Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>O enigma amazônico
>>Rasgando a fantasia

O enigma amazônico


O provável lançamento da candidatura da senadora Marina Silva à Presidência da República, divulgado na semana passada, pegou desprevenida a imprensa, que já contava como fato definitivo a polarização entre os prováveis candidatos dos dois blocos predominantes na política nacional – a ministra Dilma Rousseff e o governador de São Paulo, José Serra.


Após um primeiro momento, em que os jornais demonstraram, apressadamente, entender que a entrada da senadora no jogo eleitoral prejudicaria essencialmente a candidata petista, começaram a surgir elementos a indicar que a coisa não é assim tão simples.


Para a imprensa, Marina ainda é um enigma amazônico.


Em primeiro lugar, torna-se evidente que a senadora Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, que deixou o cargo quando o presidente Lula da Silva colocou na sala o “bode” chamado Roberto Mangabeira Unger, não vai se acomodar ao modelo que a imprensa desenhou para ela, de defensora radical da floresta, de “ecochata” alienada da realidade econômica.


Um colunista da revista Veja, que, segundo a Folha de S.Paulo, é ligado ao governador de São Paulo, chegou a afirmar que ela representa o “preservacionismo esotérico”.


Essa, na verdade, é a imagem que tanto governistas como oposicionistas gostariam que o eleitorado tivesse dela.


Mas, se confirmada sua candidatura, Marina Silva deverá aparecer para a opinião pública como uma alternativa mais consistente do que a de uma mera curiosidade amazônica, como a imprensa parece ter inicialmente julgado.


A senadora acreana não é apenas uma militante do movimento ambientalista.


Ela é reconhecida, há mais de uma década, como especialista em modelos sustentáveis de desenvolvimento.


Em 2001, ela foi a estrela de um seminário promovido na Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, ao qual também compareceram o então ministro José Serra, o senador Christóvam Buarque, a falecida ex-primeira dama Ruth Cardoso e líderes sindicais do Brasil.


Sua eventual candidatura é a que mais se beneficia do descontentamento geral da população com os escândalos que afetam a reputação dos políticos.


Se confirmar sua candidatura, Marina Silva poderá ser identificada por grande parte do eleitorado como a antítese de tudo que está aí.


E a imprensa, ao insistir na agenda dos escândalos, terá ajudado a pavimentar sua caminhada para o Planalto.


Rasgando a fantasia


Alberto Dines:


– José Sarney e Silvio Berlusconi têm muita coisa em comum: adoram o poder e adoram controlar a mídia. Não contente em silenciar o Estadão com a ajuda de um desembargador “muy amigo”, 12 dias depois o presidente do Senado determinou a substituição da diretora de Comunicação da Casa, funcionária de carreira, por um assessor-confidente que o acompanha há algumas décadas.


Com isso Sarney passa a controlar diretamente a TV Senado, a Rádio e o jornal diário, o portal de informações e todo o relacionamento da Câmara Alta com os meios de comunicação, o que não é pouca coisa.  O golpe de força foi ostensivo e Sarney não  perdeu tempo para arranjar justificativas. A crise política chegou a tal ponto que seus protagonistas já não se preocupam com as aparências, o jogo pesado continua embora todos falem em acordos e “acordões”.


José Sarney sempre tentou se apresentar como um conciliador, mesmo quando desempenhava a função de líder civil  do regime militar. Agora rasgou a fantasia.


As continuadas agressões à liberdade de expressão, no lugar de acalmar os espíritos só os exacerbam. O país fica intranqüilo quando sua imprensa é ameaçada. Ela não pode ser culpada pelas infrações, prevaricações e alianças espúrias montadas nos porões do Senado. Não é difícil explicar a fúria de Sarney e aliados contra os meios de comunicação. Sarney pretendia encerrar sua carreira política como um grande estadista e vai ficar muito mal perante a história. Seus comparsas, Collor de Mello e Renan Calheiros, ficarão ainda pior, escorraçados que foram pelo trabalho dos jornalistas.


O mais curioso é que os três cavaleiros anti-mídia são coronéis da mídia em seus respectivos currais. Esta é uma aberração que poucos gostam de examinar.