Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

>>Todos chutaram na trave
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Todos chutaram na trave

Os jornais erraram feio na cobertura do referendo na Venezuela.

Mas nenhum deles errou tanto quanto O Estado de S.Paulo.

Todos cravaram em suas edições de hoje que a maioria dos venezuelanos escolheria o ‘sim’ em apoio à reforma constitucional proposta por Hugo Chávez.

Mas tiveram o cuidado de ponderar que se tratava de pesquisa de boca-de-urna, de tendência ainda não confirmada no encerramentos de suas edições.

O Estadão definiu na manchete: ‘Referendo aumenta poderes de Chávez’.

No final, o ‘não’ venceu.

A Folha ressalvou na manchete que se tratava ainda de projeções de pesquisas de boca-de-urna, mas insinuou uma relação entre a disputa na Venezuela e a suposta intenção do presidente Lula de buscar um terceiro mandato.

As reportagens da Folha sobre a pesquisa que havia publicado no domingo, na qual a maioria dos brasileiros consultados havia declarado ser contra um terceiro mandado para o presidente, poderiam induzir o leitor a misturar os dois cenários.

Não há qualquer relação possível entre o referendo proposto por Hugo Chávez em torno de mudanças na Constituição da Venezuela e especulações, já muitas vezes desmentidas, de que o Brasil poderia mudar as regras eleitorais para permitir a reeleição de Lula em 2010.

Ainda antes de os jornais chegarem às bancas, as edições online já informavam que a proposta de Chávez havia sido rejeitada.

Hoje é dia de muita criatividade nas redações, para explicar ao leitor como foi tomada a decisão de apostar num resultado que estava errado.

Quantos institutos de pesquisa previram a vitória do ‘sim’?

Quais eram os números disponíveis quando as edições foram fechadas?

O que fazer com todas aquelas análises prevendo um futuro sombrio para as democracias na América Latina?

As manchetes e algumas páginas de política internacional desta segunda-feira já eram jornal velho quando saíram das impressoras.

Sem audiência

O Brasil foi apresentado ontem ao seu projeto de TV digital. Mas a festa não empolgou ninguém.

Dines:

– Deveria ser um domingo de festa televisiva. Não deu certo: a TV Digital é uma promessa vaga, indefinida e a TV-Brasil é apenas uma Medida Provisória ainda não votada. O governo tinha pressa, o calendário político exigia uma revolução na mídia eletrônica no início de 2008, ano de eleições e definições. A pressa, além de ser inimiga da perfeição, também é inimiga dos debates, prefere imposições. As duas festas foram improvisadas e decepcionantes. Mesmo com o pool montado pelas seis redes da TV comercial,  a TV-Digital foi uma sessão nostalgia para lembrar a TV-Tupi combinada com um comício político. Quem está faturando a TV-Digital por enquanto é a mídia impressa, com a farta publicidade dos fabricantes de equipamentos, embora o consumidor desconheça ao certo o que vai comprar – se um receptor de alta definição ou um sistema interativo e participativo. A indicação da diretoria executiva da rede pública, a TV-Brasil, foi bem recebida, mas prejudicada pela escolha de um Conselho Curador composto majoritariamente por curiosos que não são do ramo.  Desde o anúncio da rede pública ficou evidente a má-vontade dos grandes grupos privados de mídia, desinteressados em atender a fatia dos telespectadores mais exigentes. Esta má-vontade ficou patente nos últimos dias com a criação de um factóide destinado a prejudicar o lançamento da TV-Brasil. O afastamento das diretoras da antiga TV-Educativa era esperado há meses, mas os jornalões o apresentaram nos últimos dias como evidência de grandes dificuldades antes mesmo do início formal de operações. Trocas de comando são perfeitamente naturais quando empresas mudam de formato e dimensões, as páginas dos cadernos de negócio noticiam todos os dias contratações e dispensas no alto escalão. No caso da TV-Brasil a mídia privada queria forçar um trauma pré-natal. A TV-Digital significa faturamento, todos gostaram. A TV-Brasil significa uma alternativa à iniciativa privada. Ninguém gostou.