Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

>>Uma ameaça real
>>A novela do debate

Uma ameaça real

Deve ser apresentado nesta semana ao Congresso Nacional um projeto elaborado pela chamada bancada ruralista que representa a mais bem elaborada e concreta ameaça ao controle do desmatamento que já se produziu desde o movimento de ocupação da Amazônia estimulado pelo regime militar.

Com apoio de parlamentares de praticamente todos os partidos e sob o olhar complacente das principais lideranças políticas do País, o texto pretende transferir para os Estados e municípios a prerrogativa de regular os limites das áreas de proteção ambiental.

Na prática, a proposta elimina a ação da União justamente na questão que define o que deve ser preservado.

Como em toda manobra de interesses escusos, o projeto vem embalado em intenções das mais nobres.

No caso, segundo os autores da proposta, trata-se de reorganizar e consolidar a legislação que forma o Código Florestal Brasileiro, a Lei de Crimes Ambientais, a política nacional do meio ambiente, o zoneamento ecológico-econômico e as normas sobre poluição ambiental.

Com a desculpa de que as normas precisam ser agrupadas e simplificadas, prepara-se a pulverização dos controles sobre o desmatamento.

Todos os jornais já fizeram referência ao projeto nos últimos dias.

O Estado de S.Paulo anuncia a entrada em tramitação nesta semana.

Mas nenhum dos principais órgão de imprensa se dispôs a avançar no esclarecimento do que significa a proposta e de quais forças políticas e econômicas se movem por trás dela.

Não é mera coincidência o fato de que o próprio Estadão tenha publicado, neste domingo, uma ampla reportagem dando repercussão a suposta irregularidade atribuída ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc.

Por mais restrições que se faça a ele, por seu extremo gosto pelos holofotes, Minc ainda é a única voz dentro do governo federal que tem alertado para o risco do projeto dos ruralistas.

Uma manchete que lança dúvidas sobre sua honestidade, no mesmo dia em que o noticiário trazia fatos muito mais graves, como a crise na Coréia do Norte e os calotes sofridos por exportadores soa como matéria encomendada.

O Congresso está para cometer um erro histórico, e a imprensa parece estar de acordo.

A novela do debate

Alberto Dines:

– A obsessão de Hugo Chávez em eternizar-se no poder só se equipara à sua compulsão em controlar a mídia venezuelana e esta compulsão não se diferencia da fantasia de imaginar-se um grande estadista e um grande comunicador.

Sua última façanha no campo televisivo foi desastrosa. Queria aproveitar a presença de um grupo de intelectuais latino-americanos reunidos num evento internacional em Caracas para encaixá-los na maratona de quatro dias em comemoração ao 10º aniversário do seu programa “Alô Presidente”. Desafiou o peruano Mario Vargas Llosa e os mexicanos Carlos Krauze e Jorge Castañeda a enfrentá-lo num debate ao vivo.

Marcou dia, hora e lugar. Os visitantes aceitaram e indicaram Vargas Llosa para representá-los. Então Chávez percebeu a esparrela criada por seu imenso ego e pulou fora: só debateria com Vargas Llosa se ele fosse presidente do Peru.

Mas como não podia admitir um recuo, no fim da noite de sexta-feira tentou uma contraproposta: os visitantes debateriam com ele e intelectuais venezuelanos, mas deveriam confirmar até as 9 horas da manhã de sábado. Vargas Llosa, Krauze e Castañeda consideraram a telenovela venezuelana encerrada.

Hugo Chávez já foi repreendido publicamente pelo rei da Espanha com o famoso “por que não te calas?”, incansável, é o que no Brasil chamamos de “cara-de-pau”. Há mais de 70 anos, os obsessivos Joseph Goebbels e Benito Mussolini também se consideravam grandes comunicadores.