O Globo chega mais perto de explicar a mudança.


O jornal carioca publica, no meio de grandes reportagens, um quadro explicativo chamado ‘O fio da meada’.


No caso das privatizações de rodovias, o Globo observa que em janeiro, quando o primeiro leilão foi adiado, o risco-país do Brasil oscilava entre 700 e mil pontos e que agora caiu para menos de 200 pontos.


Isso esclarece, segundo o jornal, porque foi possível fazer um novo modelo de leilão, pelo preço menor do pedágio, o que vai reduzir a taxa de retorno dos investidores.


Foi uma forma de esclarecer os leitores como a redução do risco-país aumenta os investimentos produtivos, porque os investidores aceitam um retorno menor diante de mais segurança.


Correndo da Justiça


A Folha traz uma informação exclusiva, que estava disponível para todos os jornais, mas os concorrentes não consideraram relevante.


Diz o jornal paulista que o presidente e dolis diretores da OHL, a empresa que ficou com cinco dos sete trechos de rodovias, estão sendo investigados pela Justiça espanhola por desvio de 30 milhões de euros, administração fraudulenta e falsificação de documentos.


O presidente da OHL, Juan Miguel Villar Mir, tem nos seus calcanhares ninguém menos do que o juiz Baltasar Garzón, aquele que condenou o falecido ex-ditador chileno Augusto Pinochet.


Um abacaxi para o Supremo


O caso do ex-banqueiro Salvatore Cacciola, condenado no Brasil e preso no Principado de Mônaco, está criando uma grande dor de cabeça para os ministros do Supremo Tribunal Federal.


Na verdade, segundo os jornais de hoje, trata-se de um emaranhado de decisões contraditórias que os ministros precisam desatar para julgar um recurso impetrado por Cacciola.


O Estado de S.Paulo oferece a melhor explicação.


A confusão começou nos últimos dias do segundo governo Fernando Henrique quando foi sancionada uma lei que estabelecia foro privilegiado para ex-autoridades. A lei foi considerada inconstitucional e derrubada pelo Supremo.


No entanto, o mesmo tribunal considerou constitucional, posteriormente, a lei que dava foro privilegiado para o presidente do Banco Central, na decisão que beneficiou Henrique Meirelles.


Tudo zerado


Na época, lembra o Estadão, os ministros não atentaram para a contradição e só ontem o ministro Carlos Alberto Direito, recentemente nomeado, apontou a incoerência.


Resumindo: se o STF considerar que ex-presidentes do Banco Central têm direito a foro privilegiado, o ex-presidente Francisco Lopes, condenado no mesmo escândalo de Salvatore Cacciola, poderia ter sua sentença anulada.


O mesmo aconteceria com Cacciola, que estaria livre para retomar sua boa vida na Itália.


Aqui no Brasil, muita gente que não quer ver o escândalo de 1999 revolvido, está torcendo por ele.


Maldade da Folha


A Folha de S.Paulo comete hoje uma maldade com o deputado e ex-ministro da Educação Paulo Renato.


O jornal paulista revela que o deputado submeteu ao presidente do Bradesco o artigo enviado anteontem para publicação na seção Tendências/Debates.


O texto foi enviado à Folha por email. Por descuido, o corpo da mensagem registrava ainda a correspondência anterior, na qual o ex-ministro perguntava ao presidente do Bradesco se ele concordava com o texto.


O artigo trazia o título ‘Tentáculos da reestatização’ e tratava da expansão dos negócios do Banco do Brasil, que desagrada ao Bradesco.


A reportagem maldosa da Folha deixa subentendido que o deputado e ex-ministro escreveu o texto sob a supervisão do presidente do Bradesco. 


Renan isolado


O senador Renan Calheiros perdeu, finalmente, o controle do plenário.


A revelação de que ele havia tentado espionar outros parlamentares, não poupando nem mesmo senadores que se mantinham mais ou menos neutros em relação ao seu julgamento, foi a gota d´água.


Os jornais dão hoje como certo seu afastamento da presidência do Senado.


Os adversários de Renan e até mesmo senadores petistas, que vinham evitando atacá-lo diretamente, pediram que ele se licencie do cargo até o final do julgamento.


Nem mesmo a chamada ‘tropa de choque’ se animou a contestar os acusadores. No fim, o presidente do Senado abandonou a sessão, numa atitude que os jornais intrepretam como perda de força política.


Tarde demais


Segundo a Folha de S.Paulo, um funcionário da secretaria-geral da Mesa do Senado está disposto a testemunhar contra Renan. Ele declarou que havia procurado espontaneamente o corregedor, senador Romeu Tuma, para denunciar o uso da estrutura da secretaria-geral na coleta de informações contra os adversários do presidente do Senado, mas Tuma não deu seqüência às investigações.


Renan afastou ontem o assessor que é acusado de bisbilhotar a vida particular de senadores que pedem sua cassação, mas a medida pode ter vindo tarde demais: ninguém acredita que a operação de espionagem tenha sido uma iniciativa do assessor.


Pacto de suspeitos


A combinação de alguns destaques dos jornais dá uma idéia da situação no Senado.


A oposição entra com o quinto pedido de processo no Conselho de Ética.


O Executivo teme que a crise coloque em risco a prorrogação da CPMF, que já foi aprovada em duas votações na Câmara.


Outras lideranças do PMDB querem aproveitar a pressa do governo em aprovar prrojetos de seu interesse para aumentar sua participação na administração federal.


Parlamentares de outros partidos temem que Renan comece a divulgar pela imprensa outras irregularidades, para distrair a opinião pública, afetando ainda mais a reputação do Congresso.


No ano que vem haverá eleições municipais, ocasião em que deputados e senadores se esforçam para consolidar suas bases políticas.


Nenhum deles quer entrar em campanha com manchas no currículo.


No fim, Renan pode vir a ser cassado, não por um desejo de Justiça, mas por um pacto de suspeitos interessados em desestimular uma devassa no Parlamento.