Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

>>PF pede quebra do sigilo de jornalistas
>>Informar sem excluir

PF pede quebra do sigilo de jornalistas

Alberto Dines:

– A Policia Federal parece que está muito estressada com as suas brigas internas e, pela segunda vez em quinze dias, foi mexer com a imprensa. Ontem foi revelado que a área de inteligência da PF, aquela que investiga o Dossiê Vedoin, achou necessário pedir a quebra do sigilo de dois telefones da Folha de S.Paulo em Brasília: um fixo e um celular. Há duas semanas a mesma Polícia Federal convocou indevidamente três repórteres da Veja para depor num inquérito interno. As explicações dos federais não convenceram antes no caso da revista Veja e não convencem agora no caso do jornalão paulista. A área de inteligência de uma polícia tão qualificada tem a obrigação de saber quem é quem. Tem a obrigação, sobretudo, de saber que telefone de jornalista é intocável. Alias, tocar pode, não pode é pretender quebrar o seu sigilo. O ato configura atentado à Constituição, tentativa de censura ou intimidação. Considerados isoladamente, os dois episódios poderiam ser avaliados como “trapalhadas” profissionais. Isso acontece nas melhores equipes, em qualquer atividade. Mas juntos e tão próximos um do outro, não podem ser minimizados nem desconsiderados. Sobretudo, porque a imprensa vem sendo abertamente criticada nas últimas semanas por altas autoridades do governo, por figurões do partido do governo e por formadores de opinião próximos ao governo. Com este background tão ruidoso contra a imprensa, o que poderia ser visto como um lapso seguido de outro, ganha outra conotação. Vejamos o que dirão agora os especialistas em denunciar o “complô da mídia golpista”.

 

Informar sem excluir

 

O repórter da Rede Globo André Luiz Azevedo considera o assassinato do jornalista Tim Lopes por traficantes, em junho de 2002, um divisor de águas no trabalho da imprensa no Rio de Janeiro, hoje submetido a grandes dificuldades.

 

André Luiz:

 

– Como manter a informação para todas as regiões, e não criar regiões onde você não retira informação e não tem aquele cidadão que passa as informações para o restante da sociedade. Esse é o grande o desafio neste momento. Você ter acesso a certas regiões do Rio, acesso à população do Rio de Janeiro que precisa transmitir suas reivindicações, manifestar suas opiniões. A gente tenta diariamente, isso é uma coisa que se conquista no dia-a-dia, fazer essas reportagens. Agora, a gente sabe que isso é uma tentativa. Nem sempre a gente consegue um sucesso absoluto, porque a gente tomou uma decisão, uma decisão radical, em muitas redações, isso foi feito a partir da morte do Tim, foi feita discussão no Sindicato, na ABI (Associação Brasileira de Imprensa), de não nos submetermos mais ao jugo dos traficantes, de não pedir autorização, permissão para entrar em nenhuma área. É importante levar os pleitos de toda a população, mas sem que a gente se submeta a nenhuma forma de negociação espúria.

 

Mauro:

 

– Segundo André Luiz Azevedo, o domínio de certas áreas por bandidos torna difícil noticiar também manifestações artísticas de grande importância para a cidade.

 

André Luiz:

 

– Na cidade do Rio de Janeiro você tem as manifestações culturais, musicais, presentes em toda a cidade. Uma parte da população, muita gente diz que são um milhão e meio, dois milhões de habitantes, é a população que vive em comunidades chamadas de favelas, ou que outro nome tenha, e comunidades que muitas vezes são submetidas ao tráfico. E essa população tem reivindicações e tem manifestações culturais riquíssimas, principalmente agora que chega a época do carnaval. Essa é uma manifestação que a gente não pode abrir mão de divulgar, mas que a gente tem que andar nesse fio da navalha de fazer essa reportagem sem nos submeter a nenhuma espécie de negociação com o crime organizado ou com traficantes.

 

Mauro:

 

– O repórter da Rede Globo diz que toda relação com fonte de informação é delicada e deve ser submetida a critérios cuidadosos.

 

André Luiz:

 

– Com a fonte policial, o repórter tem que ter acesso à fonte para receber a informação. Ele tem que ter o discernimento para não permitir que seja manobrado por aquela fonte, que aquela fonte use de uma maneira que ele não esteja percebendo. A relação repórter-fonte é uma relação delicada, importante, em qualquer setor da comunicação. Não é diferente na área política, não é diferente na área cultural, não é diferente na área esportiva. A gente tem que ter acesso à fonte, a fonte tem que perceber que ali ele tem um canal importante de divulgação, agora, a gente não pode de nenhuma forma ficar submetido aos interesses da fonte. A gente tem que pensar sempre que o nosso compromisso número um é sempre com a sociedade, com nosso telespectador, com nosso ouvinte. De que lado está o interesse do telespectador como participante da sociedade.