Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Meio ambiente, imprensa e capitalismo

No dia 5 de junho comemoramos o Dia Mundial do Meio Ambiente. A escolha da data remete ao início da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo (capital da Suécia), entre os dias 5 e 16 de junho de 1972. Em grande parte do planeta, na semana do dia 5 de junho são realizadas várias palestras que buscam conscientizar as pessoas sobre a importância de conservarmos nosso meio ambiente. Afinal de contas, degradar demasiadamente a natureza pode comprometer a própria existência do ser humano.

Entretanto, ao abordar a relação homem e meio ambiente, muitos esquecem que o modo de vida imposto pelo sistema capitalista, ao demandar o consumismo exacerbado, pressupõe uma vertiginosa pressão sobre os recursos naturais. Assim, muito se fala sobre a importância da coleta seletiva, da reciclagem, de evitar o desperdício de água e energia, mas raramente é mencionado que, por trás da grande degradação do meio ambiente, está um sistema socioeconômico que não conhece limites para a exploração do ser humano e dos recursos naturais.

Nas redes sociais, o Dia Internacional do Meio Ambiente foi bastante comentado. No entanto, o destaque negativo foi uma foto que circulou no Facebook com a seguinte frase: “Hoje é o dia do meio ambiente, não queime as florestas, queime as pessoas.”

A porta-voz do agronegócio

Já a imprensa brasileira enfatizou o anúncio, por parte do governo federal, de que o desmatamento na floresta amazônica apresentou o menor índice desde 1988. “O desmatamento na Amazônia teve a menor taxa em vinte e três anos. Em Brasília, a presidente Dilma anunciou um pacote de medidas em favor do meio ambiente. […] A presidente assinou diversos atos criando parques e reservas florestais”, noticiou o Jornal da Record. “Em toda a Amazônia Legal foram desmatados seis mil e quatrocentos quilômetros quadrados entre agosto de 2010 e julho do ano passado”, anunciou o Jornal Nacional.

Os preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20,também foram enfatizados pela mídia. “No Riocentro, as bandeiras da ONU, do Brasil, e da Conferência para o Desenvolvimento Sustentável foram hasteadas lado a lado. O centro de convenções é agora uma área internacional. A partir de hoje (5/6), a soberania sobre este pedaço de território brasileiro passa a ser da Organização das Nações Unidas, o que significa que, nos próximos dezoito dias, a ONU será responsável não só pela realização da conferência, mas também pela segurança deste espaço”, afirmou a repórter Catarina Hong, da Record. Não nos iludamos. ARio +20nada mais é do que um instrumento para mercantilizar a natureza. O evento global contribuirá peremptoriamente para a negociação de créditos de carbono nas principais bolsas de valores do planeta.

Por sua vez, a Rede Bandeirantes, porta-voz do agronegócio, tem dedicado boa parte dos seus noticiários para defender o novo Código Florestal. Para a emissora paulista, a não aprovação do novo Código Florestal poderia acarretar sérios riscos para culturas seculares, como o arroz nas margens dos rios e o café em áreas de morros. Representaria também a perda de empregos e o aumento do preço dos alimentos. Segundo o editorial do Jornal da Band de sexta-feira (1/6), o Brasil e o produtor rural merecem o novo Código Florestal.

Sistema blindado

Por outro lado, Carlos Nascimento, no Jornal do SBT, apresentou uma colocação bem mais sensata: “O Brasil deveria e poderia ter muito mais a mostrar e também a comemorar pelo Dia do Meio Ambiente. O encontro Rio +20, que está para começar, não sensibilizou o mundo como se esperava […]. O nosso Código Florestal, ao invés de ser um cartão de visitas de um país comprometido com a natureza, é um ‘saco de gatos’, com mais dúvidas do que conclusões. O planeta bem que gostaria de ver o Brasil como líder mundial na defesa do meio ambiente, mas nós estamos muito longe disso.”

Porém, mesmo com o excelente depoimento de Carlos Nascimento, a imprensa brasileira, na semana do meio ambiente, não apresentou uma matéria sequer sobre a importância de revermos as consequências do nosso padrão de consumo sobre o meio ambiente. Como sempre, o sistema capitalista é blindado pela nossa mídia. Lastimável contrassenso.

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[Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas, Brasil: Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de História e Geografia em Barbacena, MG]